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Interesse Nacional
30 agosto 2024

Brasil é fogo!

Recordes incêndios na Amazônia, no Pantanal e no Cerrado são agravados pela crise climática e refletem falta de uma ação preventiva, planejada e coordenada para evitar desastres ambientais recorrentes com a perda de vidas humanas e prejuízos econômicos

Operação Pantanal segue com combate e monitoramento de focos de incêndio em diferentes regiões (Foto: Governo do Estado do Mato Grosso)

Segundo os dados do INPE, entre janeiro e 26 de agosto foram identificados 52.104 focos de incêndio na Amazônia, 81% a mais do que no mesmo período em 2023. No Pantanal, 8.593 focos, aumento de 2.114%. No Cerrado 35.101, quase 100%. Em 2024, houve um aumento nas queimadas de 47% na Amazônia, 32% no Cerrado e 8% no Pantanal. É o maior número da série histórica do INPE, iniciada em 1998. 

O aumento das queimadas na Amazônia e no Pantanal está associado principalmente à crise climática, em vista da seca que afeta o bioma. No primeiro semestre deste ano, 53,3% das queimadas registradas no Cerrado ocorreram nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, a principal área de expansão agrícola do país. 

A essas queimadas, associadas a questões climáticas, somam-se as queimadas no Estado de São Paulo, afetando importante área agrícola com grande prejuízo (R$ 500 milhões na área canavieira) para a economia paulista, e que estão sendo atribuídas a ações criminosas não se sabe inspiradas por quem.

‘Causou surpresa no governo, a decisão do ministro Flávio Dino de determinar que o governo federal mobilize em 15 dias o maior contingente possível de forças para combater os incêndios’

No meio dessa crise ambiental, causou surpresa no governo, a decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, ex-ministro de Lula, de determinar que o governo federal mobilize em 15 dias o maior contingente possível da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Forças Armadas e Força Nacional para combater os incêndios na Amazônia e no Pantanal. O ministro tomou essa decisão (que foi interpretada como crítica implícita à omissão do governo e invasão das atribuições do Executivo), em processos que discutem a proteção da Amazônia e do Pantanal. 

O Supremo julgou em março deste ano três ações, impetradas pelo PT e pela Rede, contra a política ambiental do governo Bolsonaro, visando a necessidade de a União proteger a Amazônia e o Pantanal. Na ocasião, a Suprema Corte determinou que fosse elaborado em 90 dias um plano de combate a incêndios nestes dois biomas, o que não aconteceu. 

‘Essa decisão que responde à falta de uma política coordenada de combate às catástrofes ambientais, ignorou que, o atual governo vem buscando reconstruir os meios de fiscalização e prevenção de acidentes climáticos’

Essa decisão que responde à falta de uma política coordenada de combate às catástrofes ambientais, ignorou que, no atual governo, o ministério do Meio Ambiente vem buscando reconstruir os meios de fiscalização e prevenção de acidentes climáticos e nas últimas semanas, providenciou a contratação de brigadistas e a criação de força tarefa com a participação inclusive das Forças Armadas.

Com o avanço dos incêndios nos últimos dias, porém, o ministro Flávio Dino, que ficou como responsável por acompanhar a execução da decisão do STF, disse que não ignora os atuais esforços do governo federal, mas defende a necessidade urgente de intensificá-los com a força máxima disponível. O STF promoverá uma audiência, no dia 10 de setembro, com os ministros da AGU (Advocacia-Geral da União), Defesa, Justiça, Meio Ambiente, Povos Indígenas e do Desenvolvimento Agrário, a PGR, advogados dos partidos Rede e PT, que entraram com as ações no Supremo, e o presidente do STJ, ministro Herman Benjamin, para dialogar sobre o desmatamento no Pantanal e na Amazônia. Agendada desde o início de agosto, a reunião deve ter foco especial nos reflexos e ações de combate às queimadas que vem ocorrendo no país. Na ocasião, os representantes do Poder Executivo precisarão repassar também um relatório de todas as ações empreendidas para combater os incêndios na Amazônia e no Pantanal. 

‘A Política Nacional de Manejo do Fogo, sancionada no último dia 31, regula o uso do fogo no meio rural, definindo diretrizes para queimadas controladas (para fins agropecuários) e prescritas (para fins de conservação)’

Como mais um exemplo de falta de visão estratégica, ninguém mencionou até aqui a Política Nacional de Manejo do Fogo, sancionada no último dia 31. O projeto de lei, elaborado pelo Ministério do Meio Ambiente, foi apresentado à Câmara dos Deputados, em 2018, um ano após a queimada que devastou a Chapada dos Veadeiros. Mas o PL travou o exame da matéria no Senado, apesar do aumento dos focos de incêndio ano a ano. A Política Nacional de Manejo do Fogo tem, como estrutura, um comitê nacional, um centro de operações e um sistema integrado de informações, o Sisfogo. A Política regula o uso do fogo no meio rural, definindo diretrizes para queimadas controladas (para fins agropecuários) e prescritas (para fins de conservação). O que foi feito no âmbito dessa política pelo atual governo?

Assim como ocorre anualmente com os problemas nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e, neste ano, no Rio Grande do Sul, com a temporada de chuvas nos meses de dezembro a março, todos os anos de julho a outubro, se sabe que a seca faz com que aumente o risco de queimadas no Pantanal, na Amazônia e no Cerrado. 

A falta de medidas preventivas não ocorreu apenas no governo atual, mas com todos os governos anteriores, em função da deficiente coordenação entre diferentes órgãos do governo federal com os Estados, da gestão precária, a ausência de medidas ações efetivas, que mostram uma ausência de planejamento adequado para evitar os desastres ambientais recorrentes sempre com a perda de vidas humanas e prejuízos econômicos. A situação ficou ainda mais agravada agora com a suspeita de queimadas provocadas por atos criminosos.

Nesse contexto emergencial, pode ser melhor compreendida a atuação política do STF, liderada pelo ministro Flávio Dino, determinando rápida ação governamental.

Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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