O meio ambiente e os municípios
As diretrizes gerais da política ambiental são determinadas pela União, mas estados e municípios têm papel de relevo não só na sua implementação, mas sobretudo na formulação de regras adicionais que possam atender às demandas locais
Com a proclamação da República e a superveniência da Constituição de 1891 o Brasil optou por ser uma federação, com a “união perpétua e indissolúvel de suas antigas províncias” (artigo 1º).
Essa opção manteve-se, atravessando as constituições e cartas outorgadas desde então, até a atual Constituição democrática de 1988, que consagra a “República Federativa”.
Por definição, uma federação pressupõe a convivência de duas ordens jurídicas, a da União e a dos estados membros. O caso brasileiro, em função da herança portuguesa, agrega mais uma ordem jurídica, a dos municípios, isso desde a Constituição de 1891 (artigo 68), “em tudo quanto respeite ao seu peculiar interesse”.
Portanto, as competências constitucionais hão de ser divididas em três ordens, a federal, a estadual e a municipal. Existem para tanto dois critérios de divisão: o da competência exclusiva, quando o ente competente afasta ipso facto os demais e o da competência concorrente, em que convivem entre si duas ou três órbitas de competência.
Em se tratando do meio ambiente o legislador constitucional de 1988 considerou-o “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (artigo 225), atribuindo às três ordens jurídicas competência para sobre ele dispor (artigos 23, VI e VII, 24, VI e VIII e 30, I e II).
Assim, nessa matéria convivem normas federais, estaduais e municipais. Ainda que caiba à União o papel de ditar as diretrizes da política ambiental, estados e municípios têm papel de relevo não só na sua implementação, mas sobretudo na formulação de regras adicionais que possam atender às demandas locais.
Nesse particular, o município de São Paulo tem procurado cumprir o seu papel, e o tem feito com grandes méritos. A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) tem editado uma série de normas regulamentares que condicionam a obtenção de permissões, licenças e autorizações integrantes de seu poder de polícia ao cumprimento de normas ambientais.
A grande novidade nesse contexto é a da edição de regras que exigem, por parte dos munícipes, uma atitude proativa quanto à revelarem a sua emissão de gases efeito estufa e dos seus compromissos quanto à sua mitigação gradativa.
Essa providência regulatória, inclusive, vai ao encontro do PL 182, ora em discussão no Congresso, que cria o Sistema Brasileiro de Emissões, instituindo obrigações de natureza similar.
Existem áreas particularmente sensíveis onde os municípios podem em muito colaborar com o meio ambiente construindo um quadro regulatório de exigências a serem cumpridas em seus territórios, em adição as que existem e venham a existir por parte do Estado em que se situam e da União Federal.
Para citar apenas duas, no campo da coleta e tratamento de resíduos sólidos urbanos e de proteção de recursos hídricos à parte normas estaduais e federais podem e devem existir as municipais, com base na competência constitucional antes referida.
Indo um passo além, podem os municípios credenciar empresas autorizadas a certificar emissões e mitigações e exigir dos munícipes o atendimento a standards cientificamente comprovados de atendimento à proteção do meio ambiente.
Em suma, como está demonstrando o município de São Paulo, muito há o que fazer nesse terreno. Se não agora, quando? Se não nós, quem?
Fernando Antônio Albino de Oliveira, advogado pela USP, mestre pela NYU e doutor pela USP. Foi diretor da CVM. Atua em direito empresarial, com ênfase em projetos de infraestrutura e mercado de carbono.
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional