O avanço da extrema-direita no mundo
Eleições em Portugal deram fim ao bipartidarismo e reforçaram a percepção de avanço de extremistas de direita por todo o planeta, guiado em ampla medida pela rejeição à imigração. Fenômeno também pode ser percebido no Brasil, onde o ex-presidente Jair Bolsonaro demonstrou força, e a extrema-direita pode ser competitiva nas eleições municipais
Eleições em Portugal deram fim ao bipartidarismo e reforçaram a percepção de avanço de extremistas de direita por todo o planeta, guiado em ampla medida pela rejeição à imigração. Fenômeno também pode ser percebido no Brasil, onde o ex-presidente Jair Bolsonaro demonstrou força, e a extrema-direita pode ser competitiva nas eleições municipais
Por Rubens Barbosa*
O resultado das eleições em Portugal no domingo (10) apontou mais um avanço da direita no mundo.
A eleição foi convocada antecipadamente após o primeiro-ministro socialista António Costa renunciar em novembro de 2023 como consequência de investigações sobre supostas ilegalidades na administração estatal de grandes projetos de investimento.
Como antecipado nas pesquisas, o resultado do voto popular não apresentou grandes surpresas nem um grande vencedor. O partido de direita, Aliança Democrática, com 29,52% dos votos, chegou à frente do Partido Socialista, liderado por Pedro Nuno Santos, que está dirigindo o governo Português, com 28,66%. Superado por pequena margem de votos, o Partido Socialista vai deixar o poder em Portugal depois de seis anos de governo.
A grande novidade foi o crescimento da extrema-direita, com o partido Chega, liderado por André Ventura, que alcançou 18% dos votos. Xenófobo, anti-imigrante e anti-União Europeia quadruplicou sua participação no Parlamento Português. André Ventura prometeu que, se chegasse ao poder, impediria a entrada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Portugal.
Luís Montenegro, líder da Aliança Democrática, deverá buscar formar o novo governo e prometeu não incluir a extrema-direita no poder.
O resultado da eleição mostra Portugal dividido e com dificuldades de governança. A Aliança Democrática não tem maioria no Parlamento e terá de buscar apoio de partidos menores para formar o governo e colocar em vigor sua plataforma conservadora. Embora Montenegro tenha explicitamente anunciado que não fará qualquer aliança com o Chega, que classificou de xenófobo, racista, populista e demagógico, é provável que o líder da AD fique sobre pressão por seu próprio partido para negociar um acordo com a externa-direita e permitir que um dos partidos radicais possa ingressar no governo. O líder do Chega já se manifestou nesse sentido.
Na prática, o resultado da eleição colocou um fim no bipartidarismo em Portugal e criou a perspectiva de um governo minoritário, o que poderá levar à convocação de novas eleições. Segundo se informou, algumas lideranças evangélicas brasileiras apoiaram pública e financeiramente a AD e mesmo o Chega, reforçando a direita e extrema-direita em Portugal.
O crescimento da direita e a tomada de poder em Portugal reforça a tendência dos últimos anos na Europa, como ocorrido na Itália, na Hungria, na Polônia e mais recentemente na Suécia, na Holanda, na Espanha e na Alemanha. Na América do Sul, a Argentina elegeu um representante da extrema-direita na economia e nos costumes. Em diversos países, a direita mostra sua força ao fazer parte do governo, mesmo como minoria.
No cenário político global, as perspectivas para a direita e a extrema-direita são promissoras. Na França, Marie Le Pen poderá representar uma nova conquista da direita europeia, e, nos EUA, caso as pesquisas se confirmem, o movimento da extrema-direita nacionalista e xenófoba de Donald Trump poderá tirar os democratas do poder.
Um dos fatores que unem todos os partidos de direita na Europa e nos EUA é a politica de imigração. A rejeição aos imigrantes se espalhou na Europa e nos EUA criando um ambiente propício à xenofobia e ao populismo, com a inevitável radicalização e polarização interna. A democracia – como entendida até aqui – está ameaçada pelas ações radicais dos representantes dessa corrente conservadora.
No Brasil, estamos vendo o movimento da direita conservadora crescer e se consolidar como uma força política que não pode ser ignorada.
O grande comparecimento à Avenida Paulista em resposta ao chamado do ex-presidente Jair Bolsonaro é uma evidência da consolidação da força da direita. A presença cada vez mais visível e ativa das forças de direita no Congresso indica a possibilidade de uma campanha forte nas próximas eleições de outubro, com a captura de um grande número de prefeituras e câmaras nas próximas eleições municipais. Com isso, fica aberta a porta para um desempenho competitivo nas eleições presidenciais de 2026.
*Rubens Barbosa é diplomata, foi embaixador do Brasil em Londres e em Washington, DC. É presidente do Instituto Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e coordenador editorial da Interesse Nacional. Mestre pela London School of Economics and Political Science, escreve regularmente no Estado de São Paulo e no Interesse Nacional e é autor de livros como Panorama visto de Londres, Integração econômica da América Latina, O dissenso de Washington e Diplomacia ambiental
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Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional