23 maio 2024

Sinal verde para o Brasil – Como a diplomacia ambiental pode impulsionar o prestígio do país

Pesquisa indica que a política ambiental do Brasil, e especialmente a proteção da Floresta Amazônica, é um ponto fundamental da forma como o país é visto no exterior, com grande influência sobre a sua imagem internacional e o seu nível de prestígio na política global

Comitiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante trajeto de barco em comunidade ribeirinha da Ilha do Combu, em Belém (Foto: Rubens Gallerani Filho / Audiovisual / PR)

A política ambiental do Brasil, e especialmente a proteção da Floresta Amazônica, é um ponto fundamental da forma como o país é visto no exterior, com grande influência sobre a sua imagem internacional e o seu nível de prestígio na política global. Uma boa ação nesta área e o trabalho competente de uma diplomacia ambiental bem estruturada podem se constituir uma importante ferramenta para o Brasil na busca pela ampliação do seu status internacional. 

Esta é uma das principais conclusões de um estudo sobre a relação entre a questão ambiental e a busca brasileira por um lugar de destaque na hierarquia de poder no mundo. No artigo Sinal verde: percepções sobre política ambiental e status do Brasil, publicado neste mês pela Revista do Cebri (editada pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais), foram discutidos dados levantados durantes a minha pesquisa de doutorado pelo King’s College London (em parceria com a USP), a respeito da influência da questão ambiental na construção do prestígio do país.

‘A política ambiental é uma ferramenta importante para o status do país. Ela ajudou a impulsionar o Brasil como ator relevante no mundo entre os anos 1990 e 2010’

O texto argumenta que a busca por status internacional é uma característica histórica da política externa brasileira. Entre as estratégias para projetar o país no exterior, a política ambiental é uma ferramenta importante. Ela ajudou a impulsionar o Brasil como ator relevante no mundo entre os anos 1990 e 2010. Entretanto, a destruição da Amazônia tornou-se símbolo do isolamento brasileiro sob Bolsonaro. E o governo de Luiz Inácio Lula da Silva tem apostado nessa área para tentar reconstruir uma liderança brasileira no mundo. Os holofotes sobre o tema se destacaram também nas últimas semanas, quando a tragédia das inundações no Rio Grande do Sul foram vistas no exterior como um alerta para todo o mundo.

Baseado em teorias de status em relações internacionais, o estudo parte da análise de entrevistas com a comunidade de política externa das grandes potências e revela a percepção externa de que a liderança ambiental pode ajudar o Brasil a conquistar um papel importante na política mundial.

Segundo essa análise, os temas ligados ao ambiente estão entre as impressões mais importantes que estrangeiros têm a respeito do país. Isso é especialmente evidente por conta da percepção externa sobre a presença da maior parte da Floresta Amazônica no território nacional e pelo papel de negociador de peso em fóruns internacionais de debate sobre políticas contra o aquecimento global, desempenhado por décadas. 

‘A política ambiental é vista como especialmente relevante por ser um diferencial do país em relação a outros Estados que podem buscar ampliar seu prestígio’

Dessa forma, a política ambiental é vista como um dos possíveis focos a serem adotados pelo Brasil na tentativa de atingir um status mais alto. E é especialmente relevante por ser um diferencial do país em relação a outros Estados que podem buscar ampliar seu prestígio. Por conta da Amazônia e de outras das suas riquezas naturais, o país tem uma vantagem comparativa ao usar a questão ambiental e a luta contra o aquecimento global como estratégia para buscar mais prestígio no mundo. 

Elevação de status

O estudo mais amplo sobre o nível de prestígio do país no mundo apontou o desenvolvimento de poder econômico como o principal caminho através do qual o Brasil pode ampliar seu status e buscar se tornar uma potência global. Mesmo assim, a pesquisa também apontou que o país pode pode trabalhar para construir prestígio aos poucos e de forma gradual um histórico de importância internacional focando em questões que estejam ao alcance de um país que não é uma grande potência.

Entre estas alternativas, a questão ambiental se destaca. Ela serviria para estabelecer o país como um ator importante para ajudar a resolver assuntos do cenário internacional e trabalhar em temas regionais e multilaterais que podem se beneficiar da participação de países menos poderosos para aumentar gradativamente o seu nível de prestígio. A análise dos dados coletados em entrevistas indica que, mesmo que isso não seja suficiente para catapultar um país para um status elevado, esse caminho poderia ajudar a estabelecer uma presença importante como um ator global, construindo lentamente uma influência que, juntamente com outras fontes de prestígio, pode ajudar a aumentar o status. 

‘Entre as fontes ouvidas nessa pesquisa que trataram da questão ambiental, a posição a respeito da sua importância para o papel que o Brasil busca ter na política internacional foi unânime’

Entre as fontes ouvidas nessa pesquisa que trataram da questão ambiental, a posição a respeito da sua importância para o papel que o Brasil busca ter na política internacional foi unânime. Apesar de serem vozes de áreas e países variados, todos os que mencionaram o ambiente defenderam o seu valor para o país. 

De acordo com um professor da universidade francesa Sciences Po, consultor de temas relacionados ao Brasil na França, “o Brasil é uma potência ambiental”. Segundo ele, isso acontece especialmente por causa da presença da maior parte da Floresta Amazônica em território brasileiro. 

Um pesquisador do think tank britânico Canning House argumentou que a questão ambiental é a melhor forma pela qual o Brasil pode se projetar internacionalmente como um país importante. “Todo mundo pensa no meio ambiente e na Amazônia quando pensa no Brasil, então essa é uma área relativamente fácil”, disse. Esta é uma visão que reforça a ideia de que o ambiente pode ser um diferencial do Brasil na busca por status, algo que nem todos os países têm. 

Segundo uma jornalista que trabalhou na Xinhua, agência estatal chinesa de notícias, por exemplo, a questão ambiental é reconhecida na China. “Os chineses viam isso como maior ativo do Brasil no palco internacional”, explicou.

Uma professora da universidade estatal de São Petersburgo explicou que, na Rússia, é comum se discutir a importância ambiental do Brasil: “Ouvi muito sobre o Brasil ser um dos pioneiros na política ambiental, por exemplo. O Brasil cuidou das questões relacionadas às mudanças climáticas”, disse. 

Um pesquisador na universidade de Oxford, no Reino Unido, expôs a relevância da questão ambiental como estratégia para promoção do país ao avaliar que o Brasil precisa ser pensado não apenas como um país, mas como um continente, pois tem uma responsabilidade, é guardião da Amazônia, e não pode ser comparado com outros países da América Latina. “Isso é muito relevante em termos de o Brasil ter voz e contribuição em coisas como mudanças climáticas. O que é desproporcional. (…) Um bom Brasil pode desempenhar um papel construtivo”, disse.

Conforme apresentado no estudo, entender essa percepção externa sobre possíveis caminhos para aumentar o status do país e a importância da política ambiental é fundamental para a construção de um projeto de política externa que tenha como objetivo alcançar este interesse histórico do país de ter mais prestígio. Isso porque, como visto, status é intersubjetivo e depende do reconhecimento de atores externos para se consolidar. Para conseguir alcançar este reconhecimento, portanto, seria preciso convencer esta comunidade internacional da importância do Brasil para o mundo, e o ambiente é um caminho que já está bem desenhado neste sentido.

Editor-executivo do portal Interesse Nacional. Jornalista e doutor em Relações Internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Mestre pelo KCL e autor dos livros Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial), O Brazil é um país sério? (Pioneira) e O Brasil voltou? (Pioneira)

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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