11 abril 2025

O Mercosul no contexto de tensão global

Mauro Vieira vai a Buenos Aires para preparar encontro de presidentes do bloco em meio a alta tensão internacional por conta da guerra comercial iniciada por Donald Trump

O ministro Mauro Vieira estará em Buenos Aires nesta semana para reunião de ministros do Exterior do Mercosul em preparação do encontro de presidentes do bloco em junho, encerrando a coordenação argentina. No segundo semestre, o Brasil assume a presidência do Mercosul. A reunião de cúpula do bloco, em junho, terá importância acrescida em vista das medidas protecionistas tomadas por Donald Trump contra todos os países e, em especial, em função da guerra comercial entre os EUA e a China, com possíveis impactos sobre o Brasil e a Argentina.

Na reunião ministerial de Buenos Aires, o Brasil deve querer saber como as posições públicas de Javier Milei em relação ao tarifaço de Trump e a intenção do presidente argentino em negociar um acordo comercial com os EUA impactarão o Mercosul.

‘No caso do tarifaço trumpiano, Milei indicou que poderia negociar uma rebaixa tarifária argentina para reduzir os 10% imposto por Washington’

No caso do tarifaço trumpiano, Milei indicou que poderia negociar uma rebaixa tarifária argentina para reduzir os 10% imposto por Washington. Caso isso ocorra, haveria perfurações adicionais à Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul. Por outro lado, Milei está pedindo uma flexibilização das regras do Mercosul (“uma prisão”) para poder negociar com os EUA um eventual acordo comercial bilateral. 

Nessa hipótese, a Argentina teria de se retirar do grupo, pois, dificilmente o Brasil concordaria em modificar o Artigo 1 do Tratado de Assunção, que prescreve a negociação conjunta dos países membros nos entendimentos para a assinatura de um acordo comercial com outros países ou grupo de países.

‘Na reunião, também deverá ser examinada a perspectiva de mudança da posição da União Europeia com o avanço da assinatura do acordo com o Mercosul em vista das mudanças no cenário internacional’

Na reunião, também deverá ser examinada a perspectiva de mudança da posição da União Europeia com o avanço da assinatura do acordo com o Mercosul em vista das mudanças no cenário internacional e da prevalência de fatores geopolíticos. Deverão também ser examinadas possibilidades adicionais de acordos com outros países da Ásia como Japão e Vietnã (conversas recentes de Lula nesses países), com a Indonésia e outros países (Emirados Árabes Unidos). Poderão também ser examinadas as possibilidades de serem abertas conversas com o México e retomados os entendimentos com o Canadá, em ambos os casos em função da crise com os EUA.

O Mercosul pouco avançou durante a presidência argentina (o que poucos esperavam que acontecesse em vista das posições de Milei). Na presidência brasileira (no segundo semestre), espera-se que o acordo com a União Europeia e com a Área de Livre Comércio na Europa (EFTA) seja assinado. 

‘Com uma pitada de ousadia, o Brasil poderia sugerir que o Mercosul desse início a gestões políticas para pedir acessão do CCTPP’

Com uma pitada de ousadia, a exemplo do que já fizeram China e Uruguai e do que examina a Europa, o Brasil poderia sugerir que o Mercosul desse início a gestões políticas para pedir acessão do CCTPP (ex-TransPacific Partnership) que congrega mais de dez países asiáticos.

Finalmente, deverão também ser examinadas questões relacionadas com o funcionamento do Mercosul com vistas a enxugar os mecanismos existentes para tornar o grupo mais eficiente e melhor responder aos desafios que o novo cenário global apresenta.

‘Projetos de integração regional como o Corredor Bi-oceânico Tropical deveriam ser tratados para que os trechos na Argentina e no Paraguai sejam finalizados’

Além disso, projetos de integração regional como o Corredor Bi-oceânico Tropical deveriam ser tratados para que os trechos na Argentina e no Paraguai sejam finalizados para permitir a abertura do corredor no final do ano ou no início do próximo ano.

Mauro Vieira em Buenos Aires manteve contatos com a alta direção do governo Milei, mantendo corretamente os canais de comunicação com a Argentina, apesar da falta de contato entre os presidentes dos dois países. Encontro com o ministro do exterior do Paraguai pode ajudar a superar a crise desencadeada com a notícia da espionagem da ABIN relacionada com a negociação do Anexo C do Tratado de Itaipu.

Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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