Daniel Buarque: Após seis meses, imagem do Brasil com Lula é melhor do que sob Bolsonaro
Proporção de textos favoráveis ao país cresceu nove pontos em 2023 em comparação com período equivalente em 2022, enquanto o percentual de menções negativas caiu quatro pontos. Dados do iii-Brasil apontam que a visibilidade do país foi semelhante com os dois presidentes, mas que o tom da cobertura foi mais positivo desde que o petista assumiu o poder
Proporção de textos favoráveis ao país cresceu nove pontos em 2023 em comparação com período equivalente em 2022, enquanto o percentual de menções negativas caiu quatro pontos. Dados do iii-Brasil apontam que a visibilidade do país foi semelhante com os dois presidentes, mas que o tom da cobertura foi mais positivo desde que o petista assumiu o poder
Por Daniel Buarque*
A projeção do Brasil na imprensa estrangeira durante os seis meses de governo de Luiz Inácio Lula da Silva foi mais positiva do que durante os últimos seis meses do governo de Jair Bolsonaro. No total, a proporção de textos favoráveis ao país sob Lula no período foi nove pontos percentuais mais alta do que sob Bolsonaro, enquanto as menções negativas ao país caíram quatro pontos.
A comparação dos dados do Índice de Interesse Internacional (iii-Brasil) coletados entre janeiro e junho deste ano com os levantados entre julho e dezembro do ano passado permite avaliar as transformações da forma como o país foi retratado na mídia internacional com a mudança de governo. De forma geral, houve uma manutenção de uma prevalência de textos de tom neutro, mas uma variação favorável ao país de forma geral desde que mudou o presidente.
O iii-Brasil é uma pesquisa sistemática desenvolvida pelo Interesse Nacional para avaliar a forma como o país é tratado pela imprensa internacional. Desde abril de 2022, o trabalho realizado por mim e pela pesquisadora Fabiana Mariutti monitora todas as citações ao país em sete dos principais veículos da imprensa internacional — com jornais dos EUA, do Reino Unido, da França, da Espanha, de Portugal, da China, e da Argentina – para entender o que se fala sobre o Brasil no exterior e que tipo de influência esta cobertura pode ter para a imagem internacional do país.
Na média dos últimos seis meses de Jair Bolsonaro como presidente, a proporção de reportagens de tom neutro esteve bem próxima da média geral, atingindo 53%. Os textos com tom negativo, entretanto, estiveram acima da média geral, chegando a 32%, enquanto os textos com tom positivo ficaram abaixo da média, atingindo apenas 15%.
Durante os primeiros seis meses de Lula, a proporção de textos de tom neutro oscilou levemente para baixo, atingindo 48%, enquanto a proporção de textos de tom negativo também ficou abaixo da média, com 28%. Os textos com tom positivo, por outro lado, ficaram bem acima da média geral e muito acima dos números registrados durante o período em que Bolsonaro era presidente, chegando a 24%.
O dado dos primeiros seis meses apontam para um arrefecimento de um certo otimismo internacional após as eleições. Uma avaliação dos cem primeiros dias de governo Lula apontou que a proporção de textos com tom positivo sobre o país era o dobro da registrada sob Bolsonaro. Após seis meses de governo, por mais que ainda haja mais menções favoráveis ao país, a diferença não é mais tão grande.
Avaliação geral – Um ano de Índice de Interesse Internacional
Ao longo de um ano de análise de dados sobre a cobertura relacionada ao Brasil na imprensa estrangeira, foram coletados e avaliados 3.648 textos com menções de destaque ao país. Isso é o equivalente a dez reportagens por dia sobre o Brasil nos sete veículos considerados no estudo — uma média de 70 artigos por semana, ou 300 por mês.
De forma geral, ao longo das 52 semanas de coleta de dados para a análise do apresentada aqui (entre julho de 2022 e junho de 2023), houve uma predominância de artigos com tom neutro, mais factual, com notícias sem uma influência direta sobre a qualidade da imagem internacional do Brasil. Praticamente metade (51%) de todos os textos analisados se enquadram nesta categoria, com uma abordagem noticiosa de casos que não tendem a afetar a forma como o leitor pensa sobre o país.
Considerando o restante dos textos, a proporção de artigos com tom negativo, com potencial de afetar negativamente a imagem do país, é claramente superior. No total, foram classificadas assim 30% das reportagens sobre o Brasil nos sete veículos de imprensa analisados, contra apenas 19% de textos com tom positivo.
A partir desses dados, seria possível dizer que ao longo do período analisado a imprensa internacional poderia ter uma influência negativa sobre a imagem internacional do Brasil, contribuindo para propagar uma percepção prejudicial à reputação do país. Mas é preciso olhar para os números mais cuidadosamente para poder avaliar as nuances dessa avaliação.
Lula x Bolsonaro
A comparação entre a visibilidade internacional do Brasil (total de menções ao país) nos últimos seis meses de governo de Bolsonaro e os primeiros seis meses de Lula revela um equilíbrio impressionante, com quase o mesmo número de textos com destaque ao Brasil nos dois períodos. Entre julho e dezembro de 2022 foram registradas 1.825 reportagens sobre o país nos sete veículos de imprensa analisados pelo índice. Já entre janeiro e junho de 2023, foram 1.823, apenas duas a menos do que no período anterior.
É importante ressaltar que a projeção internacional do Brasil no fim de 2022 foi muito impulsionada pela eleição presidencial no país, que chamou muito a atenção estrangeira. O último trimestre do ano, quando ocorreram os dois turnos da eleição e o processo de sucessão tenso, no qual o presidente derrotado não admitiu publicamente a vitória do adversário. Foi um período que atraiu os holofotes do mundo e chamou a atenção para o que acontecia no Brasil. E que ampliou a visibilidade do país nos meses finais do governo de Bolsonaro.
Já os primeiros seis meses de 2023 tiveram a alta visibilidade puxada pela mobilização golpista de 8 de janeiro. Naquele mês a visibilidade foi muito mais alta do que a média, mas no restante do período de 2023 analisado aqui a visibilidade ficou quase sempre abaixo da média, com abril sendo a única exceção com um total de menções apenas 11% acima da média.
Impacto da eleição
Avaliando a linha histórica de todas as semanas incluídas neste estudo, é possível ver uma diferença marcante a partir das eleições de 2022, quando Lula saiu vitorioso.
O tom médio registrado no período de quatro meses entre julho e outubro de 2022 foi de 56% de textos de tom neutro, 36% de textos de tom negativo e apenas 8% de textos positivos sobre o Brasil. Já entre novembro e dezembro, depois da vitória de Lula, há uma mudança drástica no tom usado para tratar o Brasil, com uma proporção maior de textos de tom positivo do que de tom negativo. Nos últimos dois meses do ano, foi possível registrar 48% de textos de tom neutro, 24% de negativos e 28% de positivos.
*Daniel Buarque é colunista e editor-executivo do portal Interesse Nacional, pesquisador do pós-doutorado do Instituto de Relações Internacionais da USP e doutor em relações internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. É jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor dos livros “Brazil, um país do presente” (Alameda) e “O Brazil É um País Sério?” (Pioneira).
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional
Editor-executivo do portal Interesse Nacional. Jornalista e doutor em Relações Internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Mestre pelo KCL e autor dos livros Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial), O Brazil é um país sério? (Pioneira) e O Brasil voltou? (Pioneira)
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