Editorial: Em busca de uma seleção de futebol realmente brasileira
A discussão sobre se o técnico da seleção deveria ser brasileiro ou estrangeiro mostra a falta de foco usual em todas as áreas de nossa sociedade, desde a política, até o futebol, quando estão em jogo decisões importantes com implicações de médio e longo prazo. Deveríamos aproveitar o momento e selecionar os jogadores de grande qualidade que são esquecidos por aqui de modo a podermos projetar uma nova geração internacionalmente
A discussão sobre se o técnico da seleção deveria ser brasileiro ou estrangeiro mostra a falta de foco usual em todas as áreas de nossa sociedade, desde a política, até o futebol, quando estão em jogo decisões importantes com implicações de médio e longo prazo. Deveríamos aproveitar o momento e selecionar os jogadores de grande qualidade que são esquecidos por aqui de modo a podermos projetar uma nova geração internacionalmente
Por Rubens Barbosa*
A mobilização nacional, com milhões de pessoas nas ruas, como vimos na Argentina, dificilmente teria ocorrido no Brasil, caso tivéssemos ganho a Copa do Mundo do Catar.
Hoje há pouca vibração em torno dos jogos da seleção, como ocorria no passado. O distanciamento da seleção de grande parte da torcida deixou pouca emoção e repercussão, mesmo com a eliminação. O Brasil está longe de ser aquela pátria de chuteira, como dizia Nelson Rodrigues. A quase totalidade dos convocados joga no exterior e pouco contato tem com a torcida. O Brasil se tornou o maior exportador de jogadores de futebol do mundo. Alguns, ainda antes da maioridade são vendidos e começam a atuar no exterior, sem nenhum contato com os clubes daqui. A seleção virou uma verdadeira legião estrangeira.
Com a decisão de convocar grandes estrelas que jogam no exterior, a seleção perdeu seu estilo de jogo e se transformou em um time comum, defensivo e burocrático. Os jogadores perderam a característica de improvisação brasileira. Resultado: a seleção joga sem estilo e sem exibição de talento, uma das características dos antigos craques nacionais. Deu pena ver a atuação em todos os jogos na Copa do Catar com muita dancinha e pouca garra. Os jogadores que atuam no exterior têm salários altíssimos e hoje estão entre os poucos milionários brasileiros. Pensam mais em seus interesses financeiros e comerciais do que nos resultados dos jogos. Com menos incentivos para se empenhar pela pátria que veem de longe e para onde só retornam depois que seus clubes no exterior passam a achar que não valem o quanto pagam.
Apesar de reconhecer a dificuldade de ser implementada, seria muito oportuna a discussão de uma política radical: a partir da disputa da classificação para a Copa de 2026, a convocação deveria limitar-se apenas a jogadores que atuam nos times brasileiros. A seleção nacional deveria ser composta por jogadores de times nacionais para trazer de volta a paixão, a fé e a adesão dos torcedores, que se envolveriam e apoiariam os jogadores de seus times que se destacaram nos campeonatos regionais e nacional e foram chamados para atuar na seleção brasileira. Todos saberiam os nomes dos que integrariam o time nacional, e o desinteresse e distanciamento entre torcedores e jogadores rapidamente seriam substituídos pela emoção e pela paixão.
Deveríamos aproveitar o momento e selecionar os jogadores de grande qualidade que são esquecidos por aqui de modo a podermos projetar uma nova geração internacionalmente. Depois, valorizados pelos resultados alcançados, se quiserem poderiam ser contratados para atuar no exterior. Clubes e jogadores ganhariam.
A discussão sobre se o técnico da seleção deveria ser brasileiro ou estrangeiro mostra a falta de foco usual em todas as áreas de nossa sociedade, desde a política, até o futebol, quando estão em jogo decisões importantes com implicações de médio e longo prazo.
Prestigiar a prata da casa para, com garra, voltar a exibir a força do futebol brasileiro e conquistar o hexa, deveria ser a politica de convocação para a seleção nos próximos anos.
*Rubens Barbosa foi embaixador do Brasil em Londres, é diplomata, presidente do Instituto Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e coordenador editorial da Interesse Nacional.
Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional