Não é de hoje que, no Brasil, prefere-se culpar o outro antes de voltar o olhar para si próprio. Isso quando não se joga para o passado problemas que ainda fazem parte da agenda atual. Esse tipo de atitude, que aparece nas mais diferentes situações de tensão, é particularmente frequente nos casos de racismo, quando com muita facilidade se joga para o “outro” – seja o vizinho, a história, o amigo, o familiar – a pecha do preconceito.
Muitos motivos se somaram, ao longo da nossa história, para dificultar a tarefa de decifrar, mesmo imperfeitamente, o enigma brasileiro. Já independentes, continuamos a ser um animal muito estranho no zoológico das nações: sociedade recente, produto da expansão europeia, concebida desde o início para servir ao mercado mundial, organizada em torno de um escravismo prolongado e tardio, única monarquia em um continente republicano, assentada em uma extensa base territorial situada nos trópicos, com um povo em processo de formação, sem um passado profundo onde pudesse ancorar sua identidade. Que futuro estaria reservado para uma nação assim?
Este artigo apresenta o programa Bolsa Família no contexto da organização de uma rede de proteção e promoção social que se estrutura no Brasil. Nele, é discutido o papel que as políticas sociais desempenham na elaboração de um projeto nacional inclusivo, a partir de uma discussão sobre a evolução de direitos no Brasil.
Os autores argumentam que a questão racial ocupou, ainda que veladamente, lugar central na agenda da construção do Estado brasileiro desde o século XIX. Aos negros, as elites teriam reservado um lugar subordinado nos projetos de modernização do país. O crescimento econômico e a adoção de políticas sociais universais não seriam suficientes para libertá-los desse lugar ideologica e socialmente construído. Para tanto, os autores defendem a necessidade de políticas de ação afirmativa.