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Interesse Nacional
11 novembro 2024

Brasil é o maior mercado de cidades inteligentes da América Latina

De acordo com Jonatas Mendonça, o fato de ser o maior mercado não significa, necessariamente, que tenha o maior destaque quando o assunto é inovação

Os projetos de cidades inteligentes no Brasil costumam se concentrar em alguns campos, como a geração de energia – Fotomontagem Jornal da USP com imagens de: Freepik

Curitiba, São Paulo, Florianópolis e Vitória são alguns destaques quando se fala em cidades inteligentes no Brasil – isto é, cidades que desenvolvem políticas para construir algo inovador e voltado para os próprios cidadãos. Jonatas Mendonça, pesquisador da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e especialista no tema, comenta que se tem hoje “uma oportunidade e um desafio para os gestores públicos repensarem as suas políticas para construir cidades melhores e mais inteligentes”.

Segundo ele, a estrutura brasileira, ainda que longe de perfeita, é suficiente para desenvolver bons projetos, mas estes precisam ser mais bem pensados. Se não, como ele mesmo coloca, o que vai acontecer é termos “cidades tecnológicas, mas cidades burras, que produzem mais desigualdades, ao invés de produzir uma cidade melhor para todo mundo”.

Hoje, não há exatamente um plano conjunto de desenvolvimento e as iniciativas devem partir de cada município. Capitais do Sul e Sudeste, em geral, tomam a frente, mas projetos em cidades menores tampouco são raros. Cada política é pensada pontualmente, “sem que, necessariamente, elas tenham um projeto específico para o desenvolvimento de cidades inteligentes” como um todo.

O que está sendo feito hoje?

Jonatas Mendonça diz que os projetos de cidades inteligentes no Brasil costumam se concentrar em alguns campos. O primeiro é a geração distribuída, em que há a geração de energia independente da rede central. Painéis solares são um exemplo, pois um prédio pode produzir energia para si sem precisar consumir da rede municipal.

“Esse é um projeto que tem sido adotado por diversos municípios, além da distribuição do sinal de Wi-Fi, que também é um dos principais requisitos dos prefeitos quando eles querem adotar projetos de cidades inteligentes. Uma das principais ideias é adotar a distribuição do sinal Wi-Fi grátis e público em praças, ruas movimentadas ou então no transporte público”, conta ele.

A iluminação pública corre pela lateral, com menos investimento do que projetos de Wi-Fi e geração distribuída, mas consegue boa aderência por ter o apoio direto do governo federal. Além disso, a segurança pública também recebe uma quantidade significativa de investimentos. “Tem muitos municípios querendo colocar câmeras de vigilância, reconhecimento facial, e integrar isso com as Secretarias de Segurança Pública”, afirma o pesquisador.

Como o Brasil se compara com o mundo?

O especialista diz que, “em termos de volume, o Brasil, sem dúvida, é o maior mercado de cidades inteligentes hoje na América Latina, mas não é o mercado que tem o maior destaque em relação à inovação”. De acordo com ele, não quer dizer que as políticas brasileiras sejam ruins ou que não funcionem, mas sim que elas ainda são superficiais. “Justamente porque os prefeitos estão preocupados ainda com a distribuição de sinal, com a questão de segurança pública, e isso não traz inovação tecnológica.”

Esse problema de pouca inovação e de querer fazer só o feijão com arroz, ou só projetos que tenham visibilidade, vem de uma questão muito conhecida no País: o uso de projetos como propaganda política. “Tem muita preocupação no ciclo eleitoral para oferecer um resultado que seja prático, mas, de maneira geral, a estrutura da cidade continua sendo pensada para poucas pessoas.” Ele complementa: “Até podemos ter um sistema mais prático e mais eficiente de iluminação pública, mas essas não são transformações estruturais do ponto de vista da cidade melhor para todos”.

Conforme ele explica, muitos projetos são focados nos centros e onde já existe certo desenvolvimento, e não onde mais se precisa de ajuda, que são as regiões de baixa renda. Além disso, ainda que os projetos feitos sejam considerados por ele “importantes”, continuam sendo pouco inovadores e ousados. Áreas como transporte, meio ambiente, saneamento e digitalização não costumam ser prioridade das políticas atualmente.

O que deve ser feito?

Segundo ele, de fato há pouco interesse em atacar os problemas pela raiz: “Essa é uma preocupação que eu não vejo nos projetos e congressos de cidades inteligentes que eu participei”. Mendonça comenta que, pensando em cidades grandes, um exemplo de política pública que de fato poderia melhorar a qualidade de vida das pessoas é a descentralização urbana.

De acordo com uma pesquisa da Rede Nossa São Paulo e da Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), o paulistano médio gasta 2h25/dia de deslocamento. Aqueles que moram em regiões muito periféricas podem gastar até cinco horas por dia, um problema que afeta milhares, mas que é pouco avaliado. Outras questões como moradia, distribuição de serviços e necessidades básicas são também negligenciadas, em parte por estarem fora do eixo financeiro.

O especialista considera essa uma situação grave, pois deixa de ajudar a quem mais precisa. “Esses projetos atacam de forma muito lateral essas questões ou nem atacam. Vemos pouca efetividade desses projetos e pouca preocupação em equacionar questões de fatos estruturais.”

Este texto é uma reprodução autorizada de conteúdo do Jornal da USP - https://jornal.usp.br/

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