A recuperação eleitoral de Bolsonaro no primeiro turno nos lembra por que os líderes populistas são tão populares

Políticos como Bolsonaro, Trump, Boris Johnson, Giorgia Meloni e Modi são muitas vezes vistos como inelegíveis, mas continuam a ter sucesso eleitoral em muitas partes do mundo. Em artigo, o professor de segurança nacional na universidade de Hull Robert M. Dover explica que eles usam redes sociais de forma eficiente para promover ideias simples, explorar emoções e alinhar sua persona pública à de alguém que luta contra o sistema

Por Robert M. Dover

O atual presidente brasileiro Jair Bolsonaro garantiu inesperados 43% dos votos no recente primeiro turno da eleição presidencial do país, logo atrás de seu oponente Luiz Inácio Lula da Silva (que teve 48%).

Muitos institutos de pesquisa previam que Bolsonaro não se sairia tão bem no primeiro turno, e houve até previsões de que Lula poderia obter uma vantagem clara o suficiente para obter uma vitória total. Mas Bolsonaro se recuperou, obtendo votos suficientes para garantir um segundo turno em 30 de outubro.

Políticos populistas como Bolsonaro, o britânico Boris Johnson, a nova primeira-ministra italiana Giorgia Meloni e o líder da Índia Narendra Modi têm sido frequentemente vistos por seus oponentes e comentaristas profissionais como inelegíveis e indesejáveis. E, no entanto, continuam a ter sucesso eleitoral.

Os populistas administram isso de várias maneiras. Eles promovem mensagens e ideias simples de entender que exploram fortes desejos emocionais de uma parcela significativa da população.

Eles procuram alinhar sua persona pública à de alguém que está lutando contra o sistema, mesmo quando isso não é natural. Foi assim que o bilionário Trump e Johnson, que tinham educação privada e passaram a ser vistos como homens do povo, apesar de terem vidas privilegiadas. E eles fazem uso poderoso de métodos modernos de comunicação, que hoje significam a internet e as redes sociais.

O termo populista sugere que esses políticos são mais eficazes em explorar os desejos públicos do que seus oponentes. Há alguma verdade nesta afirmação. Em particular, os líderes populistas de hoje muitas vezes jogam com o fato de que a ordem pós-Guerra Fria não conseguiu fazer a globalização funcionar para a maioria das pessoas.

No referendo do Reino Unido sobre a adesão à União Europeia, Johnson e outros que defendiam a saída da UE entenderam que um número considerável do público britânico se sentia deixado para trás pela globalização e estava farto (como via) de ser ditado pela UE. Da mesma forma, Trump aproveitou “valores tradicionais” e desejos conservadores dentro de uma parte do público dos EUA que lembrava um mundo de maior prosperidade e segurança no emprego.

Enquanto isso, na Índia, Modi explora o orgulho nacionalista e o privilégio sectário. Bolsonaro busca rejeitar a política progressista e retornar aos “valores tradicionais da família”.

O mito do ‘outsider’

Ao fazer uso dessa nostalgia, os populistas muitas vezes definem a si mesmos e seus apoiadores como outsiders, que perderam quando os valores progressistas assumiram o controle (mesmo quando esses políticos vêm de elites estabelecidas). Então, se você é um proprietário de armas brasileiro que se opõe aos direitos dos homossexuais, aos direitos dos povos indígenas e ao aborto, Bolsonaro fornece a você um lar político pronto.

Da mesma forma, os populistas usam narrativas de que as instituições governamentais existentes e os políticos tradicionais falharam com o público. No caso de Bolsonaro, assim como de Trump, isso claramente ressoou bem com os eleitores, alguns dos quais aceitaram os argumentos de que funcionários do governo e funcionários públicos são preguiçosos e dispostos a se intrometer em seus assuntos.

Dessa forma, os políticos populistas prometem agir como “disruptores”, semelhante à forma como a Amazon transformou o setor de varejo e a Tesla está transformando a fabricação de motores. De fato, subverter as estruturas de governo é uma parte essencial da cartilha populista.

O cientista político Jonathan Hopkins descreve essa onda de políticos como “antissistema”. Sua premissa central é redesenhar o sistema político estabelecido, nacional e internacionalmente.

Truques de internet

Figuras antissistema bem-sucedidas, incluindo Trump e Johnson (e principalmente suas equipes de campanha), também aproveitaram o poder de plataformas de mídia social como Twitter, Facebook, Reddit, 4Chan e aplicativos de mensagens privadas como WhatsApp e Signal para nutrir comunidades politicamente simpáticas a eles. Isso torna seu sucesso, em parte, uma história sobre o surgimento de um novo tipo de comunicação política.

Campanhas políticas recentes têm sido poderosas porque usam um truque da internet para aumentar sua eficácia. Os algoritmos de redes sociais descobrem o que nos interessa, o que podemos estar procurando comprar e o que provavelmente acreditamos, e então nos inundam com essas ideias. Os políticos que entenderam melhor isso têm uma grande vantagem.

Os sistemas democráticos parecem particularmente pouco adequados para lidar com esses desafios. Por exemplo, o uso generalizado do WhatsApp na política indiana ou sites falsos persuasivos nas eleições brasileiras tornaram impossível para os reguladores verificar ou reverter a desinformação a tempo de evitar danos.

Para aqueles que buscam derrotar os políticos populistas, eles se deparam com a difícil escolha de serem rotulados como candidatos do establishment ou juntar-se a políticos antissistema em campanhas de marketing de guerrilha e slogans destinados a mobilizar radicalmente o público.

Mesmo que Bolsonaro não se mantenha na Presidência, sua influência, como a de Trump, não vai desaparecer tão cedo. Seus apoiadores agora estão instalados em altos cargos, em órgãos oficiais, tribunais e governos estaduais, prontos para seguir em frente.

*Robert M. Dover é professor de inteligência e segurança nacional na University of Hull

Este texto é uma republicação do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original, em inglês.

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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