Soft power do Brasil depende da percepção sobre ambiente de negócios do país
Pesquisa sobre a imagem do país revela que ele é o 31º com maior prestígio no mundo, e continua sendo mais admirado em quesitos ‘leves’, como cultura e sociedade, do que em temas mais sérios, como política e finanças. Estudos mostram que a forma como a economia do país é vista pode determinar o nível de prestígio dele no mundo
Pesquisa sobre a imagem do país revela que ele é o 31º com maior prestígio no mundo, e continua sendo mais admirado em quesitos ‘leves’, como cultura e sociedade, do que em temas mais sérios, como política e finanças. Estudos mostram que a forma como a economia do país é vista pode determinar o nível de prestígio dele no mundo
Por Daniel Buarque*
O Brasil foi classificado em 31º lugar na edição mais recente do Global Soft Power Index (GSPI), ranking que avalia o nível de prestígio internacional de diferentes países a partir de percepções internacionais sobre esses Estados. O dado repete a posição do país no estudo do ano passado. Isso mostra que, apesar da Doutrina Lula priorizar a reputação brasileira, da boa vontade global com a troca de governo e da melhora na imagem do país projetada pela imprensa estrangeira, as mudanças políticas ainda não tiveram influência direta sobre a percepção de influência do país na arena global.
O soft power, capacidade de um país de influenciar outros Estados sem coerção, mas por meios como cultura, valores, diplomacia e atratividade cultural e política, tem sido por décadas a principal aposta de mola propulsora da busca brasileira por prestígio internacional. Ao final da primeira década deste século, quando a imagem do país “decolava”, o Brasil chegou a figurar entre os 20 países com maior prestígio do mundo, segundo rankings como o Nation Brands Index.
De fato, o GSPI 2024 mostra que o Brasil continua sendo o país bem avaliado do continente, e tem imagens positivas em áreas mais leves da sua reputação, como cultura, turismo, esportes e lazer. O país mantém, entretanto, uma avaliação menos positiva em termos de economia, negócios e política. É um perfil já consolidado, de o país ser visto como “decorativo”, bom para passar férias, mas nem tanto para entrar na rota de grandes negócios internacionais.
“O Brasil possui diversos elementos que contribuem positivamente para o seu soft power”, disse Eduardo Chaves, sócio diretor da Brand Finance no Brasil, citado pela Exame. Este perfil de projeção internacional, entretanto, tem se revelado insuficiente para fazer o prestígio brasileiro avançar. “É importante ressaltar que o conceito é dinâmico e pode ser influenciado por uma variedade de fatores, incluindo mudanças políticas, econômicas e culturais, tanto no país quanto no cenário internacional”.
Essa avaliação é evidente no relatório do GSPI, que diz que o país apresenta elevados níveis de familiaridade e influência, especialmente na sua região, mas enfrenta dificuldades na construção de uma reputação verdadeiramente global. Isso se dá porque ele tem recebido pontuações elevadas pela sua Cultura e Patrimônio, mas encontram limitações em métricas cruciais, como Negócios e Comércio.
Segundo o estudo, o reforço das percepções econômicas é a forma mais rápida de melhorar o poder suave do país. “Para romper com este padrão problemático, o país precisa focar no desenvolvimento da sua economia a fim de atrair mais negócios internacionais, e da sua diplomacia, para ser visto como uma voz importante no cenário global”, diz o índice.
Essa avaliação está alinhada com minha pesquisa de doutorado sobre o status internacional do Brasil, apresentada no livro recém-lançado Brazil’s International Status and Recognition as an Emerging Power. Este estudo argumenta que o soft power brasileiro ainda é muito atrelado a estereótipos e clichês sobre o Brasil, como praia, sol e carnaval, e não é visto pelas grandes potências como suficiente para impulsionar o prestígio do país. Ao mesmo tempo, a percepção externa é de que a melhor forma que o país tem para ampliar seu status no mundo é pelo desenvolvimento da sua economia.
Ao abordar a forma como o país é visto no exterior, a estabilidade da avaliação do soft power brasileiro no ranking também revela que é mais difícil acumular atributos de poder suave do que perder reputação internacional. A queda do país em vários desses rankings foi muito evidente durante a crise econômica e política da segunda metade dos anos 2010 e durante o governo de Jair Bolsonaro, e não vai ser fácil nem rápido reconquistar o prestígio perdido, por mais que essa seja uma prioridade declarada do governo Lula.
A notícia positiva para o Brasil é que o índice é calculado em cima de pesquisas de opinião com um público global, que costuma ser muito influenciado pela mídia internacional. O ranking da Brand Finance é elaborado a partir de uma pesquisa com 170 mil entrevistados, de mais de 100 países, e avalia os 193 Estados reconhecidos pela ONU, de acordo com 55 diferentes métricas como poder econômico, recursos ambientais e culturais, potencial de influência global e poder de atração turística.
Dados do Índice de Interesse Internacional (iii-Brasil), que avalia como o Brasil é retratado na mídia estrangeira, mostram que ao longo de 2023, houve um aumento de nove pontos percentuais na proporção de notícias com tom positivo e redução proporcional na de tom negativo. Essa é uma movimentação que, com o tempo, pode ajudar a melhorar a imagem internacional do país.
*Daniel Buarque é colunista e editor-executivo do portal Interesse Nacional, pesquisador no pós-doutorado do Instituto de Relações Internacionais da USP (IRI/USP), doutor em relações internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Jornalista, tem mestrado em Brazil in Global Perspective pelo KCL e é autor de livros como Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial) e O Brazil é um país sério? (Pioneira).
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Artigos e comentários de autores convidados não refletem, necessariamente, a opinião da revista Interesse Nacional
Editor-executivo do portal Interesse Nacional. Jornalista e doutor em Relações Internacionais pelo programa de PhD conjunto do King’s College London (KCL) e do IRI/USP. Mestre pelo KCL e autor dos livros Brazil’s international status and recognition as an emerging power: inconsistencies and complexities (Palgrave Macmillan), Brazil, um país do presente (Alameda Editorial), O Brazil é um país sério? (Pioneira) e O Brasil voltou? (Pioneira)
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