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Interesse Nacional
01 outubro 2021

5G revoluciona mercados mundo afora. O Brasil está preparado?

O grande acontecimento do universo de Telecom dos últimos anos está finalmente próximo de se tornar realidade. Após longas tratativas, é esperado que o leilão das frequências do 5G ocorra muito em breve. A expectativa em torno do assunto é mais que justificável por todos os ângulos que se possa analisar. Para se ter uma ideia da magnitude, os negócios gerados na onda do 5G poderão impactar o PIB em até US$ 1,2 trilhão em 15 anos, segundo cálculos da consultoria Omdia. Já há hoje 128 operadoras oferecendo a tecnologia em países asiáticos, europeus e na América do Norte. A estimativa é que 21% dos dispositivos no mundo já estejam conectados ao 5G em 2025.

Com a combinação de suas três características principais, que são a ultra velocidade, largura de banda e baixa latência (que é o tempo rápido de resposta), o 5G vai permitir o surgimento de infinitas possibilidades de soluções e negócios. Para as operadoras, trata-se de uma mudança importante em suas formas de rentabilidade. Enquanto o 3G e o 4G são muito voltados ao B2C, o 5G permite uma ampla gama de novas possibilidades. O consumidor final certamente irá usufruir de maior velocidade em seu aparelho, mas a ação transformadora acontecerá nas aplicações B2B e B2B2C.

As operadoras terão o desafio de rentabilizar modelos de negócio que hoje ainda são pouco ou completamente desconhecidos. Em breve poderemos finalmente usufruir de carros autônomos, cidades e casas inteligentes e da manufatura 4.0. Logo abaixo serão destacadas com mais detalhes algumas das importantes funcionalidades que se tornarão realidade com a chegada da nova tecnologia.

Agronegócio

Há diversas áreas na zona rural do país que não possuem hoje cobertura de internet. Existe grande margem para importantes avanços e para gerar impacto significativo na produtividade do setor. Teremos rebanhos chipados, medição de nutrientes e umidade do solo, otimização do uso de colheitadeiras, drones para visualização de lavouras, entre muitas outras soluções que impactam diretamente na eficiência e produtividade.

 Varejo
Muitos varejistas estão apresentando resultados robustos nos últimos meses e a nova tecnologia será capaz de multiplicar os ganhos no setor. Segundo a consultoria McKinsey, o faturamento do e-commerce brasileiro cresceu 62% após o início da pandemia. A explicação está nos 46% dos brasileiros que aumentaram o consumo on-line, de acordo com a Fecomercio. A captação de novos clientes, a melhora de toda a jornada de compra, o pós-venda e a retenção de consumidores serão otimizados de forma generalizada com a chegada de novas possibilidades oriundas da tecnologia de última geração.

Não à toa, a Bloomreach estima que os maiores investimentos para os próximos meses serão em tecnologia e ferramentas de comércio (67%) e serviços para implementação de inovações (63%). De acordo com a SBVC, 70% dos brasileiros pretendem continuar gastando mais em lojas on-line do que faziam antes e agora poderão usufruir de interfaces cada vez mais inteligentes e responsivas.

Serviços Financeiros

As finte chs e os bancos digitais disputam palmo a palmo o concorrido mercado financeiro e bancário com as grandes instituições. Até mesmo os players tradicionais estão incorporando novas tecnologias para fazer frente às crescentes necessidades desse segmento. Agências físicas são fechadas e o uso do dinheiro em espécie diminui em um caminho sem volta. Meios de pagamento sem contato com meio físico dão o tom do novo momento. O 5G permitirá que transações sejam feitas com mais eficiência e velocidade.

Nesse ponto vale mencionar o acordo celebrado entre o Banco Central e a Conexis Brasil Digital para que o PIX Cobrança seja mais uma forma de facilitar a vida dos consumidores. Hoje já é possível fazer pagamentos de serviços pré e pós-pagos por meio da ferramenta.

Saúde

A Covid-19 e todos os graves problemas que ela ainda ocasiona impulsionou uma procura intensa por muitas facetas que envolvem o universo da saúde. Desde a preocupação inerente ao próprio coronavírus e outras doenças transmissíveis até questões relacionadas à saúde mental e temas relacionados ao bem-estar.

Nesse campo, há muito espaço para a telemedicina avançar e se tornar uma opção cada vez mais recorrente para a população, mesmo que ainda permaneçam entraves regulatórios importantes a serem superados. Aplicativos de saúde de toda espécie também proliferam e atendem às mais variadas demandas, desde medição de indicadores vitais até os relacionados ao bom repouso e à meditação.

As tecnologias digitais são instrumentos essenciais para apoiar os sistemas de saúde, não apenas por meio de aplicativos de rastreamento de telemedicina e Covid-19, mas também por meio de Big Data e análises de inteligência artificial para padrões de mobilidade, modelos epidemiológicos e rastreamento de contato. Para citar um exemplo, a Conexis disponibilizou para estados e municípios o mapa de calor, que auxiliou entes públicos a monitorar a movimentação e aglomerações em tempos de lockdown.

As vantagens são diversas e alcançam também o Tesouro, que recebe alívio devido à eficiência gerada pela alta conectividade. É possível estimar uma significativa economia no custo do Sistema Único de Saúde (SUS), uma vez que os atendimentos remotos e a possibilidade de fazer cirurgias complexas a distância permitem o enxugamento de diversos gastos hoje existentes.

Investimentos e desafios

Estar na elite tecnológica tem um preço. Um alto preço. E o caminho para embarcar soluções de última geração é longo e árduo. Para atender às demandas de infraestrutura e instalação do 5G, os investimentos do setor de Telecom precisarão se manter elevados. O segmento é historicamente um dos maiores investidores do País, com média superior a R$ 30 bilhões por ano. Se por um lado ficou evidente – sobretudo durante a pandemia – que a conectividade é o insumo básico para o bom funcionamento de praticamente todas as cadeias produtivas, por outro, há ainda importantes entraves a serem superados.

O primeiro deles remete ao próprio leilão de frequências. O setor entende ser importante o posicionamento do governo e da Anatel de fazerem um leilão não arrecadatório. É necessário destacar que investimentos associados ao setor, como a implantação de banda larga em localidades que hoje não têm esse serviço, são melhores para a economia. Eles suprem lacunas de cobertura, promovem a inclusão digital e geram aumento da produtividade.

Carga Tributária

Sem dúvida alguma, o maior empecilho para a expansão da conectividade no Brasil é a carga tributária extremamente elevada. Nada menos do que 47% da conta que hoje é paga pelo consumidor é composta de impostos. Em termos de comparação, a média da tributação dos países que mais acessam banda larga no mundo é em torno de 10%. Os benefícios de uma menor taxação são muitos e se refletem para todos os entes envolvidos nessa relação – população, empresas e Estado. A começar pela maior possibilidade de investimentos pelas operadoras em uma atividade essencial no mundo de hoje. Com mais recursos em caixa, é possível expandir a infraestrutura e fazer a conectividade chegar a todos. Os demais setores produtivos ganham em eficiência e competitividade. Além disso, o acesso à informação e ao conhecimento levam a um evidente incremento no capital humano.

É possível fazer um paralelo com a desoneração tributária concedida pelo Governo para aplicações de internet das coisas (IoT). Um estudo da Consultoria LCA revelou que a desoneração do IoT pode gerar uma arrecadação de R$ 17 bilhões, nos próximos três anos, por meio do potencial de negócios que serão gerados. Compensa – e muito – a perda inicial de R$ 1,8 bilhão estimada com a redução de tributos. Nesse sentido, zerar a carga tributária setorial dos dispositivos de internet das coisas foi fundamental para viabilizar os serviços e permitir que o País participe de mais essa revolução.

O setor pagou em 2020 nada menos que R$ 60,6 bilhões em tributos, com média superior a R$ 60 bilhões desde 2015. O montante representa mais de 40% da receita líquida das empresas. Os fundos setoriais, que deveriam ser usados para a expansão da banda larga, nunca foram usados para tal finalidade. Já foram mais de R$ 116 bilhões recolhidos aos cofres públicos e menos de 10% foi aplicado em projetos de telecomunicações.

Além disso, é preciso haver políticas que privilegiem o consumidor com baixo poder aquisitivo. Com renda per capita tão baixa, o Brasil deveria fornecer estímulos para permitir que maiores fatias da população acessem a internet. Os EUA possuem medidas nesse sentido por meio da concessão de vouchers para quem mais necessita. Por fim, o alto preço dos aparelhos também são um entrave, uma vez que também há uma elevada tributação incidente nos dispositivos móveis.

Antenas

Outro ponto que merece atenção é a desatualização das leis municipais de antenas. Há cidades com legislações muito antigas e a defasagem chega a 30 anos em alguns casos. O 5G requer uma densidade de antenas até dez vezes maior que o 4G. Contudo, as regras antigas impossibilitam a instalação de infraestrutura ao tratar de antenas que possuíam quatro metros e precisavam de licença ambiental, habite-se, entre outros requerimentos. É preciso haver incentivos para que os municípios atualizem as regras e sejam beneficiados pela nova tecnologia. A Conexis oferece, inclusive, um projeto de lei padrão para facilitar o encaminhamento da questão naquelas localidades que desejam se modernizar.

Uma medida que poderia atenuar o problema seria a previsão legal do silêncio positivo. O instituto permite que as operadoras instalem a infraestrutura caso os municípios não se pronunciem em 60 dias e todos os requisitos técnicos estejam cumpridos. A Conexis apoia o PL 8518/17, em tramitação na Câmara, que trata do silêncio positivo, e poderá dar a segurança jurídica necessária para seu uso.

Roubo e Furto de Cabos

Outro grande problema que pode atrapalhar de forma decisiva a viabilidade do 5G no Brasil é a ação criminosa que envolve furtos e roubos cabos de telecomunicações. O Brasil registra dados alarmantes. De acordo com a Conexis, o roubo de cabos afetou em 2020 aproximadamente 6,7 milhões de clientes. O número é 34% maior do que o registrado em 2019, quando cerca de 5 milhões de usuários tiveram os serviços interrompidos.

Em junho, por exemplo, um hospital infantil em Natal (RN) ficou impossibilitado de admitir novos pacientes por conta da paralisação nas linhas telefônicas. Em várias cidades, crianças e adolescentes que estudavam por computador ou celular não puderam assistir às aulas porque a conexão com seus professores foi cortada. E, em algumas capitais, até mesmo bombeiros e policiais não puderam ser acionados em emergências porque ficaram sem acesso a qualquer meio de comunicação.

Do outro lado, temos as empresas fornecedoras dos serviços de telecomunicações, que são penalizadas não somente com a perda de seus equipamentos, mas também com as reclamações e a redução na quantidade de clientes. Para qualquer direção que se olhe, o quadro é danoso. Estima-se que, a cada minuto, 12 pessoas ficam sem internet ou telefone no Brasil porque em algum lugar os fios foram cortados para roubar o cobre. Todos esses fatos indicam que a situação se tornou um problema grave de segurança pública que exige atenção e providências imediatas.

Fica claro que são muitos os desafios para a chegada e o bom funcionamento do 5G por aqui. Mais evidentes ainda são as vantagens que a nova tecnologia irá proporcionar para pessoas e empresas de todos os setores e portes. O mundo caminha a passos largos rumo à conectividade, e o Brasil precisa estar preparado para ser um ator relevante nesse ambiente globalizado cada vez mais digital.

É presidente da Conexis Brasil Digital, doutor em economia pela UFRJ e foi diretor de Infraestrutura e Governo do BNDES, assim como secretário de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento e secretário-adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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