16 julho 2012

Maximizando o Legado de Infraestrutura da Copa e dos Jogos Olímpicos no Brasil

O orgulho do Brasil ao vencer as propostas para sediar a Copa do Mundo de Futebol em 2014 e os Jogos Olímpicos de Verão no Rio de Janeiro, há dois anos, foi justificado. Somente os Estados Unidos haviam hospedado dois dos maiores eventos esportivos do mundo em um espaço de apenas dois anos: foi sede da Copa do Mundo da Fifa, em 1994, e dos Jogos Olímpicos, em 1996, em Atlanta.

O orgulho do Brasil ao vencer as propostas para sediar a Copa do Mundo de Futebol em 2014 e os Jogos Olímpicos de Verão no Rio de Janeiro, há dois anos, foi justificado. Somente os Estados Unidos haviam hospedado dois dos maiores eventos esportivos do mundo em um espaço de apenas dois anos: foi sede da Copa do Mundo da Fifa, em 1994, e dos Jogos Olímpicos, em 1996, em Atlanta. A grande diferença, porém, é que o Brasil ainda está se afirmando como potência econômica global, em ascensão após quatro décadas de subinvestimentos crônicos em infraestrutura. A questão central é saber se o Brasil pode, ao mesmo tempo em que sedia esses grandes eventos, criar um legado para apoiar sua contínua expansão econômica.

Apesar do visível crescimento na economia, o Brasil ainda é limitado por ineficiências de infraestrutura. Gargalos em todos os setores entravam o desenvolvimento da indústria. Para manter o crescimento do PIB e beneficiar-se de investimentos estrangeiros, o país está fazendo fortes investimentos em sua base de capital fixo. Ser o país-sede da Copa do Mundo de 2014 e, em seguida, dos Jogos Olímpicos de Verão de 2016, representa um grande passo à frente para o Brasil, que abre uma ampla gama de desafios e oportunidades, em especial em relação à criação de um legado de infraestrutura sem precedentes. Além disso, mostra ao mundo que o país já está pronto para assumir seu lugar como importante atorda estabilidade econômica e da governança globais.

A dimensão e o alcance da infraestrutura exigida pela Fifa para sediar a Copa do Mundo e pelo Comitê Olímpico para sediar os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos constituem um desafio real. Além da exigência de estádios de nível internacional, o enorme afluxo de pessoas nas cidades-sede aumenta a necessidade de vários serviços básicos, como transporte, telecomunicações, abastecimento de água, saneamento, energia elétrica, serviços financeiros e de saúde. Dada a importância da infraestrutura para o desenvolvimento econômico sustentável do país, o legado a ser deixado por dois grandes eventos deve assegurar que o Brasil possa executar um programa de infraestrutura a tempo e dentro do orçamento. Apesar de sérios indícios de que o Brasil poderia correr o risco de não atingir as exigências para a Copa do Mundo, ainda há tempo de garantir que os dois acontecimentos sejam efetivamente de nível internacional e de criar a infraestrutura certa para sustentar seu potencial de crescimento.

Este artigo investiga: 1) como criar um legado de infraestrutura eficaz para grandes eventos esportivos; 2) lições e experiências de outros grandes eventos esportivos; e 3) uma análise de como o Brasil pode evitar problemas do passado e criar um forte legado de infraestrutura a partir da próxima Copa do Mundo e das Olimpíadas.

Criação de um forte legado de infraestrutura

O sucesso de um evento de grande porte é indicado por sua boa repercussão – uma ótima Copa do Mundo ou uma Olimpíada bem executada – e pelo resultado positivo para a cidade ou região-sede. Um evento bem-sucedido faz do local sede um lugar melhor do que era anteriormente. São tarefas complementares, porém diferentes, e uma não decorre automaticamente da outra. Ambas exigem planejamento e gestão. Um número demasiado grande de eventos deixa alguns lugares piores, do ponto de vista de infraestrutura, com instalações caras que não têm mais serventia, uma conta enorme a pagar no futuro e nenhum benefício claro direto ou indireto.

A experiência de cidades ou países-sede indica que a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos têm potencial para criar um legado duradouro. Em outras cidades, regiões e países que atuaram como sede, esse legado – definido pela OCDE como os benefícios e prejuízos econômicos, sociais e ambientais, “tangíveis” e “intangíveis” gerados após o evento – pode variar de efeitos locais, como o aprimoramento da infraestrutura e dos serviços, a efeitos globais, como a reputação da cidade ou país-sede. Para cidades ou países-sede, a possibilidade de afetar a infraestrutura física, os resultados econômicos, os resultados sociais, a sustentabilidade e/ou a reputação internacional é inestimável – e está por trás da acirrada concorrência entre os candidatos a sede desses eventos.

Grandes eventos esportivos, como as Olimpíadas ou a Copa do Mundo, têm características peculiares que fazem deles importantes catalisadores do desenvolvimento econômico. Eles acarretam, por exemplo:

• prazos inegociáveis que geram tensão, disciplina e compromisso;

• nítida necessidade de melhorar muitos aspectos da infraestrutura das áreas-sede;

• atenção global, que resulta em orgulho nacional, ou seja, os locais-sede passam a ser uma prioridade nacional durante um determinado período;

• intensa atenção da mídia, o que proporciona oportunidades extraordinárias de posicionar-se e promover-se para alterar simultaneamente as percepções de potenciais investidores e turistas.

Para extrair o máximo das oportunidades geradas por uma Copa Mundial ou uma Olimpíada é preciso aprender lições não apenas a respeito de impactos e oportunidades, mas também sobre como deixar um legado duradouro. As lições de eventos anteriores indicam que construir um legado forte, administrar orçamentos com eficácia e envolver a comunidade requerem supervisão ativa e uma abordagem coordenada. Os eventos que foram considerados parte de uma agenda maior de desenvolvimento, e não como um fim em si mesmos, figuram entre os que obtiveram maior sucesso. A preparação para as Olimpíadas de Barcelona, em 1992, por exemplo, estava inserida em uma estratégia de três fases de recuperação e investimentos, na qual os Jogos Olímpicos eram apenas uma parte do desenvolvimento mais amplo da cidade. Essas Olimpíadas são um exemplo bem documentado da criação de um legado econômico considerável a partir de um mega evento.

A lição que Barcelona deixou para o Brasil é que um programa de legado deve ser impulsionado por uma liderança robusta e implementado com recursos e habilidades dedicados, que não se confundem com os esforços requeridos para sediar o evento, mas são eficazmente coordenados com eles. Em geral, as cidades e regiões que sediam esse tipo de evento têm um plano de desenvolvimento estratégico de longo prazo que buscam implementar. O evento oferece a oportunidade de acelerar a implementação e a execução dos planos, aumentando o momentum dos projetos existentes e fornecendo metas e financiamento adicional para agilizar o avanço. O plano de desenvolvimento estratégico de longo prazo do Brasil − aumentar o PIB per capita e diminuir a desigualdade − é um forte alicerce de um legado de infraestrutura, diante da noção generalizada de que esta constitui um grande obstáculo ao crescimento.

As cidades, regiões e países que usaram eventos internacionais como forma de se promover (por exemplo, Vancouver, Barcelona, Montreal, Turim e Seul) efetivamente obtiveram grandes retornos do investimento inicial. No caso do Brasil, a infraestrutura desenvolvida para sediar esses eventos internacionais não deve ser vista como um fato isolado, mas sim como um programa de desenvolvimento de infraestrutura a ser intensificado ao longo do tempo, com base na confiança e no histórico comprovado.

Exemplos de legado de outras Copas do Mundo e Jogos Olímpicos

Ser a sede de um grande evento esportivo pode proporcionar benefícios econômicos diretos e indiretos. Neste artigo, ao examinar esses potenciais benefícios, a conclusão é que o investimento em infraestrutura é o que pode gerar maior resultado duradouro. Com esse objetivo, é fundamental investir em projetos de aeroportos, transporte urbano e hotéis, dimensionados com base em premissas de planejamento de desenvolvimento de longo prazo. Enquanto os benefícios diretos incluem capital e construção da infraestrutura relacionada ao evento, os de longo prazo incluem a redução dos custos de transporte, graças à melhoria da malha rodoviária ou ferroviária, e os gastos de turistas que saem da cidade para assistir aos jogos. Entre os indiretos, podem figurar os efeitos da promoção da cidade ou país-sede como possível destino turístico ou local de negócios no futuro, podendo haver ainda uma intensificação do orgulho cívico, do senso local de comunidade e da estatura percebida da cidade ou país-sede. No entanto, há também desvantagens potenciais, resultantes de possíveis estouros do orçamento, mau uso do solo, planejamento inadequado e instalações subutilizadas.

Infelizmente, a literatura indica que os mega eventos esportivos receberam créditos indevidos pelo benefício econômico que realmente propiciaram. Alguns dos erros recorrentes de estimativa incluem: (1) desconsiderar o fato de que muitos consumidores internos têm orçamentos para lazer relativamente fixos, (2) não entender os padrões de atividade econômica dos residentes permanentes que não assistiram ao evento, e (3) ignorar o fato de que turistas normais evitam pontos turísticos já muito frequentados. Além disso, como já visto em mega eventos no passado, os enormes investimentos necessários para sediá-los com sucesso nem sempre proporcionam os retornos econômicos esperados, ou o estímulo de longo prazo.

As Copas do Mundo da Fifa realizadas na Coreia do Sul-Japão, em 2002, e na Alemanha, em 2006, ajudam a ressaltar a falácia dos mega eventos como grandes impulsionadores da economia. A Coreia do Sul gastou cerca de US$ 2 bilhões para construir dez novos estádios. No entanto, o turismo naquela região quase não foi afetado pelo incrível investimento em infraestrutura. O número de visitantes foi exatamente o mesmo nas temporadas de verão de 2001 e de 2002: aproximadamente 460 mil pessoas. Na Alemanha, observou-se um impacto econômico imediato e igualmente incongruente após o país sediar a Copa do Mundo de 2006.

Além disso, os orçamentos inicialmente divulgados invariavelmente subestimam o custo total de montagem de grandes eventos. Entre o momento em que uma cidade se candidata a um evento e a época em que ele ocorre, os custos de construção e o valor dos terrenos podem aumentar significativamente. Orçamentos previstos nunca são suficientes para cobrir os custos reais. Atenas projetou inicialmente um custo de US$ 1,6 bilhão para o evento, que ao final atingiu cerca de US$ 16 bilhões (incluindo custos de instalações e infraestrutura). Pequim projetou custos de US$ 1,6 bilhão (orçamento do custo operacional da proposta de Pequim), porém o preço final chegou a US$ 43 bilhões, devido ao incremento de custos nos 18 meses anteriores para garantir que a infraestrutura ficasse pronta a tempo. O Parque Olímpico construído em Sydney para os Jogos de 2000 não foi totalmente utilizado. Como parte da conta da Copa do Mundo de 2002, o Japão precisou construir sete novos estádios e reformar outros três, ao custo de US$ 4,5 bilhões, enquanto a Coreia do Sul gastou US$ 2 bilhões na construção de dez estádios. Hoje, eles são chamados de “elefantes brancos”. A construção do maior estádio do Japão, com 64 mil lugares, custou US$ 667 milhões. Depois da Copa, a cidade pagou US$ 6 milhões por ano para manter as instalações para um time local que mal atrai 20 mil torcedores. Londres esperava que seus Jogos de 2012 custassem menos de US$ 4 bilhões; a projeção atual é de custos em torno de US$ 20 bilhões.

Portanto, se existe um benefício econômico em ser sede de Copas do Mundo ou Jogos Olímpicos, dificilmente isso significa melhorar os orçamentos de governos locais, o que suscita a questão sobre haver − ou não − ganhos econômicos menos tangíveis e mais amplos e de mais longo prazo. De fato, os benefícios econômicos de mega eventos esportivos são potencialmente mais importantes que os ganhos diretos, mas são também mais difíceis de quantificar. Um dos possíveis benefícios indiretos é o efeito de promoção desses eventos. Muitas áreas metropolitanas e regiões que sediaram Jogos Olímpicos e Copas do Mundo vêem as Olimpíadas como meio de chamar mais atenção no cenário mundial. Nesse sentido, a intensa cobertura da mídia antes e depois de Jogos Olímpicos ou outros grandes eventos é uma forma de promoção, e possívelmente atraindo turistas e investidores que, se não fosse por isso, não considerariam a cidade ou o país para uma visita. No caso do Brasil, se for possível criar uma infraestrutura com eficácia de custos para sediar eventos de nível internacional no estilo vistoso dos brasileiros, em um contexto de século XXI, o país naturalmente atrairá novos turistas e investidores.

Contudo, a experiência de algumas cidades-sede ressalta que o investimento na infraestrutura física para um grande evento é o benefício fundamental e duradouro em termos do desenvolvimento econômico futuro, principalmente relacionado a instalações esportivas, transporte, espaço público e hospedagem. Um sistema de transporte moderno e bem integrado é prioritário nas etapas de preparação de um mega evento e, se a infraestrutura estiver inserida em uma estratégia de redesenvolvimento de longo prazo pode estimular melhorias e recuperações duradouras.

• Em 1992, em Barcelona, foi implementado um grandioso plano de recuperação antes da candidatura da cidade à sede olímpica, passo essencial para a realização do evento. Decorridos 20 anos dos Jogos Olímpicos, que serviram de catalisador de investimentos e melhorias de infraestrutura, prossegue em Barcelona o trabalho de recuperação, como parte da fase três do plano, o que transformou sua base econômica.

• Projetos de “embelezameno” e estratégias de modernização do centro de cidades, com o intuito de melhorar a experiência dos participantes, das equipes de trabalho e dos espectadores no curto prazo, podem ocasionar melhorias duradouras nas instalações culturais e de entretenimento da cidade. Foi o que ocorreu em Turim, em 2006, quando os Jogos resultaram em uma grande recuperação cultural da cidade.

• A maioria dos Jogos Olímpicos requer a recuperação de grandes terrenos para serem usados como local de jogos, incluindo a Vila Olímpica e as instalações esportivas de primeira linha. É importante que os locais recuperados sejam bem administrados, integrados à cidade e que as novas instalações e prédios esportivos não se transformem em “elefantes brancos” subutilizados. Em 1996, para atenuar possíveis consequências negativas dessa situação, Atlanta fez amplo uso de instalações temporárias construídas para os Jogos.

Finalmente, as melhorias em ambientes e infraestruturas locais e regionais devem ser implementadas de maneira a apoiar a qualidade de vida local. É importante, por exemplo, que as melhorias de infraestrutura não beneficiem apenas turistas e representantes de negócios internacionais, e que as comodidades não se restrinjam a universidades prestigiosas ou times esportivos de elite. Um aspecto importante da Copa do Mundo de 2006, na Alemanha, foram as melhorias feitas no espaço público, na sinalização e nas comodidades dos centros das cidades. Em geral, a Copa do Mundo da Alemanha e as Olimpíadas de Sydney atingiram altos níveis de participação local, que permitiram à população um sentimento de orgulho e de propriedade do evento, e não um olhar de espectadora passiva. Esse deve ser um objetivo essencial para o Brasil.

O legado de infraestrutura para o Brasil

Em termos gerais, o legado de infraestrutura da Copa do Mundo do Brasil e da Olimpíada do Rio de Janeiro deverá: 1) priorizar os projetos de infraestrutura que façam parte de planos mais amplos de desenvolvimento da cidade ou da região e que beneficiem uma ampla parcela da população; 2) evitar a construção de “elefantes brancos”; e 3) executar projetos a tempo e sem estouros de orçamento.

Copa do Mundo da Fifa de 2014

Em 30 de outubro de 2007, o Brasil foi selecionado como país-sede da Copa do Mundo de 2014, fato que não ocorria desde a copa de 1950 Dentro de dois anos, de 12 de junho a 13 de julho de 2014, ocorrerá a Copa do Mundo da Fifa. São 32 seleções participantes, 64 jogos em 12 cidades-sede, e expectativa de 600 mil turistas com intenção de ver os jogos. Os desafios podem ser divididos em três categorias: estádios (com condições de receber os jogos e capacidade para abrigar o público), transporte entre cidades (capacidade e qualidade para atender a demanda de mobilidade entre as cidades-sede durante a Copa, e a infraestrutura das cidades (incluindo rede hoteleira, mobilidade urbana, telecomunicações).

A necessidade mais básica para organizar uma Copa do Mundo é, sem dúvida, os estádios. Cada cidade-sede deve abrigar um estádio com capacidade e requisitos mínimos para as demandas de um jogo de Copa do Mundo. Nesse quesito, a Fifa é bastante clara e rigorosa com as exigências, de modo que o estádio com menor capacidade de público (Curitiba) possui 42 mil lugares, e o maior (Rio de Janeiro) comporta 80 mil espectadores. Considerando um público médio de quase 50 mil pessoas por jogo na Copa da África do Sul de 2010, em que o público ficou aquém do esperado, as exigências de capacidade são razoáveis.

Nenhum dos estádios nas cidades-sede obedecia às normas exigidas pela Fifa. Sendo assim, foram necessários projetos de expansão dos estádios. As mudanças propostas foram de tal porte que cinco estádios (Brasília, Cuiabá, Manaus, Natal e Salvador) foram demolidos e reconstruídos, e dois (São Paulo e Recife) são construções completamente novas.

Evitar “elefantes brancos” – a decisão de sediar consecutivamente a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos, usando as mesmas melhorias de infraestrutura planejadas – é, por um lado, uma atitude ousada e eficiente em termos de custos por parte das autoridades brasileiras. No entanto, alguns dos projetos atuais, principalmente aqueles relativos ao número de estádios para a Copa do Mundo, correm o risco de se transformarem em grandes ônus financeiros após o evento. Muitos questionam se, após a realização da Copa, os estádios serão utilizados para eventos com fins lucrativos. Nas cidades cujos habitantes são torcedores de futebol menos fanáticos, é bem possível que os estádios modernos se tornem sorvedouros dos recursos locais.

Como ocorreu na África do Sul, parece que não foi totalmente dimensionado o que aconteceria depois do evento. Cinco dos dez estádios-sede da Copa de 2010 se encontram em cidades sem capacidade de utilizá-los de forma a sustentar os gastos de manutenção, e que operam com prejuízo desde 2010. A história caminha para o mesmo desfecho no Brasil, com a construção de estádios em cidades como Brasília, Natal, Manaus e Cuiabá, em que os melhores times disputam a terceira divisão do campeonato nacional.

Ao contrário de 1950, quando foram seis cidades-sede nas regiões Sul e Sudeste (com exceção de Recife), serão 12 cidades-sede, com presença em todas as regiões do Brasil: Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Natal, Fortaleza, Brasília, Cuiabá e Manaus A Alemanha também tinha 12 cidades-sede. Ir de cidade em cidade era mais fácil, graças à excelente infraestrutura de transportes do país com suas autoestradas e ferrovias. Além disso, o território da Alemanha (357 mil km²) é pouco maior que o do estado de Goiás, o que dá uma ideia do contraste apresentado pelas dimensões continentais do país – o Brasil tem 26 estados, além do Distrito Federal, e uma extensão territorial quase 24 vezes maior que a da Alemanha. Assim, sediar a Copa do Mundo exigirá investimentos consideráveis em infraestrutura. O governo brasileiro planeja investimentos da ordem de R$ 25 bilhões em setores essenciais, número que poderá ser significativamente mais alto até o início do evento. A Alemanha investiu o equivalente a cerca de R$ 60 bilhões em preparativos para a Copa do Mundo de 2006.

Além disso, a organização dos Jogos parece não levar em consideração a distância entre as cidades. A Seleção Brasileira, por exemplo, realizará seus três jogos da fase de grupos em São Paulo, Fortaleza e Brasília, nessa ordem. Nenhuma seleção fará mais de uma partida na mesma cidade na fase inicial.

A vantagem dessa rotação é permitir que as cidades recebam várias seleções e turistas diferentes e também que os turistas tenham a oportunidade de conhecer várias cidades ao acompanhar sua seleção preferida. Por outro lado, é preciso garantir que seja possível, de fato, acompanhar a seleção.

O modo mais fácil (e, em alguns casos, o único possível) de viajar entre as cidades da Copa é pela via aérea. Com um planejamento prévio, teria sido possível fazer a conexão entre cidades próximas (por exemplo, São Paulo e Rio de Janeiro) por trens de alta velocidade. Entretanto, em 2014, os únicos modos de transporte entre as cidades serão as vias aéreas e rodoviárias.

Nesse aspecto, os grandes investimentos previstos são para a infraestrutura aeroportuária, que, atualmente, se encontra sobrecarregada nas principais localidades, como Rio de Janeiro e São Paulo. Além da expansão da capacidade, estão previstas obras de modernização dos aeroportos, para promover maior segurança e conforto aos passageiros.

Benefícios e Oportunidades

Por fim, para garantir que os jogos ocorram sem problemas, e que o público possa apreciar o evento sem grandes transtornos, é necessária uma atenção especial à mobilidade urbana. É preciso garantir os meios de transporte necessários para que os torcedores cheguem ao estádio e saiam dele sem grandes problemas. Em São Paulo, por exemplo, o plano é ligar o aeroporto de Congonhas à região do Morumbi (importante área hoteleira), com integração ao metrô, que possui fácil acesso ao estádio da Copa. Entretanto, as obras estão bastante atrasadas e já se discute se estarão prontas para o evento.

A infraestrutura das cidades é o aspecto que, certamente, traria maior impacto para o dia a dia da população após a Copa, e também onde há maiores atrasos e riscos de não conclusão. Apesar de um volume considerável de projetos de construção, expansão e modernização de vias, construção de corredores de ônibus, instalação de linhas de VLT (veículo leve sobre trilhos), monotrilho e metrô, com potencial de grande impacto na mobilidade urbana, ligando aeroportos, pontos turísticos e estádios, a execução das obras está muito atrasada. Em muitos casos, já se admite que a conclusão até a Copa é impossível.

O Brasil apresenta resultados relativamente baixos em indicadores de produtividade e, para maximizar seu legado, deverá demonstrar a capacidade de executar projetos de infraestrutura dentro dos prazos e orçamentos previstos. A maioria dos países em desenvolvimento tende a incorrer em altos custos devido à inflação das despesas com mão de obra e outros insumos para entregar a infraestrutura a tempo. A China, por exemplo, utilizou um número muito elevado de trabalhadores para finalizar projetos para as Olimpíadas de Pequim, ao passo que a Índia teve que correr contra o tempo para finalizar a infraestrutura para os Jogos da Comunidade Britânica em Nova Délhi. Tal caminho seria uma opção menos recomendada para o Brasil, por dois motivos: primeiro, os custos de mão de obra direta e os custos de oportunidade são muito altos e, segundo, isso sabotaria a mensagem aos investidores de que o Brasil é confiável para executar requisitos de capital a tempo e dentro do orçamento.

O Brasil, como país em rápido desenvolvimento e com recursos para sediar a Copa do Mundo, talvez tenha condições peculiares para se beneficiar de um mega evento. A análise aqui apresentada argumenta a favor da conceituação da Copa do Mundo não como um estimulador direto da economia, mas provavelmente como uma das melhores oportunidades com que um país pode contar para melhorar sua infraestrutura interna. A Copa do Mundo de 2014 apresenta ao país – e a suas cidades – uma oportunidade única de melhorar, acima de tudo, seu sistema de transportes. Ao considerar o atual estado de desenvolvimento do Brasil e o grau em que cresceu nas duas últimas décadas, observa-se que melhorias nessa área ajudariam a visibilidade do país no cenário mundial.

O legado de uma Copa do Mundo para o Brasil irá muito além dos ganhos sociais, econômicos e políticos. Sem dúvida, o país espera beneficiar-se de melhores aeroportos, estradas, ferrovias e metrôs, mais habitações, recursos humanos mais qualificados nos setores de hotelaria, turismo e restaurantes, abertura de novos empregos em diversas áreas da economia e novas oportunidades internacionais para os negócios do país. Além disso, com a transmissão em tempo real dos jogos a bilhões de telespectadores e a presença de dezenas de milhares de turistas e jornalistas nas 12 cidades-sede, o país será o centro da atenção mundial.

Outros benefícios incluem um avanço significativo no setor de telecomunicações. Além dos estádios e seu entorno, com as multidões que comparecem aos jogos, outras festividades e relacionadas à Copa do Mundo e atrações turísticas apresentarão oportunidades e desafios. Entre as mais concorridas estão as Fan Fests (festas de fãs), criadas pela Fifa durante a Copa do Mundo de 2006, na Alemanha. Foram realizadas Fan Fests em 12 locais da Alemanha, onde 18 milhões de pessoas, no total, assistiram aos jogos em telões. A inspiração para as Fan Fests veio das multidões que se reuniam para assistir aos jogos em locais públicos na Copa do Mundo de 2002, no Japão e na Coreia do Sul. Na Copa do Mundo de 2010, na África do Sul, um número enorme de pessoas que não conseguia lugar nos estádios assistia aos jogos nas ruas de 16 cidades de diferentes partes do país. Este tipo de mecanismo permitirá a milhões de brasileiros participar e representará uma contribuição significativa ao legado do evento.

A Copa do Mundo será um momento de grande simbolismo para o Brasil. Como ocorreu em 1950, o Brasil quer demonstrar ao mundo sua grande capacidade de crescimento e seu papel como “grande país”. A diferença em relação a 1950 é que o país está de fato atravessando um momento muito especial de sua história e, ao contrário do que ocorreu naquele ano, deve empenhar-se em criar um legado mais duradouro, dentro e fora das quatro linhas.

Jogos Olímpicos de 2016

Os Jogos Olímpicos ocorrem somente daqui a quatro anos, entre 5 e 21 de agosto de 2016, com expectativa de 10.500 atletas de delegações de 205 países, competindo em 28 modalidades distintas. Ao contrário da Copa do Mundo, as Olimpíadas ocorrem em uma única cidade-sede, em um espaço de tempo bem menor (17 dias em vez de 32), com vários eventos simultâneos (na Copa, a regra é não haver jogos simultâneos e, ao aproximar-se da fase final, há intervalos de dias sem jogos).

Por um lado, isso significa uma necessidade menor de transporte entre cidades, devendo-se garantir apenas a chegada e a saída de turistas para todas as partes do mundo (o que inclui o transporte entre Rio e São Paulo, já que esta última é o destino de grande parte de voos internacionais). Por outro lado, são quase 400 mil turistas esperados para assistir aos jogos, número comparável ao da Copa do Mundo, com a diferença de ser concentrado na cidade do Rio de Janeiro. Para o evento, obras de mobilidade urbana passarão a ser fundamentais para uma boa organização dos jogos. Além disso, em vez de 12 estádios, são necessárias 34 instalações de competição, além da Vila Olímpica, local onde as delegações ficarão alojadas.

A situação, entretanto, é mais animadora do que aquela da Copa do Mundo. Das 34 instalações necessárias, 18 já estão em funcionamento (oito ainda passarão por reforma), sete serão temporárias e nove serão deixadas como legado dos jogos. Esses números são devidos, sobretudo, à infraestrutura deixada pelos Jogos Panamericanos de 2007. Os organizadores dos jogos devem implementar instalações temporárias onde for necessário. Em Londres, locais permanentes foram construídos apenas para uma utilização de longo prazo. Quando não havia a previsão dessa utilização, locais temporários foram construídos. Onde a viabilidade não é certa, o Rio deve adquirir e implantar os ativos temporários de Londres para reduzir custos. No entanto, é necessário pensar de uma forma expansiva sobre o legado para o Rio de Janeiro. Alguns líderes dessa cidade consideram uma campanha para promover a cidade como “capital dos esportes”, na qual instalações de alta qualidade são um pré-requisito.

Os Jogos Olímpicos constituem uma oportunidade específica para a competitividade futura do Rio de Janeiro, porque esta será uma ocasião em que a cidade desfilará aos olhos do mundo.

As Olimpíadas criam uma oportunidade específica para o Brasil e para o Rio de Janeiro aumentarem sua competitividade em uma economia mais intensiva de capital, pois colocarão o Brasil e o Rio de Janeiro no centro das atenções mundiais. Diante do progresso econômico do Brasil, como economia rica em recursos – e principalmente a força emergente do Rio de Janeiro em petróleo e gás –, será fundamental tirar proveito dessa oportunidade. Não estamos afirmando que as Olimpíadas possam solucionar problemas de longo prazo ou introduzir uma transformação radical da noite para o dia, mas será possível fazer diferença em relação a alguns dos antigos problemas enfrentados por essa cidade, em termos de infraestrutura urbana e segurança.

Cultura de execução eficiente

É importante aprender as lições da experiência de outras cidades e regiões-sede. Ao mesmo tempo, porém, fica claro que, como cidade global com crescentes níveis de investimento do setor privado, o Rio de Janeiro precisará capitalizar as Olimpíadas de maneira diferente da de outras cidades, extraindo o máximo da oportunidade de investir em uma área em franco crescimento – a Barra da Tijuca – e conectá-la ao restante da cidade para sustentar o atual crescimento propiciado pelos recursos naturais. Isso significa identificar de que maneira os Jogos Olímpicos poderiam contribuir para a competitividade futura e superar as barreiras para concretizar o futuro do Rio de Janeiro como uma economia diversificada, dependendo cada vez mais de serviços e inovação.

Como o crescimento do Brasil é orientado pelo boom de indústrias de commodities, como petróleo e gás, metais e biomassa, os investimentos em infraestrutura somente se transformarão em crescimento macroeconômico de longo prazo se o país estabelecer uma cultura de execução eficiente de projetos de infraestrutura. Se o legado das Olimpíadas para o Brasil for a produtividade de capital para projetos de infraestrutura a serem executados dentro do prazo e do orçamento, esse legado ajudará a atrair o nível de investimentos necessários para os próximos cinco ou dez anos.

Os Jogos podem ser uma ótima iniciativa de mobilização de uma cidade. Os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos podem reunir pessoas de diferentes comunidades em experiências positivas e motivar um senso de orgulho nacional ou comunitário que transcende diferenças culturais ou de classe. Podem também reunir pessoas, empresas, instituições e a prefeitura para refletir sobre o desenvolvimento da cidade no longo prazo, com evidentes implicações econômicas. Podem formar capital social e, em alguns casos, já fomentaram a reconciliação nacional, como ocorreu na Copa do Mundo de rugby da África do Sul, em 1995. Para o Rio de Janeiro, a oportunidade de superar, de maneira definitiva, difíceis problemas de segurança do passado é uma parte importante do legado das Olimpíadas.

Conclusão

Willi Lemke, consultor especial do secretário geral das Nações Unidas em Esportes para Desenvolvimento e Paz, declarou antes da Copa do Mundo de 2010 na África do Sul: “[A imagem] é há muito tempo um problema na África, e, quando a mídia se concentra em escândalos e outros problemas, isso só serve para reforçar ainda mais o círculo vicioso…. É de fundamental importância que a África consiga fazer com que as pessoas, ao menos uma vez, falem sobre o lado positivo do país. A África do Sul tem a oportunidade perfeita para mostrar ao mundo sua beleza, seu mundo animal, sua cultura, sua diversidade e seu povo feliz”.

Em 2014 e novamente em 2016, o Brasil terá oportunidades semelhantes – e o país precisa se planejar estrategicamente para maximizar o legado desses eventos, evitar construir “elefantes brancos” e garantir que a infraestrutura física seja entregue a tempo e dentro do orçamento. Com esse feito, o Brasil poderá provar ao mundo que está pronto para assumir seu lugar como importante ator na estabilidade econômica e na governança mundiais.


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