iii-Brasil: Ataques a Brasília levam a recorde de visibilidade e de cobertura negativa sobre o Brasil na mídia estrangeira
Volume de menções ao país na imprensa internacional foi quase quatro vezes maior do que a média registrada nos últimos meses, e três de cada quatro matérias sobre o país após a mobilização golpista tinha tom negativo, com potencial de piorar a imagem do país no exterior
Volume de menções ao país na imprensa internacional foi quase quatro vezes maior do que a média registrada nos últimos meses, e três de cada quatro matérias sobre o país após a mobilização golpista tinha tom negativo, com potencial de piorar a imagem do país no exterior
Por Daniel Buarque e Fabiana Mariutti*
iii-Brasil – de 9 a 15 de janeiro de 2023
Visibilidade: 263 reportagens em 7 veículos analisados
Classificação das notícias:
12% Neutras
75% Negativas
13% Positivas
A imagem do Brasil projetada na imprensa internacional chegou a seu pior momento na segunda semana de janeiro. A cobertura da mídia estrangeira sobre os ataques violentos e golpistas à sede dos Três Poderes da República em Brasília, no domingo (dia 8), ampliou a visibilidade do país no exterior com um enquadramento bastante problemático sobre a fragilidade da democracia, a violência dos golpistas e a instabilidade da política brasileira.
No total, foram registrados na semana 263 textos com menção ao Brasil nos sete veículos analisados. Esta foi a semana com maior volume de publicações sobre o país desde o início do levantamento do Índice de Interesse Internacional (iii-Brasil), em abril de 2022.
Até este começo de janeiro, as semanas que haviam registrado maior visibilidade do país tinham sido marcadas pela cobertura do segundo turno das eleições, no final de outubro e início de novembro, quando foram registradas 169 e161 menções ao país, respectivamente. Os ataques a Brasília levaram a um aumento de 55% em relação ao recorde anterior. O volume de matérias registradas na última semana foi quase quatro vezes a média registrada semanalmente até então.
Além da grande visibilidade dos atos antidemocráticos na capital do país, a maior parte dos textos sobre o país na última semana tinha tom negativo (75%), com potencial de piorar a imagem internacional do Brasil. Além disso, o período desta semana registrou ainda 12% de menções neutras e 13% de textos com tom positivo.
O enquadramento negativo usado pela imprensa internacional ao tratar dos ataques não deram muita margem para interpretação diferente. Mesmo notícias com abordagem factual expuseram de forma dramática os problemas vividos pelo Brasil e foram classificadas como negativa na avaliação do Índice. A não ser raras reportagens e análises sobre uma possível força e resiliência da democracia e do estado de direito, todas as menções ao caso foram avaliadas como negativas.
Trata-se da maior proporção de menções negativas ao país desde o início do levantamento. Até a tentativa de golpe de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, a maior proporção de exposição negativa do país havia sido registrada em junho, quando o jornalista britânico Dom Phillips e o indigenista Bruno Araújo Pereira foram assassinados na Amazônia.
Esse impacto negativo do ataque a Brasília já havia ficado evidente no relatório da semana anterior, quando foram coletadas e analisadas as notícias publicadas até o domingo que ficou marcado pelo golpismo. Naquele dia, os sete veículos analisados pelo iii-Brasil publicaram 36 matérias sobre os ataques em Brasília, o equivalente a 27% de todas as reportagens coletadas pelo levantamento durante a semana. Ao longo da semana que se seguiu à destruição registrada na capital, entretanto, o foco da imprensa se voltou quase totalmente a este caso, e mais de 200 matérias foram publicadas só sobre este caso na semana que começou no dia 9.
Além de reportagens descrevendo o que aconteceu no país, galerias de imagens e vídeos, quase todos os veículos estrangeiros analisados publicaram análises, entrevistas, comentários e editoriais sobre a situação política e social do Brasil.
O jornal americano The New York Times, por exemplo, publicou três artigos de opinião discutindo a situação do Brasil. Um dos focos da cobertura foram comparações entre os ataques no Brasil e a insurreição trumpista que levou à invasão do Capitólio, nos EUA, dois anos antes.
Em editorial, o diário britânico The Guardian chama a extrema-direita de “um perigo claro e real” no Brasil, criticando a postura do ex-presidente Bolsonaro desde a eleição. O francês Le Monde também publicou editorial sobre a situação do Brasil. Para o jornal, a invasão do congresso do STF e do Planalto “ilustra a pretensão dos populistas de se arrogar o direito de falar em nome do povo e sua incapacidade de respeitar as regras democráticas”.
Até mesmo o China Daily, publicação que costuma dedicar menos espaço para a cobertura de temas políticos do Brasil, se debruçou sobre os ataques em Brasília. O jornal aproveitou para criticar a influência dos Estados Unidos na política da América Latina, também ressaltando as semelhanças entre o caso brasileiro e a insurreição trumpista nos EUA.
No português Público prevaleceram, com tom negativo, tanto notícias como vários textos de opinião sobre a invasão agressiva e apreensão dos criminosos e destruição de artefatos históricos e artísticos. um texto retrata as intenções organizadas para uma intervenção militar pelo grupo bolsonarista.
Na semana do espanhol El País, publicações com enquadramento desfavorável à imagem do país também são maioria. Em um texto descritivo com uma foto de uma criança causa impacto ao constatar o tamanho da calamidade extremista, golpista e antidemocrática no domingo dia 8 de janeiro.
O argentino Clarín também enfatiza o ataque à democracia com notícias de tom negativo, ao abordar roubos, além dos estragos aos bens públicos.
Retrospectiva
Desde o início de abril de 2022, o iii-Brasil coletou e analisou em média 74 reportagens por semana com menções de destaque ao país nos sete veículos de imprensa analisados.
Ao longo do levantamento das últimas 41 semanas, o iii-Brasil registrou em média 49% de reportagens de tom neutro, 36% de menções com tom negativo e 15% de textos positivos sobre o país.
*Daniel Buarque é editor-executivo do Interesse Nacional, doutor em relações internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. É jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor dos livros “Brazil, um país do presente” (Alameda) e “O Brazil É um País Sério?” (Pioneira).
Fabiana Mariutti atua como pesquisadora, professora universitária, e consultora; obteve pós-doutorado, doutorado e mestrado em Administração e bacharel em Comunicação Social. Estuda a imagem, reputação e marca Brasil desde 2010. Autora dos livros: “Country Reputation: The Case of Brazil in the United Kingdom: Four Stakeholders’ Perspectives on Brazil’s Brand Image” (2017) e “Country Brand Identity: Communication of the Brazil Brand in the United States of America” (2013).
O Índice de Interesse Internacional (iii-Brasil) é uma análise da imagem do país realizada a partir de um levantamento sistemático de dados sobre notícias que mencionam o Brasil a cada semana em sete publicações internacionais, selecionadas como representativas da imprensa internacional por serem reconhecidas internacionalmente como “newspapers of record”. São elas: The Guardian (Reino Unido), The New York Times (Estados Unidos), El País (Espanha), Le Monde (França), Clarín (Argentina), Público (Portugal) e China Daily (China). O iii-Brasil é produzido semanalmente pela equipe do portal Interesse Nacional e pela pesquisadora Fabiana Mariutti. Professora universitária e consultora; obteve pós-doutorado, doutorado e mestrado em Administração e bacharel em Comunicação Social. Estuda a imagem, reputação e marca Brasil desde 2010. Interesse nas áreas de Place Branding e Public Diplomacy. Nomeada Place Brand Expert pelo The Place Brand Observer, na Suíça. Autora do recente artigo: “When place brand and place logo matches: VRIO applied to Place Branding”, de dois livros e sete capítulos de livros.
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional