Editorial: Política externa ofuscada nas eleições
Propostas de candidatos a presidente não refletem mudanças no cenário global, repetem planos já testados no passado e falham ao não indicar aspectos relevantes que terão impacto sobre as políticas econômicas, comerciais e de defesa nos próximos anos
Propostas de candidatos a presidente não refletem mudanças no cenário global, repetem planos já testados no passado e falham ao não indicar aspectos relevantes que terão impacto sobre as políticas econômicas, comerciais e de defesa nos próximos anos
Por Rubens Barbosa*
A Política Externa foi pouco discutida e analisada pelos candidatos na campanha eleitoral, apesar das incertezas e impactos sobre o Brasil, sobre a economia global e sobre a política internacional em consequência da pandemia e da guerra na Ucrânia. Os documentos relacionados com programas de governo dos dois candidatos são muito gerais, denotam conotações ideológicas e deixam de fora aspectos importantes do relacionamento externo do Brasil.
Na Carta para o Brasil do Amanhã, o candidato Luiz Inácio Lula da Silve deu prioridade a 13 itens, entre os quais a política externa. O compromisso principal anunciado é o de superar o isolamento internacional e reposicionar o Brasil como protagonista no mundo, romper o isolamento e retomar a política externa exitosa. Para isso, é fundamental ampliar o comércio exterior e a cooperação tecnológica, além promover relações mais justas e democráticas entre os países. Retomar a política externa soberana, altiva e ativa, promovendo o diálogo democrático e respeitando a autodeterminação dos povos. Voltar a dar prioridade à integração regional, ao Mercosul e a outras iniciativas latino-americanas, bem como ao diálogo com os BRICS, com os países da África, União Europeia e Estados Unidos. Reafirmar e fortalecer os pactos internacionais relativos ao desenvolvimento sustentável, em especial no marco da Convenção do Clima. Cultivar relações de mútuo respeito com todos os países.
O mundo mudou e o Brasil também mudou. Nesse novo contexto, para o Brasil do amanhã, deixaram de ser mencionados alguns aspectos relevantes que terão impacto sobre as políticas econômicas, comerciais e de defesa nos próximos anos do mandato que se inicia em 1º de janeiro. Qual a posição do Brasil diante dos desafios geopolíticos, trazidos pela guerra e pela confrontação dos EUA com a China? Serão retomadas as negociações dos acordos comerciais, em especial para a conclusão do acordo do Mercosul com a União Europeia e com o EFTA e para o ingresso do Brasil na OCDE? Como será, nesse novo mundo, a política externa altiva e ativa que prevaleceu no governo Lula 20 anos atrás? E a ação do Brasil nos organismos internacionais, em especial na OMC e na ONU, com a possibilidade de ampliação dos membros permanentes do Conselho de Segurança?
No tocante ao eventual governo de Bolsonaro, no programa de governo do candidato, menciona-se que a política externa será universalista e estará alinhada aos princípios incluídos no artigo 4º da Constituição. A Prioridade para as relações com os países afins ideologicamente e com nosso entorno geográfico nas Américas e no Atlântico Sul. Ampliar as parcerias econômicas multilaterais e bilaterais, e acordo com a prioridades da política econômica. Ampliação da liberalização comercial, buscar investimentos e tecnológicos. Acelerar as negociações para o ingresso do Brasil na OCDE, além da aprovação do acordo Mercosul-União Europeia. Buscar a redução das vulnerabilidades que surgiram com a pandemia e com a guerra na Ucrânia. Estimular a participação do Brasil nos organismos multilaterais, em temas de interesse direto do Brasil, inclusive o de meio ambiente.
Em linhas gerais, estão repetidas as principais linhas de atuação desenvolvidas nos últimos dois anos do atual governo, com forte influência ideológica conservadora. Podem ser ressaltadas as ausências de referência sobre a integração regional e o Mercosul, além das relações com a África, com o BRICS e com a China, o principal parceiro do Brasil.
*Rubens Barbosa foi embaixador do Brasil em Londres, é diplomata, presidente do Instituto Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e coordenador editorial da Interesse Nacional.
Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.
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