Como a China está mudando sua política externa para combater as tentativas de ‘contê-la’ por parte do Ocidente
China está sendo capaz de contornar as medidas norte-americanas que buscam, com seus aliados, restringir o avanço do país. Para professor, o governo chinês está adotando quatro respostas estratégicas e essenciais
China está sendo capaz de contornar as medidas norte-americanas que buscam, com seus aliados, restringir o avanço do país. Para professor, o governo chinês está adotando quatro respostas estratégicas e essenciais
Por Jingdong Yuan*
Na cúpula da Otan da semana do dia 9 de julho de 2023, os membros emitiram uma declaração final criticando as políticas coercitivas da China, que, segundo eles, desafiam os interesses, a segurança e os valores do bloco.
No entanto, os membros da Otan se comprometeram com um “envolvimento construtivo” com a superpotência em rápida ascensão.
Mesmo assim, Pequim reagiu fortemente à declaração. A China acusou a aliança de “difamar e mentir” sobre a nação e alertou contra os esforços de aproximação da Otan na região da Ásia-Pacífico.
O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Wang Wenbin, disse em termos diretos:
A Otan deve abandonar a mentalidade ultrapassada da Guerra Fria e a mentalidade de soma-zero, renunciar à sua fé cega no poderio militar e à prática equivocada de buscar segurança absoluta, interromper a tentativa perigosa de desestabilizar a Europa e a Ásia-Pacífico e parar de encontrar pretextos para sua expansão contínua.
Como os EUA estão desafiando a China
A forte reação da China reflete sua séria preocupação com os desafios globais que ela enfrenta. Esses desafios incluem:
- as crescentes redes de alianças e parcerias de segurança lideradas pelos EUA, como a Quad e a Aukus, que visam restringir, se não conter, a China
- as políticas dos Estados Unidos e da União Europeia de redução de riscos e diversificação de suas cadeias de suprimentos para reduzir sua dependência à China
- e regulamentos de controle das exportações mais restritivos que os EUA promulgaram sobre transferências ou trocas de alta tecnologia. O objetivo é impedir que a China adquira a capacidade de fabricar semicondutores e desacelerar seu avanço na computação quântica e na inteligência artificial.
Mesmo com a maior preocupação em relação a esses desafios, Pequim espera que essas redes de alianças e parcerias lideradas pelos Estados Unidos continuem sendo uma colcha de retalhos, dada a diversidade de interesses, prioridades e compromissos.
A China também mantém vantagens significativas devido aos seus estreitos laços econômicos com os aliados e parceiros dos Estados Unidos. Isso influenciará se os EUA conseguirão alcançar com sucesso no que Pequim acredita ser seu objetivo de conter a China.
A resposta estratégica da China
Os analistas questionaram se a China é inteligente e paciente o suficiente para conseguir aplicar uma estratégia de cunha para dividir os EUA e seus aliados, ou se seu julgamento errôneo e sua soberba podem fazer com que ela se torne excessivamente confiante e até mesmo arrogante.
De fato, a diplomacia de lobo guerreiro e as políticas assertivas de Pequim nos últimos anos só serviram para ajudar os EUA e seus aliados a se aproximarem mais para combater essas ações.
Pequim pode ter aprendido suas lições. Agora a China está adotando uma diplomacia mais proativa e confiante para combater o bloqueio dos Estados Unidos. Observei pelo menos quatro táticas no que diz respeito a essa mudança de política externa.
1) A China está se concentrando na região e se baseando em seus pontos fortes
Pequim reconhece que deve concentrar suas energias diplomáticas na Ásia, dada sua importância para os interesses econômicos e de segurança da China.
O país está aprofundando seus laços econômicos com a Asean, o bloco regional de 10 nações, além de estar apoiando a centralidade da Asean nas estruturas de segurança da região. O grupo do Sudeste Asiático teme ser arrastado para um conflito entre os EUA e a China e ser forçado a escolher um lado. Também teme que iniciativas lideradas pelos Estados Unidos, como o Quad, possam diminuir seu papel na região.
Ao mesmo tempo, a China tem sido ativa na promoção da Parceria Econômica Regional Abrangente patrocinada pela Asean. O país acredita que esse grupo oferece uma abordagem mais inclusiva e colaborativa para a cooperação econômica regional. O grupo inclui os membros da Asean, a China e vários aliados dos EUA, como a Coreia do Sul, o Japão e a Austrália.
Pequim o considera uma alternativa atraente para a Estrutura Econômica do Indo-Pacífico para a Prosperidade, patrocinada pelos EUA. Esse grupo, que inclui 14 países da região, assinou no mês passado um acordo para tornar suas cadeias de suprimentos mais resistentes.
2) Pequim está impulsionando seus esforços diplomáticos na Europa
Desde que suspendeu suas restrições de fronteira devido à COVID-19, Pequim recebeu líderes mundiais, hospedou grupos empresariais e promoveu oportunidades de comércio e investimento na China.
A Europa, em particular, tem sido o foco da diplomacia recente de Pequim. Desde que assumiu o cargo, a primeira grande viagem internacional do primeiro-ministro Li Qiang foi para a Alemanha e a França no mês de junho, onde ele enfatizou as oportunidades econômicas em detrimento das diferenças geopolíticas e a parceria em detrimento da rivalidade.
Líderes europeus, como o presidente francês Emmanuel Macron, o primeiro-ministro espanhol Pedro Sánchez e o chanceler alemão Olaf Scholz, também se tornaram figuras regulares em Pequim.
Esses esforços estão permitindo que a China aprofunde seus laços econômicos com a Europa. Com isso, Pequim espera enfraquecer os projetos dos EUA que visam desenvolver uma abordagem transatlântica em relação à China, incluindo políticas de redução de riscos ou desvinculação de suas economias da China.
3) A China está ao lado da Rússia – por enquanto
Pequim provavelmente está irritada, se não desanimada, com o fiasco que a guerra da Rússia na Ucrânia se tornou. No entanto, ela está determinada a não abandonar o presidente russo Vladimir Putin.
Do fornecimento de energia à cooperação em tecnologia militar, a Rússia continua sendo um parceiro estratégico e vital para a China. A última coisa que a China quer é uma Rússia dizimada, deixando-a sozinha para enfrentar os EUA com suas redes de alianças e grupos de segurança. A China também não gostaria de lidar com possíveis ameaças da Rússia, dada a longa fronteira que compartilham.
Pequim tem se apresentado cuidadosamente, se não de forma convincente, como um espectador neutro no conflito, interessado em encerrá-lo. A China também está tirando proveito da posição precária da Rússia, expandindo e consolidando sua influência na Ásia Central, ao mesmo tempo em que respeita os laços tradicionais da Rússia com a região.
4) A China está se promovendo como líder global
Por fim, a China se tornou mais confiante e ativa na promoção de seus modelos de governança global em segurança, desenvolvimento e construção de comunidades.
Alguns esforços ainda estão em fase de elaboração, como a Iniciativa de Segurança Global, enquanto outros são mais concretos. Por exemplo, Pequim se vê como um mediador global após seu sucesso na intermediação de uma trégua entre a Arábia Saudita e o Irã em março.
Pequim também continua a promover suas instituições multilaterais preferidas, desde a Organização de Cooperação de Xangai até o grupo BRICS, que atualmente inclui China, Brasil, Rússia, África do Sul e Índia. O governo chinês acolheu com satisfação a expansão do grupo.
Juntamente com sua ambiciosa e controversa Iniciativa Cinturão e Rota, Pequim acredita que pode oferecer uma alternativa aos grupos liderados pelos EUA, como o Quad. Ao depender de instituições dessa forma, a China pode promover seus interesses globalmente e, ao mesmo tempo, evitar o confronto direto com os Estados Unidos.
*Jingdong Yuan é professor de segurança da Ásia-Pacífico na University of Sydney
Este texto é uma republicação do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original, em inglês.
Tradução de Letícia Miranda
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional
Este texto é uma republicação do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original em https://theconversation.com/br
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