01 abril 2022

Quem precisa de general quando generais agem por consenso?

Pablo Cerdeira, advogado com foco em tecnologia, estuda a fundo a dimensão e o potencial dos impactos das criptomoedas e dos criptoativos no mundo atual. Neste artigo, ele traça um cenário desde o seu uso em áreas de conflitos deflagrados, até sua adoção por criminosos. Depois, destaca que, muito em breve, o mundo será forçado a uma reestruturação de sistemas monetário e financeiro, o que, consequentemente, talvez afete, até mesmo, o equilíbrio de forças entre as nações. E alerta que os envolvidos com esse novo mundo “não pararão por aí”.

Talvez o leitor considere o bitcoin e outras criptomoedas e criptoativos apenas mais uma dessas inovações que arrebatam as manchetes dos jornais; mais uma buzzword a compor a constelação formada por startups, social networks, fake news e afins. Talvez compartilhe da visão de Paul Krugman, Nobel de Economia, que, em 2018, dizia que o bitcoin seria uma enorme bolha e que continua, ainda em 2022, a defender essa ideia, dessa vez associando a moeda a uma nova crise semelhante à dos subprimes. Mas o caso dos criptoativos é bastante mais profundo e transformador do que a normalmente oferecida em mais rasas leituras. Vejamos.

Em outubro de 2021, o Fundo Monetário Internacional – FMI assim intitulou seu Global Financial Stability Report: COVID-19, Crypto, and Climate: Navigating Challenging Transitions. Crypto é a forma abreviada de se referir a criptoativos e criptomoedas. Em novembro, Hillary Clinton afirmou que as criptomoedas têm o potencial de enfraquecer moedas tradicionais, o dólar como reserva internacional e até mesmo desestabilizar nações. No início de 2022, caminhoneiros bloquearam cidades inteiras no Canadá em protesto contra o comprovante de vacinação para COVID-19 e passaram a utilizar criptoativos para doações. Isso após o governo canadense bloquear as contas dos líderes dos movimentos. Simultaneamente, nos EUA, senadores Republicanos propuseram projeto de lei para impedir o governo local de bloquear criptoativos, considerando ser essa uma ingerência indevida do Estado sobre a propriedade privada. Os mesmos Republicanos que propuseram também lei para que os EUA avaliem os impactos da adoção do bitcoin como moeda corrente por El Salvador, já que tal ação poderia facilitar o desrespeito a normas de combate à lavagem de dinheiro. Também o FMI se manifestou sobre El Salvador, clamando para que seu presidente revogasse o Decreto 57, de 9 de junho de 2021, que instituiu o bitcoin como moeda de curso legal. Mas para Bukele, presidente de El Salvador, a sua adoção seria questão interna, ainda que com efeitos internacionais. De forma semelhante, mas com fundamentos distintos, o Parlamento da Ucrânia aprovou nos primeiros dias de 2022 sua “Law on Virtual Assets”, reconhecendo pleno valor aos ativos digitais. Elíptico o objetivo da lei: permitir aos cidadãos ucranianos alguma proteção contra a esperada desvalorização de sua moeda no caso de uma agora confirmada invasão russa. Tautologicamente retornando a outubro de 2021, que abre este frenético parágrafo, talvez por temer restrições aos meios de pagamento, às quais à Rússia poderia ser submetida, assim se manifestava Putin em entrevista à CNBC: “as criptomoedas têm o direito de existir e podem ser usadas como meio de pagamento”. Curiosamente, os mesmos criptoativos que servem como solução de “reserva de valor” em um país atacado podem ser também a salvação para a preservação do “meio de troca” para o atacante. 

No mesmo período a bela cidade de Cabo Frio, Estado do Rio de Janeiro, testemunhava manifestações pela libertação de Glaidson Acácio dos Santos, o “Faraó dos bitcoins”. Para as autoridades, alguém que construiu esquema de pirâmide. Para a população local, um Robin Hood que “abriu os olhos das pessoas de que os grandes bancos exploram a população e que o bitcoin é a saída”, conforme relatos colhidos in loco.

E tudo isso é apenas o começo. Mas quais tecnologias são essas? O que são e qual seu verdadeiro potencial?

O conceito de criptomoedas e de criptoativos

De início é preciso entender que criptoativos são uma classe bastante abrangente de ativos digitais compostos por tokens (unidade dos ativos digitais) que podem ser de diversos tipos, como por exemplo os de pagamento, que são as criptomoedas (como bitcoin, ether, ada, dentre outros); de utilidade [utility token], quando utilizados para finalidade específica, como pagamento de taxas das redes; de derivativos [security token] quando representam outros ativos, como ações e quotas de fundos; do tipo não fungível [non-fungible token], como no caso de obras de arte digitais; de governança [governance token], quando conferem a seu titular o direito de voto em decisões de determinado projeto, dentre muitos outros. Isso é a sua taxonomia, não o seu conceito.  

Definir em poucas palavras o que são criptoativos é tarefa complexa. Talvez pudéssemos resumir, não sem perdas: “Os criptoativos são elementos digitais artificialmente escassos em razão da adoção de um conjunto de tecnologias já testadas e validadas, armazenados em sistema de registro totalmente distribuído, não hierarquizado e aberto, cujos registros são imutáveis e interdependentes e suas regras de funcionamento só alteráveis mediante consenso, podendo, inclusive, serem eventualmente de execução automatizada”. Detalhando:

i.
Elementos digitais artificialmente escassos: se no mundo físico a regra é a escassez (produzir 10 cadeiras demanda 10 vezes mais matéria-prima e 10 vezes mais trabalho do que produzir 1 única cadeira), no mundo digital a ausência de escassez é o padrão. Produzir 1 unidade ou 1 milhão de cópias de um determinado conteúdo digital tem a mesma exigência de capital. Por isso, seu valor tende a zero. Para que ativos digitais tenham valor é preciso criar escassez, que é o problema econômico fundamental desde, pelo menos, Daniel Ricardo e John Stuart Mill. Sem escassez, não se pode nem mesmo falar em economicidade. Esse é, portanto, um ponto-chave.

ii.
Conjunto de tecnologias já testadas e validadas: apesar de seu marco de criação ser o ano de 2008, com o whitepaperBitcoin: A Peer-to-Peer Electronic Cash System”, de autoria desconhecida (Satoshi Nakamoto, seu autor, é um pseudônimo), as tecnologias que suportam a rede do bitcoin estão sendo desenvolvidas e utilizadas desde, pelo menos, a década de 70. Por exemplo, os modelos de criptografia compostos por duas chaves (pública e privada) desenvolvido por Diffie-Hellman e as funções de “impressão digital” (hash ou fingerprinting), desenvolvidas por Rabin, Merkle e Yuval. Outras são mais recentes, como a cadeia de time-stamps proposta por Stornetta, em 1991, e o modelo de prova de trabalho (proof-of-work) do haschash, desenvolvido por Back, em 1997. Todas essas tecnologias, como se observa, não são novidades. Podem ser consideradas amplamente testadas e seguras, já que largamente utilizadas pelos navegadores, pelos programas de e-mails, de internet banking, em computadores ou em celulares.

iii.
Armazenados em sistema de registro totalmente distribuído, não hierarquizado e aberto: os criptoativos e suas transferências de posse e/ou propriedade devem estar registrados em ambiente de rede composto por incontáveis computadores interconectados, de forma distribuída, não hierarquizada (nenhum computador é mais importante que os demais que compõem a rede) e essa rede deve ser aberta à entrada de novos participantes para contribuir com o armazenamento distribuído, sem que se exija qualquer documentação ou autorização. Basta um computador e o software adequado para que qualquer um possa integrar as redes que suportam os criptoativos. Essa é a garantia de que a rede dificilmente será controlada, censurada ou de alguma forma impedida de funcionar. O bitcoin é uma dessas redes, e talvez uma das que mais respeite tais fundamentos. Mas há outros modelos que, em troca de maior controle ou maior velocidade nas transferências, sacrificam algumas dessas características. 

iv.
Registros imutáveis e interdependentes: os registros do passado não podem ser alterados, para garantir que uma vez transferido o criptoativo não possa ser transferido novamente por ninguém, a não ser pelo detentor da chave do destinatário (evitar o double-spending). É o que garante, afinal, a produção artificial de escassez e, consequentemente, lhe traz economicidade. Em analogia, seria como se cada folha de um livro contábil fosse iniciada com o resultado da soma de todos os números da folha anterior, levando-se em conta inclusive sua posição. Qualquer alteração em uma folha já preenchida no passado implicaria modificar, necessariamente, todas as folhas seguintes. E isso tem um custo computacional fora das capacidades humanas. É o que garante, também, que a rede é mais confiável que indivíduos, ou a solução para o chamado Problema dos Generais Bizantinos. Tal conclusão se aplica para as redes que seguem o “padrão ouro” aqui descrito, como o Bitcoin, mas não necessariamente para outras blockchains, como aquelas mantidas por empresas ou por grupos restritos de validadores.

v.
Regras de funcionamento só alteráveis mediante consenso, podendo, inclusive, serem de execução automatizada: nada impede que alguém ou um grupo decida alterar os códigos e algoritmos utilizados por uma rede, como a do bitcoin, e isso é feito corriqueiramente. Alguns grupos sugerem mudanças para aumentar a velocidade das transações, em troca de sacrifícios na segurança; outros sugerem mudar os algoritmos de criptografia, aceitando, como efeito colateral, maior concentração e hierarquização na rede etc. Caso as sugestões propostas sejam adotadas pela maioria dos softwares utilizados em determinada rede, esse passa a ser o novo padrão. Se apenas um grupo o adota, ocorre o que se convencionou nomear por “hard fork”, ou bifurcação, com um grupo permanecendo ligado a uma rede, e outro a outra. Algumas redes permitem a inclusão de regras de execução automatizadas, independentemente de intervenção humana, como por exemplo a emissão ou a destruição de moeda, transferência de valores de acordo com condições preestabelecidas ou mesmo que softwares inteiros sejam salvos e executados a partir da rede (o que se convencionou nomear de web3), não estando, portanto, em nenhum computador específico. 

De forma genérica, as redes descritas acima são aquilo que se conhece por blockchain, apesar de esse não ser um conceito bem definido. E são inúmeros blockchains atualmente, desde os mais conhecidos, como o bitcoin e o Ethereum, até outros mais recentes, como a Cardano e a Terra, cada uma com suas especificidades.

Impactos imediatos

As criptomoedas e os criptoativos têm o potencial de substituir com muitas vantagens o dinheiro tradicional e até mesmo servir de suporte para bens escassos como as obras de artes. Com isso, ganham potencial de modificar toda a estrutura de poder desenhada ao longo dos últimos séculos. Algumas de suas vantagens em relação às moedas tradicionais:

i.
São naturalmente globais, não dependendo de nenhum governo, nação ou autoridade para existirem. Podem circular livremente entre fronteiras, sem qualquer burocracia, como a realização de operações de câmbio, declarações aos órgãos responsáveis ou mesmo o pagamento de impostos.

ii.
Sua oferta é muito mais estável e previsível do que a de moedas tradicionais, pois não estão sujeitas a intervenções governamentais, como por exemplo novas emissão (tal como as recentes ofertas de dólares para aquecimento da economia americana em razão da Covid-19) ou seu entesouramento, como ocorre quando do aumento das taxas de juros ou dos compulsórios. 

iii.
Não podem ser penhoradas ou confiscadas. Como sua transferência depende apenas do registro em uma rede distribuída, não hierarquizada e aberta, não há autoridade com poder para impedir sua circulação ou realizar seu confisco. Por essa razão, eles têm sido cogitados como alternativa a moedas tradicionais especialmente em situações de conflitos ou de sanções. Importante que se observe que há, sim, casos de confiscos de criptomoedas e criptoativos, mas isso ocorre quando as autoridades conseguiram confiscar as chaves que permitem a movimentação de tais ativos, e não os ativos propriamente. Em mais uma analogia para tentar clarear conceitos, é como se os criptoativos fossem armazenados em um cofre inviolável. Os casos ocorridos de confisco até hoje não foram decorrentes do “arrombamento do cofre”, mas sim da apreensão das respectivas chaves salvas de forma insegura por seus detentores. Para que se tenha a real dimensão da resiliência de algumas das criptomoedas, basta que se observe que o Governo da China já tentou, por nove vezes, banir o bitcoin, todas sem sucesso. 

Tais características – ainda elementares e apenas os primeiros efeitos das criptomoedas e criptoativos, por ora utilizados por parcela inexpressiva da sociedade – já provocam sensíveis impactos na política internacional e nos mercados locais. Mas são, ainda, apenas seus primeiros passos e impactos. Como bem observou Jay Clayton, ex-presidente da Securities and Exchange Comission – SEC dos EUA em importantíssimo artigo intitulado “America’s Future Depends on the Blockchain”: o mercado de criptoativos, que já atingiu US$ 3 trilhões e movimenta bilhões de dólares diariamente é apenas a ponta do iceberg. Os reguladores estão olhando para o rabo do cachorro, enquanto deveriam olhar para o cachorro. Por essa razão, urge que olhem o cenário maior, e busquem, através de parcerias público-privadas, desenvolver um novo modelo financeiro.

De fato, não devem os reguladores esperar que os desenvolvedores e entusiastas dos sistemas de criptoativos busquem se adequar às normativas e ao status quo vigente. A história do desenvolvimento da criptografia – que está na base dos criptoativos – tem estreita correlação com a cultura cypherpunk e outros movimentos da contracultura, também dos anos de 1960 e 1970, e, por isso mesmo, guarda certa aversão aos modelos regulatórios e estatais tradicionais. Conforme a Declaração de Independência do Ciberespaço, de John Perry Barlow:

We have no elected government, nor are we likely to have one, so I address you with no greater authority than that with which liberty itself always speaks. I declare the global social space we are building to be naturally independent of the tyrannies you seek to impose on us. You have no moral right to rule us nor do you possess any methods of enforcement we have true reason to fear.

[…]

Your legal concepts of property, expression, identity, movement, and context do not apply to us. They are all based on matter, and there is no matter here.

[…]

Our identities have no bodies, so, unlike you, we cannot obtain order by physical coercion. We believe that from ethics, enlightened self-interest, and the commonweal, our governance will emerge. Our identities may be distributed across many of your jurisdictions. The only law that all our constituent cultures would generally recognize is the Golden Rule. We hope we will be able to build our particular solutions on that basis. But we cannot accept the solutions you are attempting to impose.

O bitcoin segue o proposto por Barlow: não reconhece governos ou autoridades, considerando-se um dos elementos de um mudo digital à parte do mundo físico e suas normativas. Um mundo apartado de US$ 3 trilhões, sujeito apenas às normas escritas em seu código e indiferente à opinião de Hillary Clinton ou de Putin, à sua adoção por El Salvador, pela Ucrânia ou pela Rússia. Ou, às nove tentativas de proibição pela China. Por isso, como bem alerta Jay Clayton, reguladores precisam deixar de olhar para o rabo do cachorro e entender o cachorro como um todo, construindo em conjunto um novo modelo regulatório consensual.

O futuro do sistema monetário e financeiro 

Não obstante o bitcoin seja o primeiro e mais conhecido criptoativo, em termos tecnológicos sua rede é bastante limitada em comparação com as outras mais novas. Tecnologias recentes, como por exemplo a rede Solana, tem capacidade de processamento de transações milhares de vezes superior, mas ainda são imaturas, tendo saído do ar ao menos quatro vezes nos últimos 12 meses. A tendência, entretanto, é que com o avanço da tecnologia outros modelos mais complexos consigam provar também sua robustez.

Algumas dessas novas redes apresentam modelos bastante promissores, capazes de, em tese, substituir não “apenas” as moedas, mas todo o sistema financeiro e monetário atual, composto por instituições financeiras, instituições de pagamento, fundos, mecanismos de empréstimos e de equilíbrio do valor da moeda. Mas para isso é preciso superar alguns desafios.

Um deles é conseguir desenvolver uma criptomoeda que consiga manter certa estabilidade de valor para ser capaz de cumprir as três funções básicas das moedas: (i) reserva de valor, (ii) unidade de conta e (iii) meio de troca. O bitcoin, ainda que tenha se provado um dos melhores investimentos dos últimos anos, não apenas preservando valor, mas aumentando-o, peca em ser unidade de conta em razão de sua alta volatilidade em relação ao dólar.

Por essa razão, diversos projetos implementam o que se convencionou chamar de stablecoins, ou criptomoedas que de alguma forma mantêm seu valor estável em relação a ativos do mundo físico, na maioria das vezes, o dólar. Em regra, as stablecoins utilizam lastro em seu ativo subjacente para manutenção de valor. As stablecoins USDT, USDC e BUSD são alegadamente lastreadas em dólar. Para cada USDT, USDC ou BUSD emitido haverá, em tese, um dólar depositado pelo emissor como garantia. Assim como as moedas, que já foram um dia lastreadas em ouro e depois em dólar. Entretanto, em muitos dos casos as provas do lastro são bastante precárias e já objeto de investigações.

Mas alguns modelos de criptomoedas já começam a conseguir sucesso na estabilização de seu valor de forma independente de lastro. São as stablecoins algorítmicas, como a UST da rede Terra. A existência de uma criptomoeda que consiga manter sua paridade ao dólar apenas com o controle automatizado de oferta e demanda pode parecer algo obscuro, mas não é muito diferente do que já fez o Brasil durante a implementação do Plano Real. Para isso, a criptomoeda central da rede Terra (também chamada Terra), persegue o valor da Special Drawing Rights – SDR, calculado pelo FMI a partir de uma cesta de moedas. E o equilíbrio do preço, tanto da moeda Terra quanto da moeda UST (que persegue o valor do dólar), é feito com expansão ou contração da base monetária, no caso da moeda Luna. Segundo a própria documentação, o papel da moeda Luna é absorver a volatilidade de preço da moeda principal. Algo muito semelhante ao papel do Cruzeiro Real, que absorvia a volatilidade enquanto a outra “quase-moeda”, a Unidade Real de Valor – URV, mantinha seu valor, até que, dotada de poder liberatório, tornou-se o Real que usamos atualmente.

Mas no mundo físico manter a estabilidade de valor com um par de moedas é processo complexo que envolve múltiplas pesquisas de preços realizadas diariamente, coordenação de esforços, difusão diária de novas tabelas etc. Já no caso do sistema algorítmico, esse controle é feito em tempo real, e a expansão e contração da base monetária é automatizada. É, inclusive, completamente transparente, podendo ser acompanhado por qualquer interessado em painéis como: https://terra.smartstake.io/ust.

Os experimentos não param por aí. Alguns projetos permitem a seus usuários atuarem como provedores de liquidez ou de empréstimos, substituindo os próprios bancos, sempre com o valor dos juros definidos por algoritmos ou por consenso e com lucros distribuídos pelos participantes. Por essa razão, alguns conseguem oferecer remuneração de quase 20% ao ano em moeda estável e pareada ao dólar. Algo incomparável à rentabilidade média dos investimentos de renda fixa nos EUA, próximos a 0,4% ao ano. Por essa razão, muitos norte-americanos estão abandonando seus investimentos bancários e migrando para investimentos em cripto em projetos de DeFi – Decentralized Finance como Sushi, Aave, Curve ou Balancer. 

O futuro do sistema

O mundo parece ter começado a entender a dimensão e o potencial de impactos das criptomoedas e dos criptoativos, que vão, neste momento, desde seu uso em áreas de conflitos deflagrados, até sua adoção por criminosos. Muito em breve, provavelmente estarão nos forçando a uma reestruturação de nossos sistemas monetário e financeiro e, consequentemente, talvez até mesmo do equilíbrio de forças entre as nações. Mas provavelmente não pararão por aí. 
Como diz o jurista Joaquim Falcão, “a Lex Crypto se baseia na confiança da estrutura matemática distribuída, que resulta em maior velocidade, ausência de burocracia e baixo custo de transação”. E, continua, “No manuscrito do fim do século XVIII, ele [La Fayette] pergunta a Jefferson se o povo norte-americano já tinha aderido à ideia de Constituição que procuravam implantar. Não conheço a resposta de Jefferson. Mas conheço o argumento de La Fayette. Se o povo não aderir à Constituição, dificilmente ela será executável”. A sociedade não precisa entender com o nível de detalhamento aqui exposto os conceitos que suportam os criptoativos. Basta sua adesão. O mesmo não se pode dizer para autoridades e agentes reguladores, como bem observou La Fayette, in loco.   

É advogado formado pela Universidade de São Paulo; sócio do escritório Galdino & Coelho com foco em Direito Empresarial, Arbitragem e Tecnologia; vice-presidente de Tecnologia e Inovação do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem – CBMA. Foi professor da FGV- Direito no Rio de Janeiro

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