31 maio 2022

Violência policial leva imagem do país na mídia estrangeira a sua pior marca no iii-Brasil

Ação com mais de 20 mortos no Rio e assassinato de Genivaldo chamaram a atenção da imprensa internacional e fizeram com que o tom da cobertura fosse predominantemente negativo, com danos para a reputação do país no exterior

Ação com mais de 20 mortos no Rio e assassinato de Genivaldo chamaram a atenção da imprensa internacional e fizeram com que o tom da cobertura fosse predominantemente negativo, com danos para a reputação do país no exterior

Por Daniel Buarque e Fabiana Mariutti*

iii-Brasil – 23 a 29 de maio de 2022

Visibilidade: 61 textos

Classificação das notícias:

34,5% Neutras

54% Negativas

11,5% Positivas

“Os policiais vieram para matar”, diz o título de uma reportagem publicada pelo jornal francês Le Monde sobre a recente ação que deixou mais de 20 mortos em uma favela no Rio de Janeiro. A frase ajuda a resumir a péssima imagem do país projetada na imprensa internacional ao longo da semana passada. A violência no Brasil ganhou ampla divulgação nos veículos de mídia do resto do mundo e levou o Índice de Interesse Internacional (iii-Brasil), da revista Interesse Nacional, a seu nível mais negativo desde o início do levantamento, em abril.

Assim como na semana anterior, a última semana de maio voltou a registrar 61 artigos com menções de destaque ao Brasil nos sete veículos de imprensa estrangeiros analisados pelo índice. O número é o mais alto desde o início da coleta e análise do iii-Brasil.

Com dois casos emblemáticos de violações de direitos humanos por forças de segurança – a operação no Rio e o assassinato de Genivaldo Santos, em Sergipe –, a proporção de notícias com viés negativo sobre o Brasil chegou a seu patamar mais alto. No total, mais da metade (54%) de todas as menções ao país nos sete veículos de imprensa analisados pelo iii-Brasil tinham tom danoso à imagem do país. Pouco mais de um terço (34,5%) dos textos publicados sobre o Brasil tiveram tom neutro, sem juízos de valor e sem efeitos sobre sua reputação, e apenas 11,5% das notícias sobre o país na mídia estrangeira tinha tom positivo.

O impacto da cobertura estrangeira sobre os dois casos de violência policial no Brasil foi tão grande que 23% de todas as reportagens mencionando o país nos quatro veículos analisados no período tratavam deles. Quase uma em cada quatro menções ao Brasil na imprensa internacional retratava o Brasil como um país dominado pela violência – e especificamente a violência perpetrada pela polícia. Para piorar, os jornais analisados ainda traziam outros casos pontuais de violência no país, um deles trata-se de um agressivo crime de feminicídio ocorrido em São Paulo, o que pode ampliar ainda mais a reputação negativa do Brasil.

https://interessenacional.com.br/edicoes-posts/entenda-como-funciona-o-indice-de-interesse-internacional-monitoramento-de-noticias-sobre-o-brasil-no-exterior/

Entre os sete veículos de imprensa monitorados pelo iii-Brasil, apenas o jornal americano The New York Times ignorou os casos de violência da semana. Todos os outros publicaram as notícias e análises sobre os casos – como o texto do Le Monde que abre este relatório. O jornal português Público, por exemplo, relatou que além dos mais de 20 mortos na ação da semana passada, as forças de segurança do Rio já provocaram 74 chacinas desde o ano passado. “Policiais mataram 330 civis na região metropolitana do Rio desde que Cláudio Castro, aliado de Bolsonaro, assumiu como governador interino em agosto de 2020. O ano passado, uma em cada três mortes no estado foram às mãos das forças de segurança”, diz a reportagem. 

O jornal britânico The Guardian, por outro lado, foi além da questão da violência policial e publicou uma reportagem com base em relatório recente da agência de análise de risco Verisk Maplecroft apontando cidades brasileiras (e da América Latina), como o próprio Rio, como algumas das mais violentas do mundo. Registros que aumentam e confirmam estudos anteriores sobre a imagem do Brasil.

Além das questões relacionadas à violência, notícias sobre mortes por enchentes em Pernambuco também marcaram negativamente a cobertura estrangeira sobre o Brasil. Por mais que o caso seja relativo a questões ambientais, ele evidencia problemas de pobreza, condições de vida precária e desigualdade no país, com exposição da vulnerabilidade das comunidades mais pobres do Brasil. Também teve destaque negativo a mais recente troca no comando da Petrobras pelo presidente Jair Bolsonaro, o que criou imagem de instabilidade da empresa e da economia brasileira.

Como em semanas anteriores do levantamento sobre a imagem do Brasil na imprensa internacional e estudos anteriores encontrados na literatura acadêmica, notícias sobre cultura dão o tom mais positivo à projeção externa do Brasil. Na última semana, um destaque foi um elogioso perfil de Milton Nascimento publicado pelo jornal britânico The Guardian. Destoando da imagem positiva ligada à cultura, o China Daily publicou uma reportagem sobre o aprofundamento de laços econômicos entre o Brasil e o país asiático, apontando potencialidades brasileiras com viés qualitativo para a percepção brasileira.

Entre as notícias com viés neutro, veículos da imprensa estrangeira noticiaram com maior destaque a desistência de João Doria de concorrer à Presidência. Com tom factual e sem prejuízo para a imagem do país, veículos como o Público, o El País e o Clarín indicam que a disputa política se aproxima de um cenário em que os brasileiros vão ter que decidir entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – a polarização entre eleitores prevalece em 2022.


* Daniel Buarque é editor-executivo do Interesse Nacional, pesquisador no programa de doutorado em Relações Internacionais do Brazil Institute do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. É jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor do livro “Brazil, um país do presente” (Alameda)

Fabiana Mariutti é pesquisadora doutora e consultora sobre gestão de marca de lugar e negócios internacionais; pós-doutorado, doutorado e mestrado em Administração com Bacharel em Comunicação Social. Estuda a marca Brasil desde 2010.

Editor-executivo do portal Interesse Nacional. Jornalista e doutor em Relações Internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Mestre pelo KCL e autor dos livros Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial), O Brazil é um país sério? (Pioneira) e O Brasil voltou? (Pioneira)

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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