25 outubro 2024

Plano da Ucrânia para vitória na guerra enfrenta desafios

No quadro político, diplomático, militar atual, a proposta de Zelensky é um non starter e tem um forte componente de política interna ucraniana. 

O presidente ucraniano apresenta o plano para vitória na guerra (Foto: president.gov.ua)

Depois de discutir com os EUA e com aliados ocidentais, Zelensky apresentou ao Parlamento ucraniano seu Plano de 5 Pontos para a Vitória.

Os 5 pontos propostos para o início da negociação com a Rússia são:

  1. Ingresso da Ucrânia na Otan e depois na União Europeia;
  2. fortalecimento da defesa ucraniana, incluindo a melhoria do sistema de defesa área e reiteração do fim das restrições sobre o uso dos mísseis de longo alcance para atingir alvos dentro de qualquer parte do território russo;
  3. operações conjuntas de defesa com os vizinho na Europa para derrubar mísseis russos e drones dentro do alcance da defesa aérea dos parceiros ucranianos;
  4. implementar um amplo pacote de armas estratégicas não nucleares de dissuasão (deterrence) no território ucraniano para proteger a Ucrânia de qualquer ameaça militar da Rússia;
  5. aumentar o potencial econômico da Ucrânia e um plano para o futuro pós-guerra 

Como era de se esperar, o plano foi recebido com cautela pelos norte-americanos e europeus pelo potencial de escalar a guerra com a Rússia.

O ingresso na Otan é uma decisão inaceitável para a Rússia que poderia não bloquear, como parte da negociação, o acesso da Ucrânia à UE, limitada a relações econômicas e comerciais.

A restrição a ataques a qualquer ponto do território russo tem sido repetidamente negada pelos EUA pelo temor de retaliação da Rússia e levar a escalada da guerra, sendo difícil que países europeu eliminem a restrição unilateralmente.

‘A Otan tem se negado a aceitar que a Europa se torne parte do conflito’

No tocante às ações conjuntas para derrubar os mísseis e drones russos, o secretário geral da Otan, Jens Stoltenberg, desde julho passado tem se negado a aceitar para evitar que a Europa se torne parte do conflito, embora essa cooperação exista em relação a Israel.

Zelensky não deu maiores detalhes sobre o que seria o pacote não nuclear de dissuasão, mas a ideia seria de que o conjunto de medidas de defesa fosse suficiente para forçar a Rússia a se juntar a um processo diplomático de negociação para terminar a guerra de forma justa na visão ucraniana, ou seja, uma garantia de que a Rússia perderia a guerra.

O plano prevê a continuação das operações militares ucranianas na região russa de Kursk, vista como moeda de troca em caso da não aceitação da perda de seu território.

‘A proposta está sendo apresentada no momento em que a Ucrânia, com dificuldades de armamentos e de militares, está tendo de lidar com derrotas na frente oriental’

A proposta está sendo apresentada no momento em que a Ucrânia, com dificuldades de armamentos e de militares, está tendo de lidar com derrotas na frente oriental, com a Rússia apresentando gradual, mas seguido avanço na região de Donetsk e continuando os ataques na infraestrutura energética nas cidades ucranianas com drones e mísseis. Ao mesmo tempo, a Ucrânia está se preparando para o inverno tendo em vista esses constantes ataques russos à infraestrutura de energia ucraniana em todo o país.

Coerente com esses 5 pontos, Zelensky reiterou no Parlamento que a Ucrânia não aceitará nada que possa implicar o congelamento da atual situação de ocupação ou concessões de território que implique perda de soberania de seu país.

No quadro político, diplomático, militar atual, a proposta de Zelensky é um non starter e tem um forte componente de política interna ucraniana. 

Não pode deixar de ser notado que essa proposta foi apresentada na mesma semana em que Putin divulgou a nova política russa de ação nuclear contra ataques externos (comentada no editorial da semana passada). No caso da entrada na Otan, primeiro item da proposta de Zelensky, a ameaça russa pode se tornar realidade. Não pode ser ignorada igualmente a inviabilidade da proposta de Zelensky em caso de vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais nos EUA, o que viria a favorecer a Rússia pela mudança de posição de Washington no apoio financeiro e militar à Ucrânia.

Presidente e fundador do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE). É presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo), presidente do Centro de Defesa e Segurança Nacional (Cedesen) e fundador da Revista Interesse Nacional. Foi embaixador do Brasil em Londres (1994–99) e em Washington (1999–04). É autor de Dissenso de Washington (Agir), Panorama Visto de Londres (Aduaneiras), América Latina em Perspectiva (Aduaneiras) e O Brasil voltou? (Pioneira), entre outros.

Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional

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