03 setembro 2024

Bloqueio ao X põe Brasil no centro do debate global sobre redes sociais e democracia

Mais de um terço de todas as citações ao país no exterior trataram da disputa entre Alexandre de Moraes e Elon Musk, apontando para uma tensão que se repete em todo o mundo. Imprensa estrangeira também continua dando atenção a incêndios e destruição ambiental no país.

Por Daniel Buarque e Fabiana Mariutti*

iii-Brasil – de 26/8 a 1°/9 de 2024

Visibilidade: 62 reportagens em 7 veículos analisados

Classificação das notícias:

63% Neutras

18% Negativas

19% Positivas

A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes de bloquear o X (antigo Twitter) no Brasil impulsionou a visibilidade internacional do país na última semana. Mais de um terço de todas as menções ao Brasil na imprensa estrangeira no período trataram da suspensão da rede social, uma cobertura majoritariamente factual, de tom neutro, mas que acabou ampliando o debate global a respeito da regulamentação das redes sociais, instituição da censura e defesa da democracia. 

No total, foram registrados na terceira semana completa de agosto 62 textos com menção ao Brasil nos sete veículos analisados, volume acima da média semanal do iii-Brasil. O período registrou uma maioria de textos de tom neutro (63%), 19% de textos positivos e 18% de menções negativas.

Entenda como funciona o iii-Brasil

A disputa judicial entre Moraes e o bilionário Elon Musk foi acompanhada de perto pela imprensa estrangeira, que publicou notícias detalhadas sobre as cobranças da Justiça brasileira, as reações radicais de Musk, a ameaça de suspensão da rede social e os efeitos imediatos do bloqueio ao X. A maior parte dessa cobertura teve tom neutro, tratando dos fatos e da questão legal de forma detalhada, sem entrar no mérito de forma que pudesse influenciar a imagem internacional do país.

Nos momentos em que a cobertura se tornou mais analítica, o desenrolar do noticiário colocou o Brasil no centro de uma disputa complexa em todo o mundo sobre a liberdade de expressão, a regulamentação das redes sociais e a defesa da democracia.

O jornal americano The New York Times publicou uma reportagem bem aprofundada que fazia exatamente este tipo de análise. O texto apresentava bem o caso, indicando a importância do trabalho brasileiro contra a desinformação, mas indicando que as ações mais recentes de Moraes podem ter ido longe demais. 

Por um lado, diz o jornal, a ação do STF “foi um dos esforços mais abrangentes — e, de certa forma, mais eficazes — para combater o flagelo das falsidades da internet. Quando sua repressão online ajudou a sufocar os esforços da extrema direita para anular a eleição do Brasil, acadêmicos e comentaristas se perguntaram se a nação havia encontrado uma solução possível para um dos problemas mais incômodos da democracia moderna”, avalia. 

Em seguida, entretanto, aponta o que pode ter se tornado um excesso: “desde então, conforme a temperatura política esfriou, o juiz Moraes continuou emitindo ordens judiciais para as redes sociais removerem contas. As ordens são secretas e não têm explicações sobre como uma determinada conta violou a lei, de acordo com cópias vazadas das ordens”, diz. Segundo o jornal, Moraes estabeleceu um estado de exceção permanente perigoso para a democracia.

O jornal britânico The Guardian tratou do caso por um viés mais favorável ao Brasil. Em um artigo que critica a ameaça das redes sociais à democracia no mundo, aponta que o país está à frente de uma ação para limitar o poder global dos bilionários como Musk.

“É a primeira vez que um país ocidental impõe tal proibição e o país de 200 milhões de pessoas é o quarto maior mercado de X. E embora os esforços de Musk para retratar isso como o trabalho de um “pseudo juiz não eleito” buscando destruir a liberdade de expressão para “fins políticos”, na verdade, isso se deve a outro conceito antiquado com o qual Musk não está familiarizado: o estado de direito”, diz.

Outros jornais também publicam sobre esse debate: o argentino Clarín, o espanhol El País e o português Público.

Para além da questão do bloqueio da rede social, a imprensa estrangeira também deu bastante atenção a temas ambientais relacionados ao Brasil, destacando o aumento de incêndios em diferentes biomas do país.

“Incêndios no Pantanal já destruíram este ano 15% do bioma brasileiro”, destacou o português Público.

“Brasil procura responsáveis ​​por incêndios gigantescos no estado de São Paulo”, diz o francês Le Monde. “Danos significativos foram observados em áreas agrícolas. Segundo as autoridades, mais de 90% destes incêndios na região são de origem humana”. O espanhol El País também aborda o acontecido no estado: “Pelo menos 46 cidades paulistas estão em alerta máximo para a cercania das lhamas”.

Retrospectiva 

Desde o início de abril de 2022, o iii-Brasil coletou e analisou em média 57 reportagens por semana com menções de destaque ao país nos sete veículos de imprensa analisados. 

Ao longo do levantamento, o iii-Brasil registrou em média 52% de reportagens de tom neutro, 29% de menções com tom negativo e 19% de textos positivos sobre o país. 


*Daniel Buarque é pesquisador no pós-doutorado do Instituto de Relações Internacionais da USP (ISI/USP), doutor em relações internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor de livros como Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial) e O Brazil é um país sério? (Pioneira). É editor-executivo do portal Interesse Nacional.

Fabiana Mariutti atua como pesquisadora, professora universitária e consultora; obteve pós-doutorado, doutorado e mestrado em Administração e bacharel em Comunicação Social. Estuda a imagem, reputação e marca Brasil desde 2010. Interesse nas áreas de Place Branding e Public Diplomacy. Nomeada Place Brand Expert pelo The Place Brand Observer, na Suíça. Autora do recente artigo: “When place brand and place logo matches: VRIO applied to Place Branding”, de dois livros e sete capítulos de livros. 

O Índice de Interesse Internacional (iii-Brasil) é uma análise da imagem do país realizada a partir de um levantamento sistemático de dados sobre notícias que mencionam o Brasil a cada semana em sete publicações internacionais, selecionadas como representativas da imprensa internacional por serem reconhecidas internacionalmente como “newspapers of record”. São elas: The Guardian (Reino Unido), The New York Times (Estados Unidos), El País (Espanha), Le Monde (França), Clarín (Argentina), Público (Portugal) e China Daily (China). O iii-Brasil é produzido semanalmente pela equipe do portal Interesse Nacional e pela pesquisadora Fabiana Mariutti. Professora universitária e consultora; obteve pós-doutorado, doutorado e mestrado em Administração e bacharel em Comunicação Social. Estuda a imagem, reputação e marca Brasil desde 2010. Interesse nas áreas de Place Branding e Public Diplomacy. Nomeada Place Brand Expert pelo The Place Brand Observer, na Suíça. Autora do recente artigo: “When place brand and place logo matches: VRIO applied to Place Branding”, de dois livros e sete capítulos de livros. 

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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