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Interesse Nacional
26 julho 2024

O acordo entre facções palestinas e a geopolítica do Oriente Médio

China patrocinou negociações para reaparecimento da Organização da Liberação da Palestina em mais um indício do seu interesse em ser um peso pesado na política da região

Assinatura de acordo entre facções palestinas negociado pela China (Foto: Xinhua)

Nas últimas semanas, os acontecimentos no cenário internacional se aceleraram dramaticamente, como ocorreu na eleição nos EUA (atentado, convenção republicana, substituição de Joe Biden por Kamala Harris), na França (crescimento da direita), no Reino Unido (derrota do Partido Conservador e a posse do premiê trabalhista), na Índia (reeleição do primeiro-ministro Narendra Modi, sem maioria no Parlamento).

Nesta semana, o Oriente Médio voltou a ser o foco da atenção global. O premiê de Israel Benjamin Netanyahu discursou no Congresso dos EUA, e as facções rivais palestinas, Hamas e Fatah, assinaram um acordo, colocando um ponto final na divisão entre eles, com o objetivo de fortalecer a unidade e a força da Autoridade Palestina.

O anúncio do acordo foi feito ao final de conversações patrocinadas pela China envolvendo 14 facções palestinas. O principal resultado das conversações foi reaparecimento da Organização da Liberação da Palestina (PLO) como o legítimo representante do povo palestino para o estabelecimento de um governo provisório de reconciliação nacional. 

‘O acordo não estabelece um prazo para a formação do novo governo em Ramallah e, com isso, permanece a incerteza’

Até aqui, depois da disputa de poder que se arrasta a 17 anos, o Fatah é quem controla politicamente a Autoridade Palestina. O acordo não estabelece um prazo para a formação do novo governo em Ramallah e, com isso, permanece a incerteza quanto a sua concretização. 

A superação das rivalidades e disputas entre os diferentes grupos políticos e militares palestinos foi alcançada certamente com a ideia de reforçar a Autoridade Palestina com vistas a organizar a governança em Gaza e na Cisjordânia, depois que Israel colocar um ponto final na guerra, e, caso desocupe o território no estreito de Gaza. 

Essas conversas ocorreram mesmo quando se sabe que Israel tem uma posição muito clara sobre a eliminação do Hamas, em resposta aos ataques do grupo ao território israelense em 7 de outubro, e que já havia declarado publicamente que não aceitaria que o Hamas pudesse ter qualquer papel na governança do território de Gaza. 

‘O acordo não deve ter qualquer impacto nas negociações em curso para o fim das hostilidades e para um cessar fogo em Gaza’

Israel reagiu logo em seguida ao anúncio do acordo, reiterando que “o desejo do Hamas de voltar a governar Gaza não ocorrerá porque o poder do Hamas será esmagado”. O acordo não deve ter qualquer impacto nas negociações em curso para o fim das hostilidades e para um cessar fogo.

No discurso no Capitólio, Netanyahu manteve suas posições radicais, agradeceu o apoio dos EUA e reafirmou as posições de Israel contra o Hamas. Contrariando a política dos EUA no tocante aos dois Estados, disse que a capital, Jerusalém, jamais será dividida. Kamala Harris não compareceu para presidir a sessão do Senado, um grupo de representantes democratas da Câmara e do Senado também não compareceu e houve demonstrações violentas contra a presença do primeiro-ministro no Congresso americano.

A posição dos EUA é muito clara em respaldo à posição de Israel no sentido de que não apoia qualquer papel do Hamas, considerada uma organização terrorista, na governança futura de Gaza, o que também foi reiterado depois do anúncio do acordo. O porta voz do Departamento de Estado reafirmou a politica da criação do Estado Palestino e que os EUA querem ver a Autoridade Palestina (não o Hamas) governando um território unificado de Gaza e da Cisjordânia depois da guerra

‘No xadrez geopolítico do Oriente Médio, a China tem procurado apresentar-se com um potencial pacificador no conflito’

No xadrez geopolítico do Oriente Médio, a China tem procurado apresentar-se com um potencial pacificador no conflito. As pretensões da China de surgir como uma potência na região em que os EUA têm sido o poder dominante há muito tempo têm sido demonstradas por várias ações políticas, inclusive a de março passado, quando teve participação fundamental na aproximação entre os tradicionais rivais da Arábia Saudita e o Irã. 

Xi Jinping, em maio passado, também propôs a realização de uma conferência internacional para promover a paz na região durante encontros com líderes árabes e enviou um enviado especial para o Oriente Médio para reuniões com altos funcionários dos países da região. A reaproximação do Fatah com o Hamas pode ser vista como mais uma vitória da China e como parte relevante da política de Pequim para se colocar como um peso pesado geopolítico com uma visão diferente do mundo (em relação aos EUA)

Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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