Daniel Buarque: A inconsistência do prestígio econômico do Brasil
Pesquisas sobre percepção internacional mostram retratos diferentes sobre o status da economia brasileira, com dados positivos e negativos. Imagem mais consolidada é de que país desempenha papel econômico abaixo das suas capacidades
Pesquisas sobre percepção internacional mostram retratos diferentes sobre o status da economia brasileira, com dados positivos e negativos. Imagem mais consolidada é de que país desempenha papel econômico abaixo das suas capacidades
Por Daniel Buarque*
É praticamente um consenso entre pesquisadores que a imagem de sucesso econômico ajudou a impulsionar a ideia de ascensão do Brasil no final da primeira década do século XXI, ilustrada pela capa da revista The Economist sobre o país “decolar”. Também está bem consolidada a noção de que a recessão econômica da década seguinte (associada a uma série de crises domésticas) foi a grande responsável pela perda de status do país no mundo.
Em 2024, entretanto, o Brasil vê seu prestígio internacional ser tema marcado por uma inconsistência, especialmente nessa área de finanças. É difícil saber exatamente a percepção externa sobre a economia brasileira, e trabalhos recentes apresentam retratos bem contraditórios. E os poucos consensos não são muito positivos para o país.
O exemplo disso são dois estudos separados publicados neste início do ano. Um deles colocou a economia como um dos destaques positivos do país, ajudando a colocar o Brasil entre as nações mais importantes do mundo. O outro, divulgado durante a conferência de Davos, revelou que o Brasil despencou no ranking de mercados que CEOs veem como cruciais.
As duas pesquisas são feitas a partir de levantamentos de opinião e experts de diferentes partes do mundo. Esses índices revelam que há diferentes formas de entender a situação da economia brasileira no contexto global, e que alguns observadores são mais otimistas do que outros.
O dado mais positivo foi revelado pela International Hierarchy Expert Survey, pesquisa realizada anualmente com o objetivo de entender as percepções relacionadas à hierarquia de países na política internacional. O Brasil é o 9º país com maior prestígio do mundo, de acordo com o estudo realizado pelo Instituto de Estudos Internacionais do Instituto Estatal de Relações Internacionais de Moscou (MGIMO) baseado em entrevistas com especialistas de diferentes partes do mundo sobre suas percepções das hierarquias de poder globais.
Apesar da boa classificação, o Brasil é mal avaliado em termos de política internacional, ação humanitária e de segurança e tem destaque positivo nas áreas ambiental e econômica.
Já a avaliação mais negativa vem da 27ª edição da CEO Survey, pesquisa anual divulgada na abertura da reunião anual do Fórum Econômico Mundial. O país aparece na 14ª posição do ranking de mercados cruciais para a expansão dos negócios no próximo ano. Foi a primeira vez em dez anos que ele não apareceu entre os dez principais mercados considerados estratégicos para o empresariado mundial.
Parte dessas diferenças pode ser creditada às diferentes metodologias e diferentes públicos estudados pelas duas pesquisas. Entender o nível de prestígio de um país ainda é um grande desafio para a academia. E estudos sobre imagem e status internacional revelam que não há uma única percepção dos diferentes países. Saber quem está olhando para um país é fundamental para entender como ele é visto.
Por um lado, o levantamento russo entrevistou especialistas em política internacional para entender suas perspectivas sobre a hierarquia global – e o Brasil teve um desempenho melhor. Por outro, o dado de Davos revela a percepção de diretores de empresas que estão de olho em oportunidades para ganhar mais dinheiro – aqui o país não foi tão bem visto.
De qualquer forma, o contraste cria um desafio maior para a inserção da economia brasileira no mundo. Entender como o país é visto é fundamental para o desenvolvimento de políticas que promovam a sua projeção global, e é difícil fazer isso quando não há um alinhamento entre as percepções.
Uma boa forma de lidar com esses dados talvez seja procurar o que há de concordância neles. E nesse caso é importante considerar que o Brasil de 2024 é visto como um país cuja economia está desempenhando um papel abaixo das suas capacidades.
Apesar da abordagem diferente, as duas são claras em minimizar a importância relativa do Brasil para a economia global. Mesmo que tenha voltado a figurar entre as dez maiores economias do mundo no ano passado, o país não é visto como um dos países mais relevantes do planeta nessa área. É o 11º para o MGIMO e o 14º para os CEOs de Davos.
Este é um dado que pode ser importante para ser usado pelo governo ao desenvolver suas políticas, buscando mostrar que o país é capaz de ter um papel econômico mais relevante do que o resto do mundo reconhece para ele.
*Daniel Buarque é pesquisador no pós-doutorado do Instituto de Relações Internacionais da USP (ISI/USP), doutor em relações internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor de livros como Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial) e O Brazil é um país sério? (Pioneira). É editor-executivo do portal Interesse Nacional.
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Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional
Editor-executivo do portal Interesse Nacional. Jornalista e doutor em Relações Internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Mestre pelo KCL e autor dos livros Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial), O Brazil é um país sério? (Pioneira) e O Brasil voltou? (Pioneira)
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