Artigo por Renato Whitaker – Agosto de 2017
Um espectro ronda a Esquerda: o espectro da Venezuela. O país, empacado com sua implosão econômica, enfrenta a contínua insurreição política de cidadãos insatisfeitos – insurreição que, aparentemente, agora também inclui unidades dispersas das Forças Armadas. Enquanto o governo de Nicolás Maduro toma medidas coercitivas com sua oposição e contrárias às instituições democráticas no país, cresce a condenação estrangeira das diretrizes internas da conjuntura venezuelana, condenação que recentemente incluiu novas sanções estadunidenses contra dirigentes venezuelanos, uma nova suspensão política do país pelo Mercosul e a divulgação de um parecer desfavorável da Comissão de Direitos Humanos da ONU. Mas os eventos na Venezuela estão encontrando diversidade de opiniões na esquerda política no brasileira e no entorno estrangeiro. Aqui, a posição oficial de partidos como o PT, PCdoB e PSOL largamente são de apoio à Assembleia Constituinte de Venezuela e do governo Maduro. Porém, além de haver reservas sobre a repressão de forças de segurança em suas declarações, há divergências explícitas de alguns dos seus integrantes. Notáveis políticos do PSOL, Chico Alencar e Jean Willys opinaram contra o governo Maduro e suas manobras para manter o seu mandato. Do PT, talvez a maior dissenção seria do ex-Presidente Lula, que urge uma posição neutra do Brasil e mais moderação por parte do governo Maduro. A disparidade da reação na esquerda também se encontra no exterior. Tradicionais aliados do governo de Hugo Chavez – como o dirigente boliviano Evo Morales do Movimento al Socialismo, José Mujica de Uruguai, o Partido Comunista de Cuba e a Alianza Pais de Ecuador – rechaçam as crescentes censuras de países estrangeiros ou organizações como a OEA contra Venezuela, embora insistências em diálogo e conclamações à paz também prevaleça.
Em outras alas, o apoio é menos aparente. Outra aliada tradicional do bolivarianismo, Ex-Presidente argentina Cristina Fernandez de Kirchner, pouco fala acerca da Venezuela em sua campanha para um assento no Senado, enquanto políticos do seu partido, como Dani el Filmus e Héctar Recalde, manifestaram preocupação em relação à violência dos confrontos, inclusive das forças de segurança venezuelanas. O partido centro-esquerdista mexicano PRD repugna as censuras feitas pelo governo Peña Nieto contra Venezuela, mas modestamente faz conclamações à paz em Caracas, enquanto o líder do partido democrata-socialista Morena, Manuel Lopes Obrador, frisou que não tem nada a ver com o governo da Venezuela. Ora por questões teórica-ideológicas, ora por questões de interesses práticos, a divergência e a rixa são fatores duradouros da Esquerda, que historicamente minaram a frente unida perante seus opositores. Nota-se, por exemplo, as épocas como a Guerra Civil Espanhola. Dividindo-se por questões de radicalismo ideológico, postura perante a influência dos Estados Unidos ou da relação de seus países com a Venezuela, a esquerda na América Latina está encontrando dificuldades cada vez mais maiores em formar um consenso com respeito à situação em Caracas. Talvez um contundente fator aglutinador seria declarações recentes feitas pelo imprevisível presidente americano Donald Trump, que abertamente aludiu à possibilidade de uma intervenção militar em Venezuela. Governos do Mercosul já rechaçaram a declaração e negaram o uso da força para tentar resolver a crise venezuelana. Embora seja difícil delinear quais declarações do presidente são sérias e quais seriam fanfarronices, se o efeito for de unir os governos conservadores da América Latina, qual seria o efeito sobre a Esquerda da região?