Notice: Function _load_textdomain_just_in_time was called incorrectly. Translation loading for the wordpress-seo domain was triggered too early. This is usually an indicator for some code in the plugin or theme running too early. Translations should be loaded at the init action or later. Please see Debugging in WordPress for more information. (This message was added in version 6.7.0.) in /home/storage/c/6b/bd/interessenaciona1/public_html/wp-includes/functions.php on line 6114
Interesse Nacional
06 novembro 2024

Donald Trump eleito – O que o mundo pode esperar desse novo mandato?

Enquanto o mundo aguardava ansioso pelo resultado final, o paradoxo é que desde o final da Guerra Fria, os eleitores norte-americanos têm demonstrado menor interesse pelo restante do planeta

Apoiadores do presidente-eleito Donald Trump durante campanha (Foto: Donald Trump/Instagram)

Por Flavia Loss de Araujo*

A apuração das eleições mais acirradas dos Estados Unidos (EUA) nas últimas décadas já confirma: Donald Trump foi eleito para mais um mandato à frente da Casa Branca. Mesmo antes do resultado oficial, Trump discursou na Flórida e reforçou promessas de uma “nova era de ouro” para o país e de “consertar” as fronteiras. O que o mundo pode esperar do novo mandato e quais são os principais desafios para sua política externa?

Cada vez mais, o pleito dos EUA se torna um evento global e midiático, fenômeno intensificado pela polarização das democracias, dividindo a opinião pública de vários países entre defensores dos partidos Republicano ou Democrata. No Brasil, Trump possui apoiadores fieis e certamente sua vitória animará a extrema direita global, energizando bases e impulsionando candidaturas similares nos próximos anos.

Enquanto o mundo aguardava ansioso pelo resultado final, o paradoxo é que desde o final da Guerra Fria, os eleitores norte-americanos têm demonstrado menor interesse pelo restante do planeta. A partir da segunda década do século XXI, tornaram-se mais isolacionistas, apoiando candidatos que defendem menos atenção aos problemas de outros países e prioridade aos seus próprios interesses. Esse, aliás, é um dos motes da campanha de Trump: América Primeiro.

Priorizar o interesse nacional não é novidade nas relações internacionais, mas se torna um problema quando essa prática é adotada enfaticamente pela principal potência econômica e militar, como ocorreu no primeiro governo Trump (2017-2021).

Os EUA desempenham papel crucial na ordem internacional construída após a Segunda Guerra Mundial, mantendo regras, normas e instituições que norteiam as relações entre países, como acordos comerciais e cooperação internacional em áreas como saúde e política monetária.

Em tempos de alta propagação de notícias falsas, é importante lembrar que a ordem internacional não é, como muitos nas redes acreditam, um plano de dominação de supostos comunistas, mas sim uma governança baseada nos valores que os EUA passaram a propagar após sua vitória em 1945.

Por isso, é chamada de ordem internacional liberal, reunindo o liberalismo político, pela democracia, e o econômico, com o livre mercado. A continuidade dessa ordem depende de países que compartilhem esses ideais e do compromisso do seu criador em preservá-la.

Sabemos que essa não é uma prioridade do novo presidente, o que sugere enfraquecimento da ordem e episódios pouco liberais, como mais uma etapa da guerra comercial e a retirada dos EUA de acordos sobre mudanças climáticas.

O país contribui com cerca de 22% do orçamento da Organização das Nações Unidas (ONU), instituição alvo de críticas nas últimas décadas, mas ainda o único fórum que reúne todos os países. Os EUA também são os maiores financiadores da OTAN, aliança militar recuperada com a Guerra da Ucrânia.

Como os EUA lideram os rankings de emissões cumulativas de gases de efeito estufa e per capita, certamente nenhuma iniciativa de mitigação das mudanças climáticas terá sucesso sem a participação norte-americana. Mais um ponto fundamental da atualidade é a Inteligência Artificial (IA), e também nesse tema os EUA estão à frente.

A importância do país contrasta com as bandeiras defendidas por Trump. Há pistas de como sua política externa será conduzida, com base em seu primeiro mandato, mas Trump é imprevisível. Um vice-presidente profundamente alinhado com Trump e um congresso dividido, mas com leve vantagem Republicana, são fatores que podem fortalecer uma política externa agressiva, com poucas concessões até para aliados.

Os europeus aguardavam preocupados os resultados e não era segredo que a maioria ansiava pela vitória de Kamala Harris, com exceção de políticos de extrema direita como Viktor Orbán, da Hungria. Quanto à Ucrânia, Trump prometeu encerrar a guerra com a Rússia “em 24 horas”, mas os termos permanecem indefinidos. O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky deseja recuperar todo o território invadido, objetivo que Trump indicou que não apoiará.

A OTAN amanheceu hoje sob o risco de ruptura, já que Trump quer que europeus paguem mais pela sua manutenção. A guerra da Ucrânia reanimou a aliança, com o medo dos europeus da Rússia de Putin. Diferente de cinco anos antes, quando foi considerada obsoleta, agora a OTAN é essencial para a política de segurança da União Europeia, que espera menor engajamento dos EUA.

Nas relações comerciais EUA-Europa, Trump provavelmente aumentará as tarifas aos produtos europeus e, ainda pior, impulsionará a guerra comercial com a China, principal parceiro da União Europeia (UE). Com barreiras tarifárias nos EUA, os chineses podem desviar o comércio excedente para a Europa, prejudicando indústrias, especialmente a alemã.

No Oriente Médio, Trump apoia Israel incondicionalmente e chegou a propor um acordo de paz draconiano para os palestinos em seu primeiro mandato. Espera-se que ao menos consiga um cessar-fogo usando sua proximidade com o governo israelense.

Se com aliados a abordagem é dura, com adversários é de enfrentamento. A China espera uma nova rodada de tarifas e o acirramento da guerra comercial, conflito que não arrefeceu sob os Democratas, que mantiveram as tarifas do primeiro governo Trump.

E como fica a América Latina nesse contexto? A região não está nas prioridades de nenhum lado do espectro político norte-americano e ficará ainda mais distante de importância na presidência de Trump. O interesse dos EUA é apenas estratégico: diminuir o fluxo de imigrantes. A área do Triângulo do Norte, que inclui El Salvador, Guatemala e Honduras, receberá especial atenção por ser a origem da maioria dos imigrantes.

A vitória de Trump animará a extrema direita do continente e foi ansiosamente aguardada pelo presidente argentino Javier Milei, mas o primeiro mandato de Trump mostrou que mesmo governos ideologicamente alinhados não podem esperar grandes gestos de cooperação da Casa Branca. Apesar dos acenos ao ex-presidente Jair Bolsonaro e trocas de tuítes, poucas ações concretas resultaram desse alinhamento. Trump não salvará a Argentina e, no máximo, diminuirá o isolamento internacional de Milei, especialmente após a demissão da chanceler Diana Mondino. Isso porque, no passado, a ausência do principal fiador da ordem internacional fez com que os europeus buscassem cumprir esse papel, fomentando acordos de cooperação em diversas áreas com o maior número de parceiros. Visto que Trump representa uma ameaça para esse processo, provavelmente os europeus tentarão garantir o mercado do Cone Sul.

O retorno de Trump à presidência da maior potência mundial traz apreensão sobre os rumos da política internacional. O mundo já tem experiência com seu estilo de política externa, mas sua imprevisibilidade não deixa margem para tranquilidade. Ao analisar o cenário global para os próximos quatro anos, é inevitável pensar que o caos pode ameaçar a ordem estabelecida, cabendo aos países que perseveram nos seus valores, em especial a democracia, agir para preservá-la.


Flavia Loss de Araujo, Doutora pelo Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI-USP) e coordenadora da Pós-Graduação em Política e Relações Internacionais, Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP)

This article is republished from The Conversation under a Creative Commons license. Read the original article.

Este texto é uma republicação do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original em https://theconversation.com/br

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

Tags:

Eleições 🞌 EUA 🞌

Cadastre-se para receber nossa Newsletter