Como Joe Strummer, do The Clash, inspirou a política progressista em seus fãs
Vocalista e letrista da banda seminal de punk morreu há 20 anos e deixou músicas que forneceram a muitas pessoas uma educação inicial eficaz, mas não convencional, sobre questões políticas britânicas e globais, e tiveram impacto profundo na política de muitos, levando alguns ao ativismo de esquerda
Vocalista e letrista da banda seminal de punk morreu há 20 anos e deixou músicas que forneceram a muitas pessoas uma educação inicial eficaz, mas não convencional, sobre questões políticas britânicas e globais, e tiveram impacto profundo na política de muitos, levando alguns ao ativismo de esquerda
Gregor Gall, University of Glasgow
Joe Strummer, vocalista e letrista da banda seminal de punk The Clash, morreu há 20 anos em dezembro. Strummer, filho de um alto funcionário britânico e cujo nome verdadeiro era John Graham Mellor, escreveu canções que não se esquivavam da política da Era Thatcher ou das situações que afetam a sociedade ao redor do mundo.
The Clash lançou seis álbuns de estúdio, com 16 hits no top 40, incluindo Rock the Casbah e I Fought the Law. Após sua morte, o jornal The Guardian observou que Strummer foi uma “inspiração política para uma geração” e “a consciência política do punk”.
Conversei com mais de 100 indivíduos de diferentes idades e gêneros de diferentes gerações, países e continentes para o meu livro The punk rock politics of Joe Strummer: Radicalism, resistance and rebellion. Descobri que sua música teve um impacto profundo na política de muitos, levando alguns ao ativismo de esquerda. Entre eles estão muitos líderes sindicais na Grã-Bretanha atual, incluindo Matt Wrack, do Fire Brigades Union, que disse: “Os bombeiros estão imensamente orgulhosos de nossos vínculos com Joe Strummer e o que ele defendeu politicamente e como músico”.
De acordo com muitos daqueles com quem conversei, as letras da música do The Clash forneceram a eles uma educação inicial eficaz, mas não convencional, sobre questões na Grã-Bretanha e de outros lugares, como desemprego e moradias precárias na Grã-Bretanha, bem como várias causas políticas globais, como a luta do movimento sandinista na Nicarágua na década de 1980.
Letras políticas
Duas músicas de Strummer se destacam em particular para as pessoas com quem conversei. A primeira é Spanish Bombs do terceiro álbum da banda, London Calling (1979), que foi principalmente sobre a Guerra Civil Espanhola de 1936-1939, Strummer canta:
Como uma canção sobre a luta do governo republicano democraticamente eleito contra o golpe militar fascista de Francisco Franco, conta como socialistas, comunistas, republicanos e anarquistas lutaram juntos por liberdade e igualdade. As bombas espanholas levaram muitos que me deram depoimentos a lerem Homenagem à Catalunha, de George Orwell.
A música também forneceu um exemplo histórico de resistência ativa ao fascismo quando um nacionalismo de extrema direita estava em ascensão na Grã-Bretanha no final dos anos 1970. O partido político marginal National Front concorreu em uma plataforma anti-imigrante extrema na década de 1970, usando slogans e panfletos racistas para atrair membros. Isso, por sua vez, foi recebido com uma reação cada vez mais vocal de músicos como Strummer e o movimento Rock Against Racism.
Uma visão internacional
O quarto álbum da banda, Sandinista!, lançado em 1980, abraçou a causa dos rebeldes sandinistas contra o regime de Somoza na Nicarágua e atacou as tentativas dos EUA de minar a revolução. A família Somoza liderou uma ditadura assassina e repressiva a partir da década de 1930, apoiada pelos EUA e que caiu em 1979 como resultado de uma rebelião armada popular liderada pelos sandinistas.
A música de Strummer Washington Bullets faz referência aos efeitos antidemocráticos do imperialismo americano na América Central e do Sul, desde a Revolução Cubana de 1959 até os sandinistas nicaraguenses da década de 1980, com menção à abortada invasão americana da Baía dos Porcos em Cuba em 1961 e o assassinato do chileno Salvador Allende nas mãos da ditadura militar chilena em 1973. Nele, ele canta:
A música então detalha o que aconteceu quando os EUA retiraram seu apoio ao regime nicaraguense de Somoza:
Strummer explica que, apesar da repressão, a resistência é possível – e pode ser bem-sucedida. Sua raiva na música não é apenas dirigida contra Washington, mas também contra o imperialismo britânico, chinês e russo. Não só alguns daqueles com quem falei se juntaram ao Comitê de Solidariedade da Nicarágua, mas alguns também foram trabalhar como voluntários na Nicarágua para apoiar a revolução sandinista.
Buscando conhecimento
Muitos daqueles com quem conversei me contaram que antes da era da internet, eles iam às bibliotecas públicas para saber mais sobre essas questões. A partir daí, eles começaram a formar visões de mundo radicais e passaram a participar de campanhas como o movimento antiapartheid e a Campanha pelo Desarmamento Nuclear. Muitos também aderiram a sindicatos e partidos políticos de esquerda, como o Partido Trabalhista. E, com o interesse despertado, começaram a ler mais amplamente.
Strummer conseguiu alcançar as pessoas através de sua música. Suas canções não apenas fizeram as pessoas dançarem, mas, através de suas mensagens radicais, foram capazes de inspirar alguns fãs a partir para a ação. Seja o fascismo e o imperialismo ou destruição ambiental (London Calling), combate ao racismo (Working for the Clampdown) e thatcherismo (This is England), ele comoveu as pessoas.
Strummer raramente era explícito sobre o que os ouvintes deveriam fazer –suas músicas tendiam a ser mais informativas e inspiradoras do que instrutivas. Mas ele sempre deixou claro que o ativismo era positivo e necessário para efetuar a mudança. O primeiro single do The Clash em 1977, White Riot, encorajou jovens brancos insatisfeitos a lutar contra a corrupção política e a brutalidade policial como seus irmãos negros fizeram. Em Working for the Clampdown do álbum de 1979 da banda London Calling, ele emitiu este chamado às armas:
*Gregor Gall é pesquisador da School of Political and Social Sciences, University of Glasgow
Este texto é uma republicação do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original, em inglês.
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional
Editor-executivo do portal Interesse Nacional. Jornalista e doutor em Relações Internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Mestre pelo KCL e autor dos livros Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial), O Brazil é um país sério? (Pioneira) e O Brasil voltou? (Pioneira)
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