Apresentação
Esta edição espelha o dinamismo da cena brasileira expresso em oito artigos sobre a conjuntura. Eles tratam dos caminhos para modernizar a economia do País; do renascimento da política externa; da evolução do processo contra a Petrobras com base na legislação anticorrupção dos Estados Unidos; dos espaços de diálogo com Washington; do relacionamento empresarial com o governo brasileiro depois da Lava Jato; do futuro desta operação; do movimento Vem Pra Rua e os protestos da sociedade civil; dos desafios sindicais para a construção dos direitos sociais.
A coleção de análises sobre esses assuntos é assinada por especialistas que refletem sobre o que a sociedade brasileira pode esperar em futuro próximo, a partir dos primeiros atos do governo do presidente interino Michel Temer em habitação com os debates no Senado sobre o afastamento da presidente Dilma Rousseff, cujo desfecho é aguardado para agosto.
Mais uma vez, a edição circula em momento de expectativas acerca de decisões cruciais para o futuro do País. Os artigos, como sempre, analisam temas de interesse nacional no contexto desta revista, apartidária e independente.
O primeiro texto, de autoria do empresário Pedro Luiz Passos, sócio fundador da Natura, uma das maiores empresas de cosméticos do Brasil, trata dos caminhos para a modernização da economia, “sem a qual não retomaremos a trajetória de crescimento e, por consequência, a superação dos graves problemas sociais que enfrentamos, como o desemprego e a desigualdade”. O autor elenca três pontos cruciais para a modernização da economia que não têm merecido a devida atenção das lideranças públicas e do setor privado: 1) a inserção mais profunda do Brasil na economia global; 2) as transformações da indústria mundial e o que fazer para o País delas participar mais ativamente; 3) a simplificação de leis e procedimentos como base e precondição para que o empreendedorismo seja incentivado e flua livremente.
Na sequência, Paulo Sotero, jornalista, diretor do Brazil Institute do Woodrow Wilson International Center for Scholars, em Washington, escreve que os primeiros movimentos do governo de Michel Temer e as novas ênfases de sua política externa foram bem recebidos e apontam para uma renovação do diálogo e da cooperação entre o Brasil e os EUA. “Confirmando-se a hipótese da eleição da primeira mulher à presidência dos EUA e pressupondo-se uma evolução positiva do processo político brasileiro, podem-se abrir perspectivas bem mais positivas entre os dois países. Uma das razões é que haveria continuidade na estratégia de engajamento de Washington”, diz Sotero.
A advogada Isabel Franco, sócia do escritório KLA – Koury Lopes Advogados, no qual é responsável pela área de Compliance, Investigação & Penal Empresarial, analisa os efeitos da legislação anticorrupção americana no contexto do escândalo da Petrobras. “Não é crível que a empresa, suas parceiras empreiteiras e vários indivíduos se safarão de punições nos Estados Unidos. Além das multas, as autoridades norte-americanas exigirão, no mínimo, a criação de uma área de fiscalização e governança nas empresas processadas. As melhores práticas de compliance pressupõem um manual sobre o que fazer para evitar reincidências, com uma lista ampla de iniciativas e controles que devem ser adotados para reduzir as vulnerabilidades sobre as quais viceja a corrupção”.
A política externa foi um dos temas mais polêmicos da era Lula e mereceu profunda análise crítica do diplomata de carreira Paulo Roberto de Almeida. Em seu artigo nesta edição, ele fala do “renascimento da política externa” sob o governo do presidente Michel Temer. “A política externa precisa retornar aos padrões habituais de profissionalismo e de isenção na análise técnica dos problemas que sempre estiveram afetos ao Itamaraty. Ambas, a política e a instituição, foram bastante deformadas nos anos de lulopetismo diplomático, quando uma e outra foram submetidas e ficaram ao sabor das preferências e alucinações partidárias, quando não a serviço de outras causas que não o interesse nacional”, afirma.
As relações entre empresas e o governo pós-Lava Jato é o tema do cientista político Paulo Kramer. “No mínimo”, ele diz, “executivos de grupos multibilionários, como os das empreiteiras de obras de infraestrutura e energia hoje presos ou respondendo à Justiça, pensarão duas, ou mais, vezes antes de ceder a propostas de políticos e altos funcionários para pagamento de propina em troca de facilidades contratuais e outras. Onde antes vicejava a impunidade, agora existe o risco bem concreto de longas sentenças de prisão e pesadíssimas indenizações. Felizmente, esse cenário começa a mudar. Uma geração de jovens profissionais se mobiliza para educar a opinião pública e o mundo empresarial quanto à radical diferença que existe entre lobbying, de um lado, e tráfico de influência ou advocacia administrativa, de outro”.
O futuro da Lava Jato é a reflexão assinada por Thomaz Pereira, professor da FGV-Direito Rio. “Se o futuro da Lava Jato depende do Supremo, do STJ e do Procurador-Geral da República, em última instância o seu futuro depende, na verdade, da atenção e do controle exercido pelos cidadãos brasileiros sobre os processos de escolha dos ocupantes desses cargos e sobre a maneira como eles exercitam os seus poderes. Não há Lava Jato sem Ministério Público e Judiciário, bem como não há democracia sem cidadãos”.
Colin Butterfield, engenheiro de produção e membro do Vem Pra Rua, descreve a trajetória desse movimento e conclui: “Os avanços da sociedade brasileira com as condenações dos culpados no julgamento do mensalão, os desdobramentos das investigações da Lava Jato, a seriedade do trabalho do juiz Sergio Moro, da equipe de procuradores de Curitiba, da Polícia Federal, as prisões e as primeiras condenações de grandes figurões da política e do meio empresarial envolvidos em escândalos de corrupção foram elementos que contribuíram para uma permanente mobilização da sociedade brasileira no período de outubro de 2014 a abril de 2016”.
Finalizamos a edição com o artigo do sociólogo e diretor do Dieese, Clemente Ganz Lúcio, que alerta: “A situação atual é muito grave em termos de desemprego e cria um ambiente para a desmobilização de direitos”. Por isso, as centrais sindicais tomaram a iniciativa, em novembro de 2015, de abrir um diálogo com a representação empresarial a fim de construir um tipo de acordo entre capital e trabalho, orientado pelo investimento e pela geração de emprego.