Encontro de ministros do BRICS mostra que grupo atravessa um momento difícil pela ação da Rússia na Ucrânia, mas foi significativo ao reafirmar os pilares do grupo e o interesse de seus membros em manter reuniões e contatos regulares para superar a atual conjuntura

Por Rubens Barbosa*
No dia 19 passado, realizou-se mais uma reunião de ministros do exterior do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) coordenada virtualmente pela China. Na ocasião, os Ministros reafirmaram o compromisso dos países-membros de continuar a aprimorar a estrutura de cooperação intra-BRICS sob os três pilares –político e de segurança, economia e finanças, intercâmbios interpessoais e culturais–, para conter a propagação e os efeitos da pandemia de Covid-19 com solidariedade, para acelerar a implementação da Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável e para ampliar e aprofundar ainda mais a cooperação entre os países do BRICS. Nesse sentido, os ministros concordaram que, diante dos novos desafios e características emergentes, os países do BRICS devem aumentar sua solidariedade e cooperação e trabalhar juntos para enfrentá-los.
Em comunicado curto (25 parágrafos) em relação a reuniões anteriores, podem ser destacados:
1) Ênfase muito grande no multilateralismo
2) Referência à guerra da Ucrânia
3) Visão de futuro (TIC e IA)
4) Menção a possibilidade de ampliação do grupo
No tocante ao multilateralismo, os ministros reiteraram seu compromisso com o multilateralismo por meio da defesa do direito internacional, inclusive os propósitos e princípios consagrados na Carta das Nações Unidas como sua pedra angular indispensável, e com o papel central das Nações Unidas em um sistema internacional no qual Estados soberanos cooperam para manter a paz e a segurança, promover o desenvolvimento sustentável, garantir a promoção e proteção da democracia, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos e promover a cooperação baseada no espírito de respeito mútuo, justiça e igualdade. Os ministros reiteraram igualmente seu compromisso de realçar e aprimorar a governança global, promovendo um sistema mais ágil, eficaz, eficiente, representativo e responsável, realizando consultas e colaboração inclusivas para o benefício de todos com base no respeito à soberania, à independência, à integridade territorial, à igualdade, aos interesses e preocupações legítimos dos diferentes países, com menção especifica desde a OMC (comercio), OMS, Agenda 2030, Acordo de Paris (meio ambiente), Comissão de Direitos Humanos até ao Comissão de Desarmamento (armas nucleares).
Foi importante a inclusão de parágrafo sobre a situação na Ucrânia, em termos claros, ao recordar as posições nacionais, conforme expressas nos fóruns apropriados, como o CSNU e a AGNU. Os ministros expressaram apoio às negociações entre a Rússia e a Ucrânia, discutiram suas preocupações sobre a situação humanitária dentro e ao redor da Ucrânia e expressaram seu apoio aos esforços do secretário-geral da ONU, das agências da ONU e do CICV para fornecer ajuda humanitária de acordo com a resolução 46/182 da Assembleia Geral da ONU.
No tocante a inteligência artificial e ao TIC, com visão prospectiva, os ministros apoiaram o papel de liderança das Nações Unidas na promoção do diálogo construtivo para garantir a segurança das TIC, inclusive dentro do Grupo de Trabalho Aberto da ONU sobre a segurança e o uso de tecnologias de informação e comunicação (TIC) para 2021-2025, e de desenvolver um marco legal universal neste domínio. Ressaltaram a importância de estabelecer marcos legais de cooperação entre os países do BRICS para garantir a segurança no uso das TICs. Os ministros também apoiaram o intercâmbio de informações e a cooperação técnica em tecnologia de Inteligência Artificial (IA) ressaltando seu enorme potencial para os países membros.
Quanto à possibilidade de ampliação do grupo, apenas a China está fazendo essa proposta. Corretamente, os outros membros mantem suas reservas à inclusão de novos membros, pois a relevância do grupo advém do peso politico e econômico desse reduzido de países com características próprias. Caso se abra a porta, com certeza, diversos países pedirão para entrar, o que descaracterizara o peso específico do grupo.
Não há dúvida de que o BRICS atravessa um momento difícil pela ação da Rússia na Ucrânia, mas foi significativo ter sido mantida a reunião ministerial para reafirmar os pilares do grupo e o interesse de seus membros em manter reuniões e contatos regulares para superar a atual conjuntura.
*Rubens Barbosa foi embaixador do Brasil em Londres, é diplomata, presidente do Instituto Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e coordenador editorial da Interesse Nacional.
A íntegra do comunicado pode ser encontrada no site do Itamaraty
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional