10 março 2023

Rubens Barbosa: Os riscos do imposto de exportação

Criação de tributo pode trazer consequências negativas e representa uma quebra de compromissos, aumentando a já séria instabilidade regulatória e a insegurança jurídica para quem quer abrir ou ampliar seus negócios no Brasil. Para embaixador, não foi uma boa ideia no momento em que a economia nacional necessita medidas que melhorem a competitividade dos produtos […]

Criação de tributo pode trazer consequências negativas e representa uma quebra de compromissos, aumentando a já séria instabilidade regulatória e a insegurança jurídica para quem quer abrir ou ampliar seus negócios no Brasil. Para embaixador, não foi uma boa ideia no momento em que a economia nacional necessita medidas que melhorem a competitividade dos produtos de exportação

Os ministros das Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da Fazenda, Fernando Haddad, durante coletiva sobre reoneração de combustíveis

Por Rubens Barbosa*

O governo Lula decidiu criar o imposto de exportação por um período de quatro meses. Por medida provisória, que reduziu alíquotas de contribuições sobre operações realizadas com gasolina, álcool, gás natural e querosene de avião, foi também criado imposto de exportação de 9,2%. A justificativa dada foi a necessidade de aumentar a arrecadação e atenuar os impactos sobre a inflação pelo aumento do preço da gasolina na bomba. Mas também de que o lucro da Petrobras está muito alto. “As empresas estão com lucros extraordinários por causa do aumento dos preços do petróleo. Lucros exorbitantes”, disseram as autoridades fazendárias.

A criação desse imposto poderá trazer consequências muito negativas para a economia como um todo. Além de representar uma quebra de compromissos contratuais relacionados com os leilões para concessão de blocos petrolíferos, nos quais não se previa a taxação de exportação, a medida vai afetar a disposição de investimentos na pesquisa, exploração e produção de petróleo. Essa intervenção estatal aumenta a já séria instabilidade regulatória e a insegurança jurídica para quem quer abrir ou ampliar seus negócios no Brasil. A possibilidade de a medida estimular o refino nacional não é certa e está sendo contestada pelo setor.

‘A história econômica brasileira mostra que, nas primeiras décadas do Brasil independente, a tributação sobre as exportações teve um efeito fortemente negativo’

A medida não é nova, mas se trata de um precedente recente. Advogada sem sucesso por economistas desenvolvimentistas nos últimos anos, a história econômica brasileira mostra que, nas primeiras décadas do Brasil independente, a tributação sobre as exportações de algodão para gerar recursos para o governo central teve um efeito fortemente negativo e o Brasil, então líder na produção e exportação do produto, a partir de 1830, perdeu o mercado para a produção do sul dos EUA. Hoje, pelas incertezas da economia global e do cenário geopolítico instável, existe restrição da oferta de petróleo, e o Brasil se encontra em posição positiva para exportar pelo aumento da produção e estabilidade da demanda interna. A taxação vai contribuir para a perda da competitividade do petróleo brasileiro, afetando um setor que gera cerca de R$ 170 bilhões para o Estado.

Na América do Sul, o exemplo mais recente da imposição de imposto de exportação é o da Argentina com a reintegra. As retenciones a las exportaciones ou DEX (derechos a la exportacion) na Argentina são instrumentos tributários que incidem sobre produtos agrícolas exportáveis. Aplicados pela primeira vez, no final do século XIX, as “retenciones” têm sido utilizadas de tempos em tempos como uma das formas de aumentar os recursos do governo de Buenos Aires em crise financeira e com problemas cambiais em virtude das baixas reservas. 

https://interessenacional.com.br/edicoes-posts/a-guerra-comercial-e-as-relacoes-economicas-sino-brasileiras-no-setor-do-petroleo-possiveis-impactos/

Mais recentemente, em 2007, com Cristina Kirchner como presidente, foi introduzido um sistema de retenciones móveis à exportação. Como consequência, houve forte reação empresarial e uma greve patronal no setor agropecuário que se estendeu por 129 dias e incluiu o bloqueio de estradas e o desabastecimento nas cidades. Em março de 2022, o governo argentino oficializou o aumento das retenções para óleo e farelo de soja para 33%, mesma porcentagem cobrada para a exportação de soja em grãos. 

‘A experiência argentina mostra que, uma vez introduzida a cobrança do imposto de importação, é difícil eliminá-lo’

A experiência argentina mostra que, uma vez introduzida a cobrança do imposto de importação, é difícil eliminá-lo. Ao contrário, tende a ser estendido para outros setores da exportação e de ser mantido sem prazo para terminar.

No Brasil, o risco é o prolongamento do imposto de exportação depois dos quatro meses e a sua ampliação da área da energia para os produtos de exportação do agro, em função de seus altos lucros, como dito no caso do petróleo. 

Levando em conta a oposição do agronegócio ao atual governo, do ponto de vista político, não pode ser descartada uma reação à moda Argentina com o impacto sobre as exportações. Caso isso ocorra, o efeito será muito negativo e poderá agravar a crise fiscal, visto que o setor produtivo no agro gera hoje importante receita para as contas públicas em vista do grande superávit na balança de comércio gerado pelo agro.

Como era de se esperar, a questão do novo imposto de exportação foi judicializada. Nesta semana, cinco grandes empresas petroleiras (Shell Brasil, Equinor, Petrogal, Repsol Sinop e Total Energies) deram entrada em pedido de liminar contra a tributação na Justiça Federal. Em paralelo, no Congresso Nacional, partidos estão se movimentando para tentar derrubar a medida legislativa que criou o imposto, além de formularem pedido de inconstitucionalidade junto ao STF.

Decididamente, não foi uma boa ideia a criação desse imposto, no momento em que a economia nacional necessita medidas que melhorem a competitividade dos produtos de exportação.


*Rubens Barbosa foi embaixador do Brasil em Londres, é diplomata, presidente do Instituto Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e coordenador editorial da Interesse Nacional.

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Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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