Um Trump ensanguentado e desafiador pode se tornar a imagem que definirá a eleição nos EUA
Os Estados Unidos foram fundados com base na violência política, e os incidentes de violência política marcam toda a sua história
Por Emma Shortis*
Os tiros disparados contra Donald Trump em um comício na Pensilvânia no sábado (13) estão sendo investigados como uma tentativa de assassinato do ex-presidente e atual candidato presidencial republicano.
Tentativas de assassinato de presidentes e candidatos à presidência estão presentes por toda a história americana. O que aconteceu na Pensilvânia é horrível, mas, infelizmente, não é surpreendente.
Fiquei realmente impressionada com a quantidade de figuras políticas importantes dos Estados Unidos que se manifestaram após o tiroteio e disseram que a violência política não tem lugar nos Estados Unidos. O presidente dos EUA, Joe Biden, disse que esse tipo de violência é “inédito” nos EUA.
Isso é bastante surpreendente. Os Estados Unidos foram fundados com base na violência política, e os incidentes de violência política marcam toda a sua história.
De fato, Biden começou sua carreira política enquadrando-se como o herdeiro político dos irmãos Kennedy assassinados – o presidente John F. Kennedy, que foi assassinado em 1963, e Robert F. Kennedy, assassinado em 1968.
Entretanto, o fato de esse incidente ocorrer neste momento, dada a natureza volátil da campanha presidencial até o momento e as profundas divisões nos Estados Unidos, é profundamente preocupante.
A maneira como o tiroteio foi transformado em arma nas mídias sociais tão rapidamente – com teorias da conspiração se desdobrando em tempo real – significa que o potencial de escalada desse tipo de violência é muito alto.
Basta observar a insurreição do Capitólio dos EUA em 6 de janeiro de 2021 para ver a rapidez com que a violência política pode explodir nos EUA.
Isso se deve, pelo menos em parte, à forma como a retórica violenta tem sido cultivada deliberadamente por elementos da extrema direita nos últimos anos. Em particular, as tendências de violência política têm fervilhado nos comícios de Trump desde o início de sua primeira candidatura à presidência em 2016.
A ameaça de violência tornou-se central para a imagem política de Trump, para seu apelo e para sua base de apoiadores. Basta assistir a alguns momentos de cada comício e discurso de Trump para ouvi-lo falar sobre violência, muitas vezes com detalhes gráficos e com grande prazer.
Por exemplo, ele mencionou repetidamente teorias da conspiração ao descrever o ataque contra o marido da ex-presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, Paul, em sua casa em 2022, além de zombar dele e brincar com o ataque.
Isso é uma característica, não um erro, da campanha de Trump e do movimento que o apoia.
E tem um impacto no mundo real. Uma análise nacional realizada pela ABC News (organização de mídia dos EUA) em 2020 identificou 54 casos criminais em que o próprio Trump foi invocado em “conexão direta com atos violentos, ameaças de violência ou alegações de agressão”.
Há apenas algumas semanas, Kevin Roberts, presidente do think tank de direita Heritage Foundation (o arquiteto do plano Project 2025 para reformar o governo dos EUA em uma segunda presidência de Trump), falou sobre uma “segunda Revolução Americana” que “permaneceria sem sangue se a esquerda permitir”.
Considerando o quanto essa ameaça de violência se tornou sempre presente, talvez seja mais surpreendente que um incidente dessa magnitude não aconteça com mais frequência, ou que ainda não tivesse acontecido.
Uma imagem que define a campanha
Também é impressionante como Trump é um mestre da imagem política. Você pode ver isso na filmagem do tiroteio na Pensilvânia: depois que Trump se levanta, ele ergue o punho desafiadoramente para que a imagem seja capturada.
É claro que essa imagem definirá esse momento, se não toda a campanha presidencial de Trump.
Houve uma série de pontos de inflexão nessa campanha até agora, e esse pode muito bem ser o decisivo. Ele pode transformar Trump de mártir em santo aos olhos de seus apoiadores.
Observar como Trump, sua campanha e as pessoas ao seu redor usam essa narrativa será muito importante, especialmente antes da Convenção Nacional Republicana, que está programada para começar em Wisconsin nos próximos dias.
Já é possível ver elementos da direita – principalmente entre os apoiadores de Trump – tentando usar a tentativa de assassinato para fomentar teorias conspiratórias como um ponto de encontro para o ex-presidente.
Dada a repercussão do desempenho de Biden no debate nas últimas semanas, uma imagem contrastante dos dois candidatos também está surgindo e pode se solidificar ainda mais – mesmo que não os reflita com precisão.
Essa imagem de Trump, ensanguentado e com o punho erguido, certamente pode vir a enquadrar toda a sua campanha e angariar apoio para ele.
É totalmente possível, então, que esse seja o momento em que Trump venceu a eleição.
*Emma Shortis é pesquisadora da School of Global, Urban and Social Studies, RMIT University
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Este texto é uma republicação do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original em https://theconversation.com/br
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