Balanço dos primeiros cem dias do novo governo mexicano
Em seus primeiros meses no poder, Claudia Sheinbaum desenvolve um projeto nacional de médio e longo prazos, apesar das dificuldades internas com a violência, a questão da imigração e as ameaças de Trump. Chegou a hora o Brasil negociar um amplo acordo comercial com o país
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Coincidindo com os primeiros cem dias da sua posse, a presidente do México, Claudia Sheinbaum, com 80% de aprovação, enfatizou a continuidade das políticas iniciadas por seu antecessor, Andrés Manuel López Obrador, iniciado em 2018. Isso indica sua intenção de que nem o modelo neoliberal, nem o autoritarismo, as fraudes, a corrupção e os privilégios vão voltar. Da mesma forma, não haverá retorno ao passado onde se governava para poucos e não havia diferença entre poder econômico e político.
Agora – agregou a presidente – é tempo de transformação e de atenção às mulheres, contra a discriminação, o racismo, a guerra de classes e o machismo.
No balanço que fez de 2024, ressaltou o nível recorde de empregos formais em dezembro (mais de 22.2 milhões), o maior nível de salário médio da história, a inflação controlada, o aumento real do salário mínimo de 135% e, na região de fronteira, de 221%, em relação a 2018.
O nível de desemprego é um dos menores do mundo, não houve aumento da gasolina nem do diesel em termos reais. Sem aumento de impostos, as receitas tributárias no final de 2024 chegaram a 4.9 bilhões de pesos, 4.6% maior que em 2023, descontando a inflação.
‘O México tornou-se o principal sócio comercial dos Estados Unidos e a 12ª maior economia mundial’
O investimento estrangeiro direto chegou a cerca de US$ 39 bilhões. O México tornou-se o principal sócio comercial dos Estados Unidos, as reservas internacionais alcançaram o volume recorde de US$ 229 bilhões, e virou a 12ª maior economia mundial.
A desigualdade foi reduzida e, de acordo com o Banco Mundial, 9.5 milhões de pessoas saíram da pobreza entre 2018 e 2023. Entre setembro e dezembro de 2024, foram aprovadas 12 reformas constitucionais e 16 leis que estabeleceram, entre outras garantias, que o salário mínimo deve aumentar sempre acima da inflação; o enxugamento do Estado, com o desaparecimento de alguns organismos autônomos, o fortalecimento da guarda nacional, o aumento das capacidades de inteligência e investigação vão continuar.
Na área econômica, foi apresentado e aprovado orçamento com disciplina fiscal e financeira. Os recursos para o bem estar e o desenvolvimento do país continuarão a aumentar, graças a austeridade republicana e a erradicação da corrupção. Não haverá privilégios no pagamento de impostos e direitos. Ninguém estará acima da Constituição. A corrupção não será tolerada. Não haverá, durante os seis anos do mandato da presidência, aumento dos salários dos servidores públicos de confiança de alto nível do governo.
‘A reforma do Poder Judiciário, aprovada por López Obrador, teve continuidade. Pela primeira vez, os juízes, magistrados e ministros da Suprema Corte de Justiça serão eleitos democraticamente pelo voto popular’
A reforma do Poder Judiciário, aprovada por López Obrador, teve continuidade com sua regulamentação e, em 1º de junho de 2025. Pela primeira vez, os juízes, magistrados e ministros da Suprema Corte de Justiça serão eleitos democraticamente pelo voto popular.
Para combater a violência e o crime organizado, Sheinbaum disse que a estratégia de segurança pública consiste em 4 eixos: atenção para as causas – a fim de evitar que as crianças e os jovens nunca vejam os grupos criminosos como uma opção de vida quando na realidade é uma opção de morte -, fortalecimento da guarda nacional, inteligência e investigação e coordenação.
‘Em 2025, pela primeira vez na história, todas as comunidades indígenas e afrodescendentes terão um orçamento para infraestrutura social e benefícios sociais’
Em 2025, pela primeira vez na história, todas as comunidades indígenas e afrodescendentes terão um orçamento para infraestrutura social, e estão previstos benefícios sociais para adultos, jovens e menores nas áreas de saúde, educação e agricultura.
Investimento em 2025 de 2,5% do PIB em direitos sociais para reduzir a pobreza e fortalecer a economia interna. O salário mínimo será aumentado em 12% em 2025.
Foram igualmente mencionados projetos nas áreas de educação (construção de escolas, reforma do ensino médio), saúde (construção de hospitais), agricultura (proibição do plantio de milho transgênico para proteger a saúde e a biodiversidade, aumento da produção de arroz, feijão, verduras, café, cacau e mel), infraestrutura (construção de estradas de ferro, trem Maya e interoceânico, estradas e pontes), minha casa minha vida (para os próximos seis anos de governo, estão projetadas pelo menos 1 milhão de casas novas para pessoas com menos de três salários mínimos).
‘Em 2025, vai ser lançado o Plano México, prevendo uma política de desenvolvimento econômico equitativo e sustentável que inclui investimento público e privado para a industrialização, o turismo e os serviço’
Com visão estratégica, em 2025, vai ser lançado o Plano México, prevendo uma política de desenvolvimento econômico equitativo e sustentável que inclui investimento público e privado para a industrialização, o turismo e os serviços, com visão de longo prazo para substituir importações, gerar cadeias produtivas e promover emprego e bem estar para os mexicanos.
Quanto à relação com os Estados Unidos, Sheinbaum ressaltou que no primeiro período de Trump com López Obrador a relação foi muito boa, sobretudo pela negociação e assinatura do tratado de comércio entre os dois países e o Canadá.
Para o segundo mandato de Trump, a presidente resolveu ignorar as últimas falas do presidente eleito e previu que a relação deve continuar boa, com amplo diálogo e respeito à independência e à soberania do México.
Enquanto o governo mexicano desenvolve um projeto nacional de médio e longo prazos, apesar das dificuldades internas com a violência, o crime transnacional (drogas). a questão da imigração e agora com as ameaças de Trump, o governo brasileiro está com dificuldades politicas e econômicas internas, sem um plano de voo para a economia para enfrentar os desafios externos em um mundo em rápida transformação.
Chegou a hora de discutir o Brasil e sua inserção externa, inclusive, dadas essas informações sobre o México, negociar um amplo acordo comercial com esse país, levando em conta também as eventuais políticas do governo Trump em relação ao México e ao Brasil.
Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.
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