05 julho 2015

Emprego e Desemprego em 2015

Em cerca de dez anos, o mercado de trabalho do Brasil passou por grandes oscilações. Em 2004, o desemprego nas regiões metropolitanas chegou a 12%. Em 2013, havia caído para 4,3%. No final de 2014, a taxa voltou a subir para 4,8% e, nos primeiros meses de 2015, saltou para a casa dos 6%1.

Baixo desemprego com baixo crescimento

Em cerca de dez anos, o mercado de trabalho do Brasil passou por grandes oscilações. Em 2004, o desemprego nas regiões metropolitanas chegou a 12%. Em 2013, havia caído para 4,3%. No final de 2014, a taxa voltou a subir para 4,8% e, nos primeiros meses de 2015, saltou para a casa dos 6%1.

Durante vários anos, entre 2004 e 2013, o País viveu um clima no qual sobravam empregos e faltavam pessoas para trabalhar. O quadro chegou a intrigar os analistas porque, com exceção de 2010, quando o PIB cresceu 7,5%, as taxas de crescimento foram caindo sucessivamente, sem elevação do desemprego. Apesar da baixa taxa de crescimento do PIB, a remuneração média do trabalho subiu cerca de 4% ao ano e o salário mínimo, quase 5% no período considerado. Tais aumentos ficaram muito acima da evolução da produtividade anual do trabalho. Como explicar isso?
Entre 2003 e 2013, a economia brasileira se beneficiou dos bons ventos do mercado internacional e da melhoria dos termos de troca dos bens transacionados no exterior. Internamente, o governo manteve a todo vapor vários artificialismos que elevaram o poder de compra dos brasileiros. Os fortes aumentos do salário mínimo e dos valores das aposentadorias, associados à expansão do crédito e dos programas sociais e à redução de impostos sobre produtos selecionados, contribuíram para elevar a renda disponível das famílias a ponto de muitos jovens e idosos se sentirem seguros para adiar a entrada ou antecipar a saída do mercado de trabalho, fazendo diminuir a pressão da força de trabalho por novos empregos, o que redundou no rebaixamento da taxa de desemprego. Ou seja, a redução da procura por trabalho contribuiu fortemente para a redução do desemprego. Além disso, a própria redução da taxa de crescimento da população em idade ativa (15 a 60 anos), decorrente da queda da natalidade de décadas passadas, fez cair ainda mais a pressão por emprego.
Mas, como resultado do incentivo ao consumo, houve uma expansão de empregos nos setores do comércio e, em especial, dos serviços. A participação dos serviços no PIB passou de 63% para 70% entre 2004 e 2014. O emprego nesses dois setores contribuiu para a redução na taxa de desemprego e para a consequente elevação do salário real, que foi ajudada por fortes aumentos do salário mínimo.
Na época, o Brasil chegou a ser visto como uma economia capitalista estável e com grande potencial para crescer, pois vinha mantendo uma das mais baixas taxas de desemprego do mundo (em torno de 4,5%).
O quadro acima começou a ser revertido em 2013 com a queda dos preços das commodities exportadas. A forte baixa do preço do petróleo gerou um enorme desequilíbrio nas contas da Petrobras e colocou em dúvida o alardeado sucesso do pré-sal. Os problemas da economia brasileira começaram a ser percebidos pelas grandes massas que, em meados daquele ano, decidiram se manifestar nas praças públicas de todo o Brasil. O País viveu vários dias de instabilidade. Para atenuar a revolta e enfrentar as eleições de outubro de 2014, o governo manteve artificialmente os preços dos combustíveis, da energia elétrica, das tarifas do transporte urbano e inúmeras isenções tributárias.
A situação atual
No final de 2014 e inicio de 2015, o quadro virou, e o mercado de trabalho, que estava relativamente blindado, passou a sentir o peso dos desequilíbrios. Já em janeiro, o desemprego nas regiões metropolitanas saltou dos 4,3%, registrados em dezembro de 2014, para 5,3%. Em março, passou para 6,2% e, em abril, para 6,4%. Ficou claro que os desequilíbrios provocados pelas políticas equivocadas do governo federal estavam chegando ao mercado de trabalho. O desemprego em todo o País, medido pela Pnad Contínua2, chegou a 7,9%. Entre os jovens, atingiu 18% entre os que tinham de 18 a 24 anos.
Hoje em dia, o Brasil possui cerca de 8 milhões de pessoas desempregadas. Trata-se de um número muito alto quando se considera o desempenho recente do mercado de trabalho e os gastos que isso provoca nas contas públicas, em especial, no Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), de cerca de R$ 40 bilhões anuais, para atender às necessidades do seguro-desemprego. O número é grave também quando se considera que o trabalho desprotegido do mercado informal ainda atinge cerca de 40 milhões de brasileiros.
Os dados de emprego do primeiro semestre de 2015 indicam uma forte retração da oferta de postos de trabalho. Nos primeiros quatro meses do ano, foram fechados cerca de 140 mil empregos formais. Para o período, esse foi o pior resultado da série histórica que teve início em 2002. Só em abril, foram exterminados quase 100 mil empregos formais. Nos 12 meses terminados em março de 2015, a economia brasileira destruiu cerca de 500 mil empregos, lembrando que, em 2010, quando o PIB cresceu 7,5%, foram gerados 2,5 milhões de novos postos de trabalho. Em suma, o quadro atual se mostra como o reverso do vivido no passado recente.
O artificialismo econômico mantido para fins eleitorais se mostrou desastroso para a economia e para as finanças públicas. Os desequilíbrios instalados na economia do País criaram a necessidade imperiosa de um ajuste fiscal que, já no final de 2014, começou a apresentar os naturais efeitos secundários na disposição de investir e na geração de empregos no curto prazo.
Os investidores se desencantaram com o fato de o ajuste fiscal envolver fortes aumentos de preços públicos, elevação de impostos e cortes de investimentos públicos que são importantes para a geração de empregos e renda para a população. Os consumidores ficaram apreensivos e cautelosos com a disparada da inflação – que ultrapassou a casa dos 8% ao ano logo no início de 2015 – e também com os primeiros sinais de um desemprego que ameaça se alastrar. Isso provocou uma forte redução de compras, o que se refletiu no aumento de estoques dos produtores e, consequentemente, na diminuição da produção e do emprego. Esse foi o quadro que dominou o primeiro semestre de 2015.
Agravantes  setoriais
A explosão da crise da Petrobras agravou o clima de pessimismo dos investidores e dos consumidores. Muitos fornecedores daquela importante empresa ficaram sem receber, o que os levou a dispensar grandes levas de empregados. Segundo estimativas do próprio governo, a crise da Petrobras afeta cerca de 51 mil empresas que, só no primeiro semestre, demitiram cerca de 50 mil trabalhadores.
A redução do crédito, o aumento dos juros e a retirada dos subsídios dos tributos incidentes em bens duráveis (introduzidos depois da crise mundial de 2008-09), associados à queda da renda real das famílias, afugentaram os compradores de imóveis, automóveis, eletrodomésticos e outros bens de valor mais alto. Como consequência, começaram as dispensas de empregados nos setores de construção civil, veículos e bens duráveis da chamada linha branca e outros. Tratam-se de cadeias produtivas de grande extensão e que, por isso, têm muitos desdobramentos no campo do emprego.
Os analistas vêm estimando uma redução do PIB brasileiro ao redor de 1% até o final de 2015, com perspectivas de se ultrapassar esse número. Com isso, o Brasil ficará distante da maioria dos países emergentes e muito próximo das nações mais problemáticas, como Venezuela e Argentina.
No campo do emprego, a recessão anunciada apresenta variações importantes para os diversos setores da economia. Na construção civil, as estimativas chegam a uma redução de 5,5% do PIB do setor. Os efeitos no emprego já começaram a surgir. Nos 12 meses terminados em abril de 2015, as empresas do setor fecharam cerca de 250 mil postos de trabalho. Com o mercado imobiliário praticamente parado, as dispensas poderão subir para um patamar bem mais alto até o fim de 2015, o que é preocupante, pois esse é um setor importante para o recrutamento de mão de obra menos qualificada e que tem limitações para se reciclar e para trabalhar em outros setores da economia.
A queda nas vendas e na produção de insumos básicos como, por exemplo, aço, cimento e embalagens, passou a preocupar ainda mais os analistas do mercado de trabalho devido aos seus reflexos. Aço, cimento e embalagens são indicadores indiretos importantes da capacidade de geração de emprego na economia brasileira. Nos primeiros seis meses de 2015, as vendas nesses setores tiveram forte desaceleração e até caíram como resultado da deterioração dos negócios no setor automotivo, de eletrodomésticos e de construção civil e pesada.
O setor automotivo, que lidera uma grande cadeia produtiva, passou a franco desempregador já no final de 2014 e assim prosseguiu em 2015. No primeiro semestre, a produção de veículos encolheu mais de 20% em relação a igual período de 2014. Depois de conceder férias coletivas e colocar os empregados excedentes em lay off, Planos de Demissão Voluntária (PDV) e licença remunerada, estima-se que as montadoras tenham dispensado mais de 20 mil empregados. A continuar nesse ritmo, o setor fechará o ano com cerca de 30 mil ou 40 mil postos de trabalho a menos, sendo seguido pelas empresas de autopeças, que poderão despedir igual número de empregados e até mais. Na cadeia produtiva, o desemprego se alastrou para as concessionárias de veículos e para os serviços que gravitam em torno das montadoras.
A indústria de transformação completou três anos e meio em março de 2015, nos quais só houve demissões de empregados. Os setores de vestuário, têxtil, calçados e couro vêm demitindo há quase cinco anos. Os dados da Fiesp para São Paulo mostram que 20 dos 22 setores analisados no primeiro semestre de 2015 tiveram redução ou estabilidade de empregos. Apenas os setores farmacêutico e farmacoquímico apresentaram aumento de contratações.
A perda de fôlego dos serviços é o dado que mais preocupa os analistas do mercado de trabalho, porque esse é o setor que tem respondido pela criação da maior parte dos novos empregos no Brasil. O setor de serviços continua sendo o maior empregador, mas com força decrescente, especialmente nos serviços profissionais, administrativos e os prestados às pessoas e às famílias. A queda do PIB do setor no primeiro trimestre de 2015 foi de 0,5%, maior até mesmo do que a retração do setor industrial, que caiu 0,3%. Em abril de 2015, o setor de serviços, em lugar de criar, fechou cerca de 7.500 empregos. Não há dúvida de que o crescimento do emprego no setor de serviços passou a ser bem mais lento do que nos anos anteriores.
O comércio, outro setor empregador, vem apresentando sinais preocupantes. Ao longo do primeiro semestre de 2015, as vendas ficaram praticamente estáveis em relação ao primeiro semestre de 2014, o que é raro, em vista do crescimento da população e da renda das pessoas. Isso atingiu até mesmo os alimentos básicos. Nos supermercados ainda não se registraram quedas fortes de emprego, mas, como reflexo da queda de vendas, a indústria de alimentos reduziu o ritmo de produção e começou a demitir.
Embora não seja (ainda) uma tendência, os sinais de queda na geração de empregos nas pequenas e microempresas também preocupam bastante. Pela primeira vez, desde que começaram a ser coletados os dados nesse campo (2009), o levantamento do Sebrae indicou que, em abril de 2015, as pequenas e microempresas fecharam mais de mil empregos, enquanto no mesmo mês em 2014 foram criados quase 100 mil postos de trabalho e, em 2013, 140 mil. As pequenas e microempresas do setor industrial eliminaram 17.400 postos de trabalho naquele mês, o que só foi compensado pela geração de 27.700 empregos nos setor de serviços.
Reflexos nos salários
Com a perda de fôlego do mercado de trabalho para gerar mais empregos, os salários de 2015 passaram a ser reajustados de forma mais moderada e abaixo do que vinha sendo praticado nos “anos de ouro” do mercado de trabalho, em especial, entre 2010 e 2013. Já no primeiro trimestre, os salários dos trabalhadores admitidos foram 13% inferiores aos salários dos trabalhadores demitidos, em franco contraste com os dados do passado recente (2012), quando a diferença era de apenas 5%. Outro dado que preocupa é o fato de 80% das contratações de 2015 terem sido de substituição de empregados existentes, e não de criação de novas oportunidades de trabalho.
Tudo isso põe em risco as conquistas sociais e a redução das desigualdades registradas ao longo dos últimos anos. O quadro realmente virou. O atual crescimento da oferta de emprego não está atendendo às necessidades da população. Esta fica desempregada ou se move para trabalhos precários no mercado informal que, como se sabe, oferece uma reduzida proteção aos trabalhadores e transfere um alto dispêndio para os programas de assistência social.
Aos primeiros sinais de desemprego e da redução do salário real, uma parte dos que haviam optado por não trabalhar nos anos de 2010 a 2014, passou a procurar emprego sem sucesso em 2015. Os dados da Pnad Contínua mostraram que apenas nos dois primeiros meses do ano houve um aumento de 1,6% entre as pessoas que passaram a procurar empregos, o que significa cerca de 1,6 milhão de novos pretendentes. Só nesses meses, isso representou um acréscimo de 800 mil pessoas entre os desempregados.
Emprego e investimentos
O esfriamento da oferta de empregos decorre em grande parte do esfriamento dos investimentos públicos e privados. Com a queda da arrecadação de tributos federais, está havendo uma forte redução das transferências do governo central para os governos estaduais. Os próprios repasses do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) vêm sendo reduzidos, o que compromete inúmeras obras que vinham sendo realizadas nos estados e municípios, afetando severamente a oferta de emprego e provocando desemprego.
A própria receita de ICMS e ISS vem sendo reduzida com o avanço da crise atual que impõe severas restrições nos investimentos públicos e reflexos no campo do emprego. Só em São Paulo, os investimentos do governo do estado recuaram 37% nos primeiros quatro meses de 2015.
O governo federal acena com uma injeção extra nos investimentos em infraestrutura – o que seria estratégico para reanimar o emprego da construção civil e pesada e dos serviços delas decorrentes. Mas, até o momento (01/06/2015), nada ocorreu.
Também regionalmente, o quadro do mercado de trabalho mudou. O Nordeste, que apresentou uma melhoria sensível na oferta de empregos até o final de 2013, já no início de 2015, mostrou uma taxa de desemprego de quase 10% – bem acima da média da Pnad Contínua que, como vimos, ficou em 7,9%. Com o atraso das obras do PAC e o cancelamento de contratos na área do petróleo, os estados do Nordeste têm pela frente dias muito difíceis no campo do emprego.
Emprego e produtividade
Sem a integração nas cadeias globais de produção, o Brasil passou a ser marginalizado no cenário das nações emergentes. O forte aumento do custo do trabalho e da energia elétrica – além da precária infraestrutura – levaram o Brasil para o terreno da desindustrialização. Nos últimos 15 anos, as exportações brasileiras aumentaram 200%, enquanto as importações cresceram 300%, provocando um rombo na balança comercial, que só pôde ser compensado pelo bom desempenho do setor agropecuário, cujas exportações superaram em quase 400% as importações.
Como resultado, a indústria de transformação foi um dos setores mais desempregadores dos últimos tempos, com o agravante que, na sua maior parte, os trabalhadores dispensados são mais qualificados quando comparados à média da força de trabalho e, apesar disso, vêm encontrando grande dificuldade para se reempregarem com salários equivalentes aos que tinham antes de demitidos. Dá-se nesses casos um claro movimento de descida na escala social. O reverso do que o País assistiu nos últimos dez anos com a formação da nova classe média.
A baixa produtividade do fator trabalho é um dos principais entraves da baixa competitividade das empresas brasileiras. No Índice de Competitividade, divulgado pelo International Institute for Management Development (IMD), em maio de 2015, a baixa competitividade levou o Brasil para a 56ª posição entre os 61 países pesquisados por aquele organismo, ganhando apenas da Croácia, Argentina, Ucrânia e Venezuela.
A guinada em direção a mais produtividade, como fez a agropecuária, é essencial para melhorar a competitividade da economia brasileira e a sua capacidade de gerar empregos na quantidade e na qualidade necessárias. Infelizmente, o País está longe das medidas que devem ser tomadas nos campos da inovação, educação e infraestrutura para alavancar a produtividade do trabalho e a competitividade das empresas.
Perspectivas
Em suma, os primeiros dados de 2015, mostram que o Brasil passou do apagão de mão de obra para o apagão do emprego. E não há sinais de reversão. Ao contrário, considerando-se o fraco desempenho da economia como um todo, espera-se um aprofundamento ainda maior dos problemas no segundo semestre, o que leva os analistas a estimar as taxas de desemprego ao redor de 9% para o final do ano.
Na trajetória recente, o Brasil perdeu a oportunidade de bem utilizar o chamado bônus demográfico. Com o envelhecimento da população e a recessão que se instalou em 2015, o Brasil terá de enfrentar o desafio do aumento de pessoas mais velhas que passam a ser dependentes dos que trabalham. Ao mesmo tempo, será desafiado a aumentar de forma expressiva os investimentos nos campos da saúde e previdência social para atender aos idosos. E isso só tende a se agravar. Demografia é destino. A partir de 2020, a população produtiva diminuirá e a dependente aumentará, criando tempos ainda mais difíceis para o País. Bem melhor se o Brasil tivesse crescido de forma acelerada na década passada e na atual, quando a referida dependência era menor.
Além disso, é preciso considerar que, normalmente, a transformação de qualquer país de renda baixa em uma nação de renda média é difícil, mas o salto seguinte é ainda mais desafiador. Isso porque o crescimento inicial parte de uma base muita baixa. Pequenos resultados são conquistas expressivas. No Brasil, o crescimento foi feito basicamente pela incorporação de mais capital e mais trabalho no sistema produtivo. Hoje, os dois fatores se tornaram escassos, o que torna a travessia mais complexa. Será mais difícil diminuir as distâncias em relação aos países mais ricos. Em 1980, a renda per capita do Brasil (medida em poder de compra) equivalia a 38% da americana. Nos dias atuais, equivale a apenas 29%. Ou seja, os países de renda alta dispararam, enquanto o Brasil vem se arrastando.
O estímulo que poderia vir da expansão da economia internacional é bastante duvidoso. O crescimento na zona do euro é pífio. Na Ásia, há vários sinais de desaceleração, em especial na China. Os Estados Unidos são uma exceção, mas o Brasil tem poucas vantagens comparativas para exportar e tirar proveito do crescimento americano. Ainda somos exportadores de commodities, cujas demanda e preço caem a cada dia.
Com a forte redução do preço do petróleo, a crise da Petrobras terá um efeito deletério sobre o emprego em 2015. Qualquer oscilação na estatal afeta seriamente vários setores para frente e para trás na cadeia. O próprio clima de incerteza deve levar muitos fornecedores a diminuir o interesse para prover bens e serviços à Petrobras e a outras estatais problemáticas, como é o caso da Eletrobras.
O aumento de impostos e a elevação da taxa de juros, defendidos como necessários pelo governo atual, tenderão a conspirar contra os novos investimentos e forças para gerar mais empregos ao longo de 2015 e 2016.
Tudo isso sugere um agravamento do quadro do emprego. Aliás, para os responsáveis pelo reequilíbrio da economia brasileira, isso é inevitável e necessário. Mais especificamente, eles contam com uma elevação do desemprego suficientemente forte para se chegar a uma redução expressiva do salário real e, com isso, combater a inflação.
Até o momento (01/06/2015), continuamos longe dessa combinação. Ao longo do primeiro semestre de 2015, a redução do emprego foi maior do que a dos salários. Ao considerar os 12 meses encerrados em março de 2015, o emprego foi reduzido em 3,9%, enquanto o salário médio real subiu 1,1%, e a produtividade caiu 1,5%. Isso fez subir ainda mais o custo unitário do trabalho, o que rebate fortemente na inflação. Pela lógica escolhida, enquanto o custo unitário do trabalho não cair, o ajuste fiscal não terá o êxito esperado.
A expectativa dos operadores do ajuste fiscal é que, no segundo semestre de 2015, o País venha a ser “beneficiado” por uma forte queda no salário real o que, por sua vez, dependerá do aprofundamento do desemprego. É uma lógica perversa, mas inescapável em face dos desequilíbrios acumulados pelo modelo econômico que privilegiou artificialmente o consumo e descuidou da produção – com exceção da agropecuária.
Até o encerramento deste ensaio (01/06/15), não havia sinais de reversão do quadro de emprego e desemprego. Ao contrário, a necessidade de reequilibrar as contas públicas levou o governo federal a promover um corte adicional no orçamento aprovado para 2015, o que reduzirá o investimento público e a geração de empregos dos inúmeros setores abrangidos pelo corte, inclusive, os da área social – educação, saúde, previdência social e outros. Em seguida, virá o fim da desoneração da folha de salários, que pode induzir um aumento das demissões nos setores intensivos em mão de obra.
Na trajetória recessiva provocada pela necessidade de sanear a economia brasileira dos artificialismos introduzidos nos últimos dez anos, os grupos de baixo rendimento serão os mais atingidos. Eles, que até aqui desfrutaram ganhos de salário real e aposentadorias aumentadas, sofrerão o efeito da alta do desemprego e da perda de renda. No agregado, os analistas esperam para 2015 uma redução de 2% a 3% da renda disponível das famílias – a que desconta o peso dos itens essenciais no orçamento doméstico, como transporte e alimentação. É isso o que deverá empurrar de volta ao mercado de trabalho os jovens que haviam desistido de trabalhar para se dedicar aos estudos, elevando a taxa de desemprego e comprometendo a já frágil formação de capital humano no Brasil.
Disso tudo decorrerá uma piora na desigualdade social que, nos anos passados, foi reduzida por força da expansão dos empregos formais e da elevação da renda geral e do salário mínimo.
As demissões e a queda de renda dos dias atuais são o efeito mais doloroso dos erros praticados pelo governo nos últimos dez anos – favores fiscais e protecionismo a grupos privilegiados, intervenção em preços estratégicos (energia e outros), incentivos dirigidos mais ao consumo do que à produção, tolerância à inflação, leniência com a corrupção e desestímulo à melhoria da produtividade.
O que pode ser feito para atenuar os efeitos perversos do ajuste fiscal? No curto prazo, o programa de proteção ao emprego à moda do Kurzarbeit da Alemanha, ora em discussão, pode atenuar as demissões e ajudar a manter uma parte da renda das famílias e do consumo. Por esse programa, as empresas em dificuldade, em lugar de demitir empregados reduzem a jornada de trabalho e os salários e, em contrapartida, o governo paga uma parte dos salários suspensos pelas empresas – em lugar de bancar os altos custos do seguro-desemprego.
No médio prazo, a esperada redução da inflação deverá oferecer um horizonte mais seguro para os investidores voltarem a criar empregos. Mas, o investimento só voltará depois de comprovado o sucesso das medidas introduzidas pelo ajuste fiscal em curso, o que deve ocorrer, na melhor das hipóteses, no início de 2017.
No longo prazo, o Brasil ganhará muito se abandonar em definitivo a prática do populismo econômico para garantir as vitórias eleitorais. O desenvolvimento sustentado do País depende de medidas sérias nos campos de produção, educação e inovação e, sobretudo, no terreno da ética do trabalho, valorizando entre os jovens a noção de mérito e eficiência.


1 Dados coletados pela Pesquisa Mensal de Emprego realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para as regiões metropolitanas de Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. 2 A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua cobre cerca de 3.500 municípios e é realizada trimestralmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).


Foi professor da Faculdade de Economia e Administração e da Fundação Instituto de Administração, ambas da Universidade de São Paulo. É membro da Academia Paulista de Letras

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