Apresentação
Metade desta edição – ou quatro artigos– trata de temas que dizem respeito diretamente ao cidadão brasileiro: seu direito ao livre acesso à informação – um dos princípios mais valorizados do moderno Estado democrático –, e a necessidade de empresas brasileiras incorporarem as questões de justiça e direitos humanos à sua agenda, adotando práticas saudáveis e adequadas no convívio com funcionários.
Os outros quatro artigos deste número se dividem em dois tópicos: a discussão sobre se o governo Dilma Rousseff está mudando os rumos da política macroeconômica empreendida por seus antecessores, e para onde aponta o desenvolvimento do Brasil; e o debate sobre o futuro do Mercosul e a política externa brasileira para a região, tendo como pano de fundo a crise provocada pelo impeachment do presidente paraguaio, Fernando Lugo, e a entrada da Venezuela no bloco.
Como sempre, Interesse Nacional aborda esses assuntos da conjuntura com a colaboração de
especialistas convidados pelo Conselho Editorial da revista. O tema do livre acesso à informação esmiúça
os efeitos da Lei nº 12.527/2011, que entrou em vigor em 16 de maio último. A nova legislação reduziu os prazos de manutenção de sigilo e estabeleceu, como norma, procedimentos transparentes e ágeis.
Segundo a Controladoria Geral da União, nos três primeiros meses de vigência da lei, foram recebidos mais de 30 mil pedidos de informação em todos os órgãos públicos. O diretor do Departamento de Comunicações e Documentação do Ministério das Relações Exteriores, João Pedro Corrêa Costa, escreve sobre a lei de acesso à informação e a diplomacia brasileira. Ele revela que o Serviço de Informação ao Cidadão do Itamaraty recebeu, até o momento, mais de 230 demandas, que incluíram pedidos de documentos históricos, despesas realizadas por postos, custos de viagens oficiais (diárias e passagens), remuneração dos diplomatas, relação das obras de arte localizadas em embaixadas e trocas de comunicações sobre temas bilaterais e multilaterais específicos.
João Geraldo Piquet Carneiro, Arthur Lima Guedes e Daniel Vieira Bogéa Soares, integrantes do escritório Veirano & Piquet Carneiro Advogados, assinam o artigo “Impactos da Lei de Transparência no Controle das Compras Públicas”. Eles discutem se a implantação da Lei de Acesso à Informação e a adoção de políticas de transparência se coadunam com o sigilo exigido pela Lei de Licitações e Compras Públicas. A boa notícia, segundo os autores, é que, agora, toda a etapa prévia das licitações estará submetida às
regras de transparência instituídas pela nova lei e, portanto, poderão ser acessadas livremente por qualquer cidadão.
Fechando o bloco temático relacionado à Lei de Acesso à Informação, Luiz Armando Badin, que foi secretário de assuntos legislativos do Ministério da Justiça, entre 2005 e 2006, analisa a “Renovação Administrativa do Poder Judiciário pela Cultura da Transparência”. A regra da transparência vem prevalecendo sobre a exceção do sigilo, apesar das resistências, escreve o autor. “Podemos afirmar que
existe, hoje, uma tendência de garantir o pleno acesso às informações administrativas, no âmbito do Poder Judiciário. Sinal dos tempos: a própria Justiça vem admitindo o direito dos cidadãos de conhecer quanto pagam aos seus juízes. Manifestação de maturidade institucional no processo de afirmação da ética republicana em nosso país”.
Dois renomados economistas – Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central do Brasil (1983-85), e Yoshiaki Nakano, professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, escrevem sobre a política macroeconômica do governo Dilma Rousseff. Para Pastore, “seria ingênuo atribuir ao contágio da economia mundial o medíocre desempenho que tivemos em 2011, quando o crescimento do PIB brasileiro ficou contido em apenas 2,7%, e ainda pior em 2012, quando deverá ficar próximo de 1,5%”. Ele avalia que o efeito quantitativo vindo da economia mundial “é
muito pequeno em relação ao efeito do aumento do custo unitário do trabalho, perto de 15%, em
termos reais, desde o início de 2010”. Isso foi suficientemente grande para anular totalmente o
estímulo da queda contínua e forte da taxa real de juros, e é a variável predominante na explicação tanto do comportamento da produção industrial quanto do comportamento dos níveis de utilização da capacidade instalada da indústria, segundo Pastore. Yoshiaki Nakano observa que as mudanças
na política macroeconômica promovidas pela presidente Dilma Rousseff estão quebrando tabus, como o de que a taxa de juros não poderia cair, no Brasil, para níveis internacionais. “A nova política para a infraestrutura, se for acompanhada do controle de gasto corrente do governo e da ampliação dos investimentos públicos, será mais um passo na direção da verdadeira mudança de regime de política macroeconômica”, diz. A transição definitiva para esse novo regime precisa, além de taxa de câmbio competitiva, que está ainda apreciada, de um regime cambial que garanta a estabilidade e a sua sustentabilidade durante o horizonte temporal dos investimentos produtivos, de acordo com Nakano.
“O Futuro do Mercosul após a Cúpula de Mendoza”, que consolidou a entrada da Venezuela, é o tema de Félix Peña, que foi negociador pela Argentina no bloco. “A transição do Mercosul para uma nova etapa, com perfis institucionais e métodos de trabalho ainda incertos, aumenta a necessidade de se pensar de
que maneira é possível ter acesso, com base na experiência adquirida, e capitalizando os ativos acumulados, a uma nova etapa do processo de integração, na qual os benefícios que forem gerados possam ser percebidos como vantajosos pelos diferentes países e, em particular, por seus cidadãos”, escreve o especialista. Ricardo Sennes, coordenador geral do Grupo de Análise da Conjuntura internacional da USP, destaca em seu artigo que o despreparo do Brasil para lidar com situações de instabilidade política na região, antes que ela avance para situações de crise, e a forma como o país operou seu interesse de ampliação do Mercosul, com a entrada da Venezuela no bloco, indicam uma fragilidade de Brasília para estruturar um espaço regional estável, equilibrado e avançado economicamente.
Fechando a edição, Daniela Carbognin, consultora em gestão de talentos e desenvolvimento de lideranças, e Haroldo Torres, economista e diretor de Análise e Disseminação da Fundação
Seade, e pesquisador sênior do Cebrap, escrevem sobre “O Tema de Direitos Humanos nas Empresas”, tendo como base os resultados de uma pesquisa, realizada em 2010 pelo Instituto Norberto Bobbio, e divulgada pela BM&FBovespa, segundo a qual 43% dos trabalhadores de empresas médias e grandes do Rio de Janeiro e de São Paulo declararam ter sido vítimas de violações de seus direitos humanos no ambiente corporativo.