03 setembro 2025

A persistência da indefinição das tarifas alfandegárias

Guerra comercial iniciada pelo presidente dos Estados Unidos deixa uma série de indefinições para o comércio internacional

Itajaí (SC), 29/05/2025 – Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a cerimônia de retomada das operações do Porto de Itajaí. Foto: Ricardo Stuckert/PR

O comércio internacional continua sob a influência das medidas tarifárias e de cunho político adotadas pelo governo americano.

Os Estados Unidos negociaram com a União Europeia e o Japão uma redução na aplicação das tarifas iniciais impostas e deixaram para uma fase posterior os membros dos Brics: China, Índia e Brasil, sendo a Rússia sujeita a outros tipos de restrição comercial. Além disso, Canadá e  México por força  do elevado comércio e membros de um Acordo de Livre Comércio terão uma negociação específica.

Esperava-se  com ansiedade as definições  que poderiam advir da reunião entre os presidentes Trump e Putin realizada no Alasca, onde o gesto do convite americano poderia ser interpretado com o início das eliminações das barreiras ao comércio internacional da Rússia.

‘O embargo aplicado pelos Estados Unidos e acompanhado pela União Europeia contra a Rússia não parece ter atingido plenamente a capacidade de produção do país’

O embargo aplicado pelos Estados Unidos e acompanhado pela União Europeia contra a Rússia não parece ter atingido plenamente a capacidade de produção do país, pois o comércio de petróleo, fertilizante e produtos químicos continuou em especial com a China e Índia, além dos países limítrofes ex-Estados membros da União Soviética.

Os efeitos da aplicação das tarifas elevadas por parte dos Estados Unidos contra o Brasil, a China e a Índia têm efeitos de ordem diferenciada sobre cada país, em função de sua magnitude política e econômica e pauta exportadora aos Estados Unidos.

No caso do Brasil, inicialmente foram abrandadas as aplicações do aumento tarifário para produtos de interesse dos setores privados americanos. Primeiro na lista foi o suco de laranja, onde o Brasil é o maior exportador, com cerca de 35% do mercado americano, e logo em seguida as companhias de aviação americanas, que expuseram ao governo americano a participação dos aviões Embraer com elevada utilização nos voos regionais americanos.

‘O café brasileiro tem uma presença como maior exportador para os Estados Unidos, e a perda deste mercado exige diversificação de novos mercados’

O café brasileiro tem uma presença como maior exportador para os Estados Unidos, e a perda deste mercado exige diversificação de novos mercados. O  governo chinês iniciou uma cooperação com os exportadores brasileiros facilitando o credenciamento junto aos importadores locais. Pode representar um objetivo futuro de elevada importância.

A exportação brasileira de máquinas e equipamentos e de componentes em aço e alumínio   aos Estados Unidos realiza-se em grande escala através do chamado mercado “inter company”, e a solução da continuidade das exportações somente será viável com a redução da tarifa para o mesmo valor dos produtores internacionais destes produtos.

‘Os casos mais difíceis de solução são as frutas e pescados produzidos no Nordeste do Brasil’

Os casos mais difíceis de solução são as frutas e pescados produzidos no Nordeste do Brasil, que tinham uma elevada concentração exportadora para os Estados Unidos e, com a elevação da tarifa, essas operações se inviabilizaram, enquanto a diversificação para novos mercados demandará tempo.

O caso da Índia, com a  aplicação de aumento tarifário igual ao do Brasil, o efeito será grave para os exportadores de medicamentos, produtos químicos e sobretudo na área de serviços, muito concentrados na área de informática.

A Índia mantém fortes laços políticos e comerciais com a Rússia, absorvendo nesta fase de embargo as exportações russas de petróleo, fertilizantes e  produtos químicos, e continuará e aumentará suas exportações para a Rússia em caso da manutenção tarifária pelos Estados Unidos.

‘No caso da China, o aspecto político referente à disputa pela hegemonia mundial é marcante’

No caso da China a situação envolve o aspecto econômico tarifário, mas o aspecto político referente à disputa pela hegemonia mundial é marcante.

A China goza de uma situação razoavelmente especial pois tem condições de encarar a escalada tarifária americana, na medida em que é uma grande exportadora de produtos com valor industrial agregado importante, variando desde pequenos eletrodomésticos a grandes guindastes portuários.

A atuação comercial da China varia desde grandes mercados como os Estados Unidos, a União Europeia, a Índia, bem como as economias médias, como Brasil, México e sobretudo com os países do Sudeste Asiático, em especial Vietnã, Malásia, Tailândia onde realizou  grandes investimentos produtivos, complementares com à produção chinesa. 

‘Os dois países mais afetados pelo efeito tarifário americano, México e Canadá por aspectos de dividirem grandes fronteiras com os Estados Unidos’

Por fim, os dois países mais afetados pelo efeito tarifário americano, México e Canadá por aspectos de dividirem grandes fronteiras com os Estados Unidos e manterem entre si um Acordo de Livre Comércio o que exigirá uma negociação específica.

Por esta  razão os Estados Unidos suspenderam a aplicação das novas tarifas em um prazo maior, para permitir uma negociação, seguramente para levar em conta as implicações sobre a produção industrial americana e a interligação de dependência no setor agrícola.

México e Canadá exportam e importam dos Estados Unidos cerca de US$ 500 bilhões por ano, o que significa um comércio geral de cerca de US$ 2 trilhões por ano, o que influi seguramente sobre a economia americana. 

O antigo acordo Nafta, depois alterado no primeiro governo Trump, somado ao já existente na época, o Programa Pitex  de “ maquiladoras mexicanas” originou a implantação de empresas americanas com o objetivo de produção compartilhada e alimentação do mercado americano, o que torna difícil sua desmontagem e substituição por um novo modelo.

O Canadá especializou-se em sua vocação exportadora para os Estados Unidos nos campos da indústria química e fertilizantes, no campo automobilístico e na área de serviços e da mesma forma é difícil alterar-se tal decisão produtora .

Em ambos os casos é visível que uma solução negociada é o caminho mais ajustado para a solução do problema.

Mario Mugnaini Jr. é colunista da Interesse Nacional, engenheiro industrial químico e empresário, foi vice-presidente da Fiesp/Ciesp entre 1998 e 2002, secretário executivo da Câmara de Comércio Exterior Camex MDIC entre 2003 e 2007 e presidente da Investe SP, Agência Paulista de Investimentos e Competitividade de 2009 a 2011.

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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