Daniel Buarque: Primeiro ano do governo Lula alcançou mais avanço em poder bruto do que em soft power
Estudos divulgados recentemente mostram aumento de gastos militares, evolução em rankings de poder e melhora da economia nacional em índices globais, enquanto pesquisas de imagem revelam dificuldades do país em ter reconhecimento por sua reputação
Estudos divulgados recentemente mostram aumento de gastos militares, evolução em rankings de poder e melhora da economia nacional em índices globais, enquanto pesquisas de imagem revelam dificuldades do país em ter reconhecimento por sua reputação
Por Daniel Buarque*
O primeiro ano da política externa do atual mandato de Luiz Inácio Lula da Silva aparenta ter levado o Brasil a alcançar resultados mais relevantes em termos de poder bruto do que em sua tradicional atuação de soft power. Apesar de o apelo internacional do país costumar aparecer como mais ligado a aspectos do poder brando, como sua imagem e simpatia, dados divulgados nos últimos meses indicam que o país está mais bem posicionado em termos de hard power, especialmente do ponto de vista militar.
O Brasil subiu de 15º para 14º no ranking de países com maior gasto militar do mundo neste ano, por exemplo. O dado faz parte do Military Balance e foi divulgado nesta semana com base em levantamento global do International Institute for Strategic Studies (IISS), responsável por um anuário sobre o estado das Forças Armadas do planeta. O estudo aponta que o gasto militar global disparou em 2023 e atingiu o maior patamar da história moderna – sem contar as duas guerras mundiais. E o Brasil avançou no mesmo sentido.
Ao mesmo tempo, o país apareceu em outro ranking como tendo a 17ª maior força aérea do mundo e a maior da América Latina. A lista foi feita pelo site internacional Global Fire Power, e classifica a força total da frota de aeronaves por país. O Brasil aparece com 628 aeronaves – à frente mesmo de nações como Alemanha e Israel.
Deixando de lado questões militares e passando a avaliar o potencial econômico do país, em dezembro de 2023 a projeção de crescimento do PIB brasileiro pelo Fundo Monetário Internacional indicou que o Brasil subiria duas posições e ficaria em 9º lugar no ranking de maiores economias do mundo. Trata-se de um processo de recuperação importante e que também indica avanço do poder do país.
Enquanto figura entre os 20 maiores em termos de medidas de poder bruto, os índices de soft power do país ainda não conseguiram se recuperar da perda de prestígio do país registrada desde meados da década passada. Até 2017, o Brasil aparecia regularmente também entre os 20 países mais admirados do mundo, conseguindo um estoque relevante de reconhecimento por sua importância.
A edição mais recente de um dos mais respeitados índices dedicados a avaliar as imagens de diferentes países, o Nation Brands Index (NBI), classifica o Brasil apenas na 27ª colocação no ranking de nações mais admiradas do mundo. Trata-se da mesma classificação registrada em 2022, bem pior do que a posição do país nos índices de poder militar e econômico.
Esses dados divulgados recentemente reforçam a avaliação já apresentada pelo diplomata brasileiro Hayle Melim Gadelha (colunista da Interesse Nacional). Para ele, dados têm revelado historicamente que o Brasil na verdade tem mais potência em medidas tradicionais de poder do que em avaliações de imagem e reputação. “Nós crescemos com essa ideia de que o Brasil é um país especialmente simpático, por sua alegria, por sua criatividade, e o que eu quero chamar atenção é que nós fazemos isso sem ter nenhuma evidência que aponte para isso. Pelo contrário, quando nós vamos atrás de evidências, percebemos que, ao invés de ter um soft power mais alto que o nosso hard power, acontece o oposto”, explicou Gadelha. “Nós somos uma potência em vários desses recursos tradicionais de poder, enquanto que os rankings que avaliam o soft power, a reputação do país, vão na direção oposta. A gente sequer se encontra entre os vinte principais”, disse.
Apesar da insistência na crença nacional da importância do soft power do Brasil, minha pesquisa sobre o status internacional do país e sua busca por mais prestígio indica que a aposta em poder bruto pode fazer sentido. As grandes potências não costumam reconhecer a relevância do poder brando, e indicam que uma abordagem mais realista das relações internacionais impulsionam uma percepção de que o caminho para buscar status passa pela consolidação de poder militar e, especialmente, econômico.
*Daniel Buarque é colunista e editor-executivo do portal Interesse Nacional, pesquisador no pós-doutorado do Instituto de Relações Internacionais da USP (IRI/USP), doutor em relações internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor de livros como Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial) e O Brazil é um país sério? (Pioneira).
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Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional
Editor-executivo do portal Interesse Nacional. Jornalista e doutor em Relações Internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Mestre pelo KCL e autor dos livros Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial), O Brazil é um país sério? (Pioneira) e O Brasil voltou? (Pioneira)
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