Edição 51

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A última edição de 2020, ano marcado pela maior pandemia dos últimos 100 anos, por retração econômica, desemprego, aumento da pobreza e da desigualdade, traz o olhar de especialistas sobre outros temas atuais de interesse nacional: Amazônia e desmatamento; agropecuária e sustentabilidade; governança social, ambiental e corporativa; racismo e movimentos antirracistas; desmonte da cultura no governo Bolsonaro; conflito comercial e tecnológico entre os EUA e a China; política e estratégia nacional de defesa; e propostas para dar mais eficiência ao Supremo Tribunal Federal por meio de uma reforma institucional.

Pela importância econômica do agronegócio, e também por estar no centro das discussões sobre como produzir sem avançar na destruição da floresta amazônica, abrimos este número com o artigo da ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Ampliam as análises sobre o assunto, com enfoque em sustentabilidade, mercado financeiro, investidores e consumidores, Carolina da Costa, sócia da Mauá Capital e conselheira Latam da Solidaridad, e Rodrigo Castro, diretor de País da Solidaridad Brasil.

Para a ministra da Agricultura, “a afirmação de que o Brasil é uma potência agroambiental não é marketing. A agricultura brasileira respira sustentabilidade”. Segundo ela, as pressões internacionais contra o País servem aos objetivos do protecionismo das outras potências agrícolas.

“O mercado global de produtos agropecuários, que correspondeu a cerca de US$ 1,1 trilhão em 2019, deverá crescer substancialmente nos próximos anos, despertando a cobiça dos maiores países e blocos exportadores. O Brasil detém apenas cerca de 7% desse mercado, mas representa uma forte ameaça por seu potencial de crescimento”, diz Tereza Cristina, reconhecendo que a agropecuária “desempenha um papel” na atual dinâmica na Amazônia: conflitos fundiários, extração ilícita de recursos naturais, insegurança jurídica, pobreza e, em especial, desmatamento ilegal”. Porém, segundo ela, a agropecuária não é o “principal elemento propulsor”. Os problemas da Amazônia, diz, são ocupação territorial desordenada, apropriação indevida de terras públicas, dificuldade de atuação do Estado e ausência de um modelo efetivo de exploração sustentável do enorme potencial bioeconômico da região.

O artigo de Carolina da Costa e Rodrigo Castro mostra exemplos de produção sustentável no bioma Amazônia. “Territórios Inclusivos e Sustentáveis” é um projeto realizado no assentamento rural Tuerê, em Novo Repartimento, no Pará – um dos maiores assentamentos rurais do mundo, com 170 mil hectares e mais de 3 mil famílias. Iniciado em 2015, concilia floresta, cacau e pecuária. Atualmente, mais de 225 pequenos produtores recebem assistência técnica da Solidaridad para implementar práticas de baixo carbono, como intensificação produtiva e restauração produtiva de pastagens degradadas, informam os autores. O fato é que “uma economia de baixo carbono passou a ser foco não apenas da agenda ambientalista, mas de todos aqueles que lidam com mapeamento dos riscos climáticos e ambientais, uma vez que afeta significativamente setores produtivos de alto impacto econômico”, destacam.

Outro assunto desta edição é a nova geopolítica do século 21, com a emergência da China e o conflito comercial e tecnológico com os EUA. Um conflito com rumos incertos, a depender da eleição presidencial americana em novembro, em que concorrem o presidente Donald Trump e o democrata, ex-vice-presidente, Joe Biden. Trump recebeu de especialistas e assessores um cenário de liderança da China em setores estratégicos e, por isso, resolveu adotar uma política para Pequim de contenção explícita, com uma escalada de ações, escreve Sergio Amaral, ex-embaixador do Brasil nos EUA.

“A longa lista de sanções e retaliações recíprocas, que se estendeu inclusive ao fechamento de consulados, ilustra as várias áreas de uma escalada de hostilidades em curso. Só as eleições presidenciais de novembro poderão sinalizar os novos rumos. Ou a continuidade de sanções, que levaria a um agravamento do conflito e ao risco de um acidente de percurso; ou, ao contrário, a progressiva redução das tensões para levar, com o tempo, à construção de um modus vivendi entre as duas grandes potências do século 21”, diz o autor.

O protagonismo do STF na pandemia é mencionado no artigo de Joaquim Falcão, professor titular de Direito Constitucional da FGV Direito Rio, e João Carlos Cochlar, pesquisador da FGV. Na pandemia, afirmam, o Supremo tomou decisões importantes para manter o Estado Democrático de Direito. “Enfrentou com sucesso os ataques autoritários do presidente da República, assegurou aos governadores e prefeitos a autonomia federativa e está combatendo com destemor a organização criminosa das fake news, alimentada com dinheiro público.” Além disso, tomou decisões em favor da população indígena nesta crise sanitária.

Entretanto, para ser mais eficiente, o Supremo precisaria de uma reforma institucional, não relacionada ao conteúdo de suas decisões, mas sim com o processo decisório. Os autores destacam “seis possíveis pontos de reforma”, entre eles, acabar com as decisões monocráticas e com o “plantonismo”.

O problema racial – com uma sequência de crimes cometidos pela polícia americana contra negros, entre eles o de George Floyd, em maio, e a destruição de estátuas de figuras ligadas a um passado de opressão – é outro tema deste número. O artigo de André Cáceres, escritor, jornalista e crítico literário, trata do impasse sobre monumentos e obras de arte racistas.

O caso mais emblemático, menciona, foi a remoção da estátua de Edward Colston (1636-1721), em Bristol, na Inglaterra, no dia 7 de junho. O monumento em bronze, de 1895, recentemente foi retirado pelos manifestantes e lançado nas águas do rio Avon. Ocorre que Colston, membro do parlamento inglês e filantropo, fez sua fortuna com o comércio de tecidos, frutas, bebidas e escravos.

“Bansky, codinome de um artista inglês que mantém anonimato, propôs que a estátua de Colston fosse retirada do rio Avon, recolocada em seu pedestal e que outras estátuas, dos manifestantes que a derrubaram, fossem erigidas ao redor dela, eternizando o momento de sua queda. Esse é apenas um exemplo de intervenção, mas as possibilidades são muitas”, diz Cáceres.

O artigo sobre a importância de incluir mais negros na representação política é assinado pelo professor de sociologia e ciência política do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Luiz Augusto Campos. Segundo ele, “existem boas razões para defender medidas que incrementem a participação de pretos e pardos nas esferas decisórias, bem como de mulheres. Primeiro, porque a composição da representação política não reflete apenas as preferências dos eleitores, mas também as restrições presentes na própria competição eleitoral”. Nas eleições de 2018, candidatos brancos receberam, em média, R$227 mil, enquanto pardos, R$112 mil, e pretos, R$89 mil.

Cultura tem sido uma das áreas mais polêmicas da gestão Bolsonaro. Após 18 meses de governo, o setor foi rebaixado de ministério para secretaria, abrigada em dois ministérios e está no quarto dirigente. Um verdadeiro desmonte, conclui Ronaldo Bianchi, que foi secretário-adjunto da Cultura do Estado de São Paulo e vice-presidente do Itaú Cultural. O desmonte, segundo ele, se deve à inépcia, agressões a artistas, liderança inapta, falta de uma proposta mínima de política pública e a inexplicável dificuldade em nomear uma equipe eficiente.

Concluímos a edição com um texto sobre a política e a estratégia nacional de defesa. Três documentos sobre o assunto foram encaminhados ao Congresso Nacional. Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e ex-embaixador em Londres e Washington, diz que cabe indagar se esses documentos respondem aos novos desafios de um mundo em rápida transformação e à perda de protagonismo do país no entorno estratégico. Segundo Barbosa, há várias lacunas. Por exemplo, “nada se menciona sobre as consequências do ângulo da Defesa da iniciativa chinesa da nova rota da seda (Belt and Road Initiative) na América Latina”. Outros elementos estratégicos deveriam ter merecido exame dos documentos: a nova doutrina da Otan inclui seu âmbito não só no Atlântico Norte, mas também no Atlântico Sul, área de direto interesse do Brasil.

Depois de 13 anos como editora da Interesse Nacional, a jornalista Maria Helena Tachinardi deixa, por motivos pessoais, a editoria da Revista. O trabalho sério, competente e dedicado de Maria Helena em muito contribuiu para o êxito da Interesse Nacional. Cabem o reconhecimento e a gratidão pela eficiência no desempenho de suas tarefas ao longo de todos esses anos. Maria Helena deixou sua marca.

Como nova editora, a partir da próxima edição, assume a jornalista Marili Ribeiro, com passagens pelas publicações Jornal do Brasil, Gazeta Mercantil e O Estado de S.Paulo. Marili foi também diretora de comunicação da presidência da OAB-SP.

NOTA DOS EDITORES: Como consequência da pandemia da Covid-19, Interesse Nacional, depois de 50 edições, deixa de ser impressa e passa a ser publicada de forma digital. A revista pode ser acessada no site www.interessenacional.com. A edição impressa está suspensa até segunda ordem.

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