Com Plano Amazônia, Lula renova aposta na diplomacia ambiental e tenta criar uma marca para seu terceiro mandato
Criticado por repetir políticas do passado, o governo usa a meta de acabar com o desmatamento como novidade na sua política externa. Apesar de ser uma jogada inteligente para renovar o otimismo internacional com o país, promessa vai gerar cobranças por resultados e pode definir o legado do presidente
Criticado por repetir políticas do passado, o governo usa a meta de acabar com o desmatamento como novidade na sua política externa. Apesar de ser uma jogada inteligente para renovar o otimismo internacional com o país, promessa vai gerar cobranças por resultados e pode definir o legado do presidente
Por Daniel Buarque*
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva reagiu com uma grande jogada à onda de péssimas notícias sobre o país no exterior por conta do primeiro ano da morte de Dom Phillips e Bruno Araújo Pereira e das mudanças na estrutura dos seus ministérios. Enquanto parecia que havia acabado a lua de mel do mundo com o presidente e alguns dos principais jornais do exterior se debruçavam sobre a violência e a destruição da Amazônia, com críticas às muitas promessas com pouca ação desde o início do ano, Lula anunciou oficialmente um plano para ampliar a proteção da floresta e dar fim ao desmatamento até 2030.
O anúncio foi inteligente e feito em um bom momento. Ele vem para tentar renovar a esperança criada pelo mundo em torno da nova administração do Brasil desde a derrota de Bolsonaro nas eleições do ano passado. Durante os quatro anos do governo de extrema-direita, o Brasil viu seu prestígio desmoronar em grande parte por conta da questão ambiental. E também foi esta área que ajudou a projetar positivamente o país desde que Lula foi eleito. Apesar disso, o tom da percepção externa parecia começar a mudar enquanto o presidente se aproxima de completar seis meses no poder e permite o esvaziamento da pasta do Meio Ambiente.
Com o Plano Amazônia, Lula renova a aposta de usar a diplomacia ambiental como ferramenta para projeção do Brasil no mundo. Além de ir contra a percepção de que estava reduzindo seu empenho na área e de demonstrar um rompimento mais efetivo com a política do seu antecessor, o presidente também usa a postura de luta contra o aquecimento global como uma marca do seu terceiro mandato. Ele tenta romper com a ideia de repetição do passado e busca diferenciar a política externa do seu governo atual do anterior, entre 2003 e 2010.
Essa tentativa é particularmente relevante no contexto das avaliações gerais sobre os primeiros meses do governo. De forma crítica, muitos analistas têm apontado para a falta de novidades e a excessiva repetição de políticas já usadas no passado ou mesmo ultrapassadas.
“O que caracteriza o terceiro mandato de Lula é uma repetição, uma reprise do que já houve no passado”, disse o diplomata e ex-ministro Rubens Ricupero em entrevista. Segundo ele, por mais que o próprio Lula tenha mudado desde 2010 e o mundo também tenha passado por transformações desde então, a tendência em muitas áreas parecia ser de o governo agir como sempre agiu, com uma política de repetição. E a estratégia ambiental de agora ajuda a romper isso.
“Na política externa atual há uma novidade, que é o engajamento mais claro com a mudança climática e a luta contra o aquecimento global. Lula e Celso Amorim não tinham tanta sensibilidade para isso nos primeiros mandatos. Isso não é uma continuidade em relação aos governos anteriores. Ele parece de fato estar consciente do problema e querer agir contra ele”, disse.
Essa postura ambiental é uma peça-chave na “Doutrina Lula”, que é a busca por prestígio e pela tão falada “volta” do país ao mundo, explicou Ricupero. “Isso é importante para o acolhimento favorável que ele está recebendo no exterior”, disse.
Apesar de ser um passo na direção certa, e de o anúncio já ter ampla repercussão na imprensa internacional, ele ainda não foi suficiente para renovar totalmente a empolgação inicial com a volta de Lula ao poder. O problema é que há uma preocupação geral com a capacidade do governo de entregar resultados reais dessa mobilização pela proteção ambiental.
Como explicou o professor Robert Toovey Walker em sua coluna na Interesse Nacional, grandes promessas carregam altos riscos, e a frustração da meta de acabar com o desmatamento pode gerar uma cobrança grande sobre o governo, que pode abalar a tentativa de projeção internacional do Brasil. Isso já ficou evidente na cobrança externa em relação às recentes mudanças no Ministério do Meio Ambiente.
De qualquer forma, a aposta faz muito sentido. Enquanto o governo perde tempo e gasta energia buscando fazer o Brasil ser aceito como um negociador pelo fim da guerra na Ucrânia, e enquanto o presidente dá tiros no pé em declarações de apoio exageradas à Venezuela, voltar a dar prioridade à agenda ambiental deve ser aplaudido como um passo no rumo certo. Além de ser uma marca do governo, é claramente o melhor caminho para que o país consiga ter protagonismo internacional.
*Daniel Buarque é colunista e editor-executivo do portal Interesse Nacional, pesquisador do pós-doutorado do Instituto de Relações Internacionais da USP e doutor em relações internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. É jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor dos livros “Brazil, um país do presente” (Alameda) e “O Brazil É um País Sério?” (Pioneira).
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional
Editor-executivo do portal Interesse Nacional. Jornalista e doutor em Relações Internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Mestre pelo KCL e autor dos livros Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial), O Brazil é um país sério? (Pioneira) e O Brasil voltou? (Pioneira)
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