06 outubro 2025

As relações Brasil-EUA na era Trump

O artigo ‘Relações Brasil-EUA na Era Trump’ foi publicado na edição de outubro de 2025 da revista Interesse Nacional na versão impressa antes dos discursos dos presidentes Lula e Trump na Assembleia Geral da ONU em 23 de setembro de 2025. Este texto aprofunda a análise original com base nas falas dos presidentes na ONU

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a abertura do Debate Geral da 80.ª Sessão Ordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas (Foto: Ricardo Stuckert / PR)

Como corretor de imóveis em Nova York, Donald Trump era conhecido por ser “binário”, com um botão liga/desliga. Se ele achasse que seu cliente queria aceitar o negócio que estava oferecendo, ele seria charmoso, efusivo e sociável. Por outro lado, se achasse que o cliente não queria comprar dele, ele seria hostil e abusivo. 

Leia o artigo original – Relações Brasil-EUA na era Trump

Trump mantém essa abordagem binária durante seu mandato como presidente dos EUA, empregando o mesmo botão liga/desliga ao interagir com outros líderes mundiais.

E os líderes mundiais que se envolvem com Trump têm uma escolha binária sobre como lidar com ele. 

Uma abordagem é ser conciliador e bajulador. Este é o método do primeiro-ministro britânico Keir Starmer, bem como o de Mark Rutte, ex-primeiro-ministro dos Países Baixos e atual secretário-geral da OTAN. 

Outro caminho é resistir, reagir e defender princípios antitéticos aos de Trump. Esta tem sido a tática do primeiro-ministro canadense, Mark Carney. É também a abordagem do presidente Lula, do Brasil.

  ‘Não está claro que ser bajulador com Trump sempre traga melhores resultados do que resistir’

Não está claro que ser bajulador com Trump sempre traga melhores resultados do que resistir. Trump é instável, e seus acordos geralmente não valem o papel em que não estão escritos.

 O discurso de Lula na ONU em 23 de setembro de 2025 foi significativo porque, nele, Lula deixou claro que enfrentaria Trump. Ele defendeu a soberania brasileira e a autonomia do Supremo Tribunal Federal (STF), que havia condenado o ex-presidente Jair Bolsonaro a mais de 27 anos de prisão em 11 de setembro de 2025 por vários crimes associados à tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023, além de condenar seus co-conspiradores. Ele criticou as tarifas americanas e defendeu o multilateralismo e um sistema de comércio baseado em regras, contra a ordem global arbitrária e baseada em acordos de Trump. E defendeu a necessidade de enfrentar as mudanças climáticas.

O discurso de Trump imediatamente após o de Lula na ONU foi – talvez – uma demonstração de que resistir a Trump pode ser, em certas circunstâncias, uma estratégia mais produtiva do que tentar acomodá-lo. Apesar das diferenças óbvias entre Trump e Lula, Trump disse que gostava de Lula e sentia que havia química entre eles. Ele também anunciou que se encontrariam na semana seguinte.

‘A postura de Lula lhe renderá aliados e admiradores em todo o mundo’

A postura de Lula lhe renderá aliados e admiradores em todo o mundo. Trump é um líder impopular. Uma pesquisa divulgada em 28 de setembro sugeriu que, em seu próprio país, os EUA, 40% o aprovam, enquanto 55% o desaprovam (YouGov, conforme relatado pela The Economist). 

Globalmente, sua popularidade é menor. De acordo com uma pesquisa do Pew Research Center com adultos em 24 países, divulgada em junho de 2025, uma média de 62% têm pouca ou nenhuma confiança em Trump. Em cada país, esses números são muito maiores: 91% no México, 85% na Suécia, 81% na Alemanha, 80% na Espanha e Turquia, 77% no Canadá, 62% na Indonésia e 61% no Brasil. Essas pesquisas são instantâneos, não filmes, mas são sugestivas.

‘O discurso de Lula na ONU o posiciona como a antítese de Trump – e uma antítese potencialmente popular de Trump – no cenário mundial’

O discurso de Lula na ONU o posiciona como a antítese de Trump – e uma antítese potencialmente popular de Trump – no cenário mundial. Esse papel pode ser reforçado pela realização da COP 30 pelo Brasil em Belém, de 10 a 21 de novembro. 

Surpreendentemente, porém, os discursos paralelos de Lula e Trump na ONU podem sinalizar o abrandamento da crise entre o Brasil e os EUA no âmbito presidencial, em vez da sua intensificação. Teremos que aguardar até que a conversa entre os dois líderes se concretize. 

De qualquer forma, a manutenção e o fortalecimento de alianças entre as sociedades civis de ambos os países, bem como entre membros do judiciário, os respectivos congressos e os governos estaduais e locais, continuam sendo indispensáveis para o futuro do relacionamento entre as duas maiores democracias do Hemisfério Ocidental.


Anthony Pereira é diretor do Roger Thayer Stone Center for Latin American Studies, professor de Ciência Política na Tulane University e professor visitante na School of Global Affairs do King’s College London

Stanley A. Gacek é advogado trabalhista internacional e membro do Council on Foreign Relations, do Conselho Consultivo do Instituto Brasil e do Woodrow Wilson Center. Foi diretor da missão da Organização Internacional do Trabalho no Brasil de 2011 a 2016

É diretor do Roger Thayer Stone Center for Latin American Studies, professor de Ciência Política na Tulane University e professor visitante na School of Global Affairs do King's College London

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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