China está respondendo às sanções dos EUA com leis de bloqueio e outras contramedidas
As sanções econômicas americanas levam o governo chinês a aprovar estatutos de bloqueio e leis antissanções estrangeiras. Para professor, não se sabe ainda se tais providências estão sendo eficazes, já que a única certeza que se tem é de que as empresas chinesas estão sofrendo com as medidas punitivas dos Estados Unidos
As sanções econômicas americanas levam o governo chinês a aprovar estatutos de bloqueio e leis antissanções estrangeiras. Para professor, não se sabe ainda se tais providências estão sendo eficazes, já que a única certeza que se tem é de que as empresas chinesas estão sofrendo com as medidas punitivas dos Estados Unidos
Por Bashar Malkawi*
Após uma recente reunião entre a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, e autoridades em Pequim, a China divulgou uma declaração exigindo “ações práticas” sobre a questão das sanções. A implicação foi que as medidas punitivas – impostas pelo governo dos EUA a centenas de indivíduos e entidades chinesas nos últimos anos – impedem qualquer alívio às relações tensas entre os dois gigantes econômicos.
A declaração foi feita depois de um encontro conturbado em maio de 2023, no qual o ministro da Defesa chinês Li Shangfu se recusou a se encontrar com seu colega americano por causa das sanções. Claramente, as medidas econômicas estão prejudicando a China – o que leva não apenas a palavras duras, mas também a contramedidas para limitar seu impacto.
Como professor de direito e especialista em comércio internacional, estudo como os Estados Unidos sancionam a China e como a China tenta combater essas sanções. Também analiso se as contramedidas estão funcionando.
Como funcionam as sanções
As sanções econômicas são consideradas uma ferramenta importante da política externa que pode ser usada para influenciar e mudar o comportamento dos países.
As sanções impostas à China foram motivadas por uma série de razões, inclusive para punir as violações dos direitos humanos, as atividades de espionagem e o apoio aos esforços de guerra da Rússia na Ucrânia. Algumas sanções têm o objetivo de restringir as capacidades tecnológicas da China, limitando o acesso aos principais fornecedores de tecnologia.
Para ser bem-sucedido, o país sancionador deve ter o poder econômico para infligir danos econômicos ao outro país e, assim, forçar mudanças.
No caso da China, as sanções prejudicam os produtores e consumidores de ambos os lados. Elas também beneficiam determinados países terceiros – por exemplo, por meio do desvio do comércio em que os exportadores chineses são substituídos por fornecedores de outros países.
Tradicionalmente, as sanções têm como alvo países inteiros. Por exemplo, desde fevereiro de 2022, os EUA impuseram sanções abrangentes contra a Rússia por sua invasão à Ucrânia. Além disso, os EUA impuseram várias sanções contra Cuba nos últimos 65 anos em uma tentativa fracassada de forçar uma mudança de regime.
As sanções econômicas podem ser primárias ou secundárias. Com as sanções primárias, os EUA, por exemplo, proíbem a importação de qualquer produto do país que está sendo sancionado. As sanções primárias também impedem que todas as empresas dos Estados Unidos façam negócios com o país ou com entidades dentro dele.
Nas sanções secundárias, os EUA se recusam a fazer negócios com qualquer empresa que tenha uma relação comercial com o país que está sendo sancionado. Em sua forma mais extrema, essas sanções também proíbem a realização de negócios com uma empresa que tenha um relacionamento com outra empresa que, por sua vez, tenha um relacionamento com o país sancionado.
Direcionamento a indivíduos e empresas
Nos últimos anos, as sanções dos Estados Unidos contra a China se tornaram mais direcionadas a indivíduos, produtos e empresas específicas. Por exemplo, o Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros do Departamento do Tesouro publica uma lista de Cidadãos Especialmente Designados contra os quais se aplicam sanções. Os indivíduos e as empresas da lista têm seus ativos bloqueados e os cidadãos dos EUA são proibidos de negociar com eles. Há centenas de indivíduos e empresas chinesas na lista, incluindo funcionários do Escritório de Ligação da China em Hong Kong e grandes corporações, como a China National Electronic Import-Export Company.
Além disso, o Departamento de Comércio dos EUA, por meio de seu Bureau of Industry, implementou, em outubro de 2022, controles sobre as exportações de determinados produtos para a China, como equipamentos avançados de computação e peças de semicondutores. Esses controles das exportações foram implantados devido a preocupações com a modernização da defesa da China.
Em resposta às sanções secundárias e às complexas questões de aplicação e conformidade que elas criam para governos e empresas, a União Europeia e países como o Canadá e o Reino Unido promulgaram o que chamamos de estatutos de bloqueio. Os estatutos de bloqueio normalmente permitem que um indivíduo ou empresa não cumpra as leis dos EUA e exigem que indivíduos e empresas notifiquem as autoridades sobre quaisquer medidas de imposição de sanções dos EUA.
Contramedidas da China
O governo chinês adotou várias contramedidas para retaliar as sanções dos EUA nos últimos anos.
Em 2020, o Ministério do Comércio da China publicou a Lista de Entidades Não Confiáveis. Uma pessoa ou empresa é designada como “não confiável” se as autoridades chinesas considerarem que ela está prejudicando a segurança nacional ou os interesses do desenvolvimento da China ou aplicando medidas discriminatórias contra uma entidade chinesa. Medidas punitivas – como restrições ao comércio e aos investimentos e multas – podem ser impostas a eles por conduta contrária aos interesses nacionais chineses. Até o momento, duas empresas aeroespaciais e de defesa dos Estados Unidos foram listadas como entidades não confiáveis.
Além disso, em 2021, o Ministério do Comércio da China emitiu as Regras para Combater a Aplicação Extraterritorial Injustificada de Legislação Estrangeira e Outras Medidas. Como um estatuto de bloqueio chinês, as regras exigem que qualquer cidadão, empresa ou outra organização chinesa que esteja restrita ou proibida pelas sanções dos EUA de se envolver em atividades econômicas normais com um terceiro país não sancionador informe essas questões às autoridades chinesas.
A China também promulgou a Lei Antissanções Estrangeiras em 2021. Essa lei autoriza a China a tomar providências – como restrições a vistos e a quem pode entrar ou sair do país – quando um país estrangeiro adota o que a China considera como medidas discriminatórias contra qualquer cidadão ou organização chinesa. Além disso, indivíduos ou empresas censuradas podem ser condenados ao congelamento de bens e impedidos de fazer negócios na China. Ainda, uma pessoa ou empresa chinesa pode entrar com um processo nos tribunais chineses e solicitar uma liminar ou uma indenização por ter que cumprir as sanções estrangeiras.
Infelizmente, a eficácia dessas contramedidas não é clara. Não há estatísticas disponíveis para determinar se elas atenuaram o impacto das sanções dos Estados Unidos.
Presos no meio
Os EUA e a China são superpotências econômicas. A imposição de sanções e contra-sanções pode dificultar a vida de qualquer país ou empresa estrangeira que queira fazer negócios em ambos os países. Na verdade, isso está pedindo que elas escolham um lado.
Algumas pessoas e empresas da China e dos Estados Unidos podem optar por adotar uma abordagem pragmática em relação às sanções e continuar a fazer negócios direta ou indiretamente. Mas, ao fazer isso, correm o risco de serem multados pelas autoridades dos EUA.
Ou podem tentar contornar essas sanções e contra-sanções trabalhando com empresas de outros países ou encontrando maneiras diferentes de se protegerem dos efeitos das sanções. É provável que tanto os EUA quanto a China não pressionem muito as sanções, para não se envolverem em uma guerra comercial total.
As soluções alternativas para as empresas que comercializam com os EUA e com a China são críticas quando o país sancionador – normalmente os EUA – tem o monopólio sobre os produtos ou a tecnologia em questão. Por exemplo, não há solução de curto prazo para a gigante chinesa de telecomunicações Huawei uma vez que os EUA negam a ela o acesso a semicondutores essenciais, tendo em vista que os próprios detêm o monopólio desses produtos. Eventualmente, os semicondutores serão produzidos na China, mas somente daqui a vários anos. Nesse meio tempo, a Huawei observou um declínio na receita e transferiu o dinheiro para mais pesquisa e desenvolvimento.
A experiência da Huawei ressalta o motivo pelo qual Pequim está ansiosa para encontrar uma maneira de combater as sanções dos EUA. Parece que, pelo menos por enquanto, a China se estabeleceu em uma política de táticas de bloqueio em casa, enquanto aumenta a retórica no cenário internacional.
*Bashar Malkawi é professor de direito na University of Arizona.
Este texto é uma republicação do site The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original, em inglês.
Tradução de Letícia Miranda
Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional
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