Apesar de maioria dos textos da mídia estrangeira ter tom neutro, imagem do país é mais positiva em temas culturais e abordada de forma mais negativa em cobertura de política e economia
Daniel Buarque e Fabiana Mariutti*
iii-Brasil – 4 a 10 de abril de 2022
Visibilidade: 31 reportagens em 7 veículos analisados
Classificação das notícias: 58% Neutras; 26% Negativas; e 16% Positivas
A imagem do Brasil na imprensa internacional na primeira semana de análise oficial do Índice de Interesse Internacional iii-Brasil revelou um predomínio da neutralidade editorial na forma como o país é abordado ou evidenciado. Na reportagens com teor mais negativo, predominou a cobertura de política e economia, enquanto reportagens sobre esportes e cultura tiveram abordagem mais positiva.
Entenda como é calculado o iii-Brasil, levantamento sobre a imagem internacional do Brasil
Quase 6 em cada 10 textos com menções de destaque ao Brasil, nos veículos da mídia estrangeira avaliados entre os dias 4 e 10 de abril de 2022, usaram um tom factual, sem juízos de valor e sem potencial de influenciar a percepção dos leitores sobre o país de forma danosa ou assertiva — prejudicial ou anuente.
Entre os destaques positivos da projeção do Brasil na imprensa internacional, os conteúdos mais destacados na semana foram ligados a questões culturais e esportivas. Textos sobre música, literatura e futebol abordaram aspectos otimistas do país, o que incluiu uma matéria em enaltecimento à seleção brasileira de futebol, registrado pelo jornal argentino Clarín.
No Público, uma lembrança atual se fez ao show de cantor brasileiro ao retratar com ênfase sobre seu espetáculo em Portugal: “Ivan Lins ao vivo em Lisboa, para nos falar de amor em tempo de guerra”
Também em termos culturais, o jornal americano The New York Times publicou um obituário muito elogioso em homenagem à escritora brasileira Lygia Fagundes Telles. Autora reconhecida no Brasil e no exterior, Telles foi uma das primeiras mulheres brasileiras a abordarem a sexualidade feminina sob a perspectiva da própria mulher. Ela deixou como legado a emancipação da mulher e seu papel transformador na sociedade, atuando como uma escritora-testemunha de suas obras. Segundo o jornal, a obra dela retrata mulheres presas em relações insatisfatórias, o que também poderia ser lido como uma alegoria da situação política do Brasil.
As reportagens no Clarín que adotaram tom neutro incluem relatos do anúncio de que Geraldo Alckmin seria o candidato a vice-presidente na chapa de Luiz Inácio Lula da Silva e notícias das negociações entre o Brasil e a Argentina sobre energia e fertilizantes; um texto sobre o veto de Jair Bolsonaro à Lei Paulo Gustavo de apoio à cultura publicado pelo jornal português Público e, no China Daily foram identificados artigos sobre uma conferência entre a China e países lusófonos com propósitos sobre o fim da pandemia e o crescimento do consumo de marcas chinesas de smartphones na América Latina, são exemplos de notícias imparciais e de teor informativo.
Das reportagens publicadas que apresentaram algum viés no tom adotado ao tratar do Brasil, a maioria tinha abordagem negativa sobre o país. No total, foram encontradas oito reportagens projetando uma percepção desfavorável ao Brasil, impactando na reputação do país no exterior.
Problemas políticos e econômicos foram os principais focos da cobertura estrangeira mais crítica ao Brasil.
O jornal português apresentou na semana, por exemplo, reportagens sobre suspeitas de corrupção no governo Bolsonaro e sobre a preocupação da Organização das Nações Unidas (ONU) em torno da possível erupção de violência durante as eleições presidenciais. O Brasil também foi citado em um artigo publicado pelo jornal britânico The Guardian a respeito do enfraquecimento da democracia pelo mundo. Além do tom crítico sobre política, o texto citava o aumento do desmatamento no país nos últimos anos. Já o Clarín, destacou que o Brasil está vivendo uma disparada da inflação, com um dos piores índices em 30 anos. Além disso, o jornal argentino também tratou dos impactos da guerra na Ucrânia para o agronegócio brasileiro, apontando a dependência do país em relação a fertilizantes importados da Rússia.
Esta dicotomia jornalística remete à projeção da imagem positiva do país pautada em questões mais leves, como cultura e esportes, em contraposição a uma projeção negativa de assuntos sérios, como política e economia, é uma evidência constante em estudos anteriores que avaliaram como o Brasil é visto no exterior.
Pesquisas internacionais frequentemente apontam o país como um excelente destino de turismo, de aventura e de lazer, com referências aos lugares exóticos acompanhados da respectiva brasilidade, mas uma nação complexa para fomentar negócios, perpetuar parcerias ou para a própria negociação política. É uma percepção que costuma ser comparada à famosa (e apócrifa) frase que diz que “o Brasil não é um país sério”. Por mais que o conceito de seriedade mereça uma discussão mais aprofundada, é importante ressaltar que a análise da primeira semana de iii-Brasil reproduziu uma interpretação semelhante à de outros estudos de cobertura jornalística ou tópicos relacionados sobre a reputação externa do Brasil. Nessa perspectiva nacional, de embasamento científico e apreciação interpretativa, entre os propósitos do iii-Brasil é repensar as nuances sobre a imagem do Brasil no exterior.
Instabilidade política
Imagens negativas e de instabilidade política também tiveram destaque em veículos que não são analisados sistematicamente pelo iii-Brasil, mas que também têm grande relevância internacional. A narrativa relatada de alguns destes veículos analisados é de fracasso na tentativa de desenvolvimento de uma candidatura de centro para a Presidência do país, a imagem controversa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o recente crescimento da intenção de voto para reeleger Bolsonaro.
A agência de economia Bloomberg foi um dos veículos a destacar o encolhimento da chamada terceira via. “Candidatos presidenciais moderados parecem cada vez mais distantes de desafiar as duas figuras mais polarizantes da política brasileira”, diz, em relação a Lula e a Bolsonaro. De forma semelhante, a revista The Economist publicou um artigo sobre a candidatura de Lula, alegando que os eleitores se dividem entre os que acham que ele é um salvador e os que veem nele um ladrão. Por último, a revista Americas Quarterly publicou um texto sobre o cenário político brasileiro alegando que Bolsonaro pode “apesar de tudo” ainda encontrar um caminho para vencer as eleições, “ou pelo menos alcançar um resultado apertado o suficiente para criar confusão” – em referência a uma possível mobilização para repetir no Brasil a tentativa de invadir o Capitólio para reverter o resultado das urnas, como nos EUA.
* Daniel Buarque é editor-executivo do Interesse Nacional, pesquisador no programa de doutorado em Relações Internacionais do Brazil Institute do King’s College London (KCL) e do IRI-Universidade de São Paulo. É jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor do livro “Brazil, um país do presente” (Alameda).
Fabiana Mariutti é pesquisadora, professora e consultora em negócios internacionais; pós-doutorado, doutorado e mestrado em Administração pela Universidade de São Paulo com bacharel em Comunicação Social pela PUC Campinas, SP. Estuda a marca Brasil e temas tangenciais desde 2010. Anteriormente, trabalhou em organizações nas áreas de Estratégia, Marketing e Branding.
