Proposta de paz para a guerra em Gaza
A proposta para o fim gradual das hostilidades é de difícil aceitação pelos dois lados pelos inúmeros e importantes detalhes que terão de ser negociados antes da sua aceitação. De qualquer forma, a aparente pressão do governo Biden poderá ser um fator relevante para ambos os lados poderem encontrar alguma fórmula que permita avançar.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou um plano para colocar um fim no conflito em Gaza como se fosse uma proposta elaborada por Israel. A iniciativa de Biden tem ligação direta com as eleições presidenciais de novembro próximo nos EUA e está relacionada com a reação negativa dos jovens e da ala à esquerda do Partido Democrata ao apoio irrestrito do governo norte-americano a Israel e pela maneira como os palestinos estão sendo tratados do ponto de vista humanitário.
O plano anunciado tem três fases:
Na primeira, ocorreria o cessar-fogo de seis semanas, a retirada das forças de Israel das áreas mais populosas de Gaza, a devolução de alguns reféns, a volta dos palestinos para suas casas e o aumento significativo da ajuda humanitária.
Na segunda, cessar-fogo permanente, retirada das tropas de Israel de Gaza, troca de todos os reféns.
Na terceira, elaboração de plano de reconstrução de Gaza e final troca dos corpos dos reféns mortos a seus familiares.
Os EUA, o Egito e países europeus pediram que o Hamas aceite o plano. A reação do Hamas, talvez antecipando a negativa de Israel, não foi contrária. Em nota, disse que recebeu a proposta “positivamente”, mas que não se envolveria em negociações enquanto as ações militares israelense continuassem na Faixa de Gaza.
O primeiro-ministro Netanyahu reagiu, como porta-voz dos partidos de extrema-direita, afirmando que não abre mão de eliminar a capacidade militar e de governar do Hamas, da liberação de todos os reféns e da garantia de que Gaza não represente uma ameaça para Israel, antes de suspender o conflito. As condições para acabar com o conflito, portanto, não mudaram.
Analisando a proposta em detalhe, no fim da segunda fase, haveria um permanente fim das hostilidades e a retirada das tropas israelenses de Gaza, condição essencial para o Hamas, com o que Israel não concorda, segundo pronunciamento do premiê israelense.
O plano não menciona a questão da ocupação por colonos israelenses de partes importantes da Cisjordania, o que está relacionado com a criação do Estado Palestino. A proposta norte-americana não se refere às operações militares em Rafah, nem ao day after ao permanente fim das hostilidades, isto é, a fase politica, com a negociação para a criação do Estado Palestino, até aqui inaceitável para Israel (a dar credito que a proposta é, de fato, israelense, explica-se a ausência de referência ao Estado Palestino), outra condição essencial para os palestinos.
Além de forte pressão da opinião pública internacional e nos EUA, o governo de Washington teve de enfrentar demissões de altos funcionários do Departamento de Estado por não concordarem com a maneira como os EUA estão conduzindo sua política externa em relação a Israel, inclusive com acusação de falsificação de documentos internos.
Do lado de Israel, continua a pressão interna sobre Netanyahu para por fim ao conflito e para convocar eleições gerais. Biden chegou a insinuar que Netanyahu teria interesse em prolongar a guerra para manter-se como primeiro-ministro.
A proposta para o fim gradual das hostilidades é de difícil aceitação pelos dois lados pelos inúmeros e importantes detalhes que terão de ser negociados antes da sua aceitação. De qualquer forma, a aparente pressão do governo Biden poderá ser um fator relevante para ambos os lados poderem encontrar alguma fórmula que permita avançar.
Nos últimos dias, a situação se agravou com os ataques do Hezbollah no norte de Israel e com a ameaça de Israel de escalar o conflito com ofensiva em larga escala no Líbano. A retirada das tropas do Hezbollah da fronteira e negociações sobre pontos fronteiriços disputados dependem de avanços nos entendimentos para garantir um cessar-fogo na faixa de Gaza.
Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.
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