Apresentação
Esta edição estava sendo concluída quando foi aberta a Rio+20, em 13 de junho, duas décadas depois da Rio-92, que consolidou o conceito de desenvolvimento sustentável. É inevitável comparar os dois momentos da história da humanidade. Lá atrás, o sucesso daquela grande Conferência da ONU se deveu ao otimismo derivado de fatos como a queda do Muro de Berlim, o fim do Apartheid, com a libertação de Nelson Mandela na África do Sul, o término da Guerra Fria, o surgimento da glasnost e da perestroika na antiga União Soviética e, sobretudo, a liderança extraordinária do secretário-geral da Rio-92, Maurice Strong, que, “com a experiência acumulada na realização da Conferência de Estocolmo e com livre trânsito entre chefes de Estado de todo mundo, conseguiu engajar a sociedade civil e mobilizar a opinião pública”, conforme lembra Fabio Feldmann, ex-secretário do Meio Ambiente do estado de São Paulo e autor de um dos dois artigos sobre a Rio+20, o assunto que abre este número.
Em junho de 2012, o Brasil volta a ser o palco das discussões sobre os temas decisivos para o futuro da humanidade. O mundo atravessa múltiplas crises nas três dimensões do desenvolvimento sustentável. Na área ambiental, as crises climáticas e de perda de biodiversidade; na área econômica, as crises econômicas e financeiras; e na área social, as crises de desemprego e de desigualdade social. “Todas elas são o resultado dos modelos de desenvolvimento que não somente são incapazes de resolver essas crises, como também estão, na verdade, gerando novas”, escreve o embaixador Luiz Alberto Figueiredo, secretário-executivo da Comissão Nacional para a Rio+20.
“O Brasil acredita que a Conferência terá um papel duplamente desafiador: primeiro, de analisar, de forma crítica e realista, os logros construídos a partir da consolidação do conceito de desenvolvimento sustentável, no Rio, em 1992; segundo, de procurar apontar o caminho para o futuro, para os próximos 20 anos, período crítico para formar a capacidade mundial em abandonar práticas insustentáveis de produção e consumo. Isto só será possível com o engajamento pleno dos governos, do setor privado e da sociedade civil”, afirma Figueiredo.
Tema recorrente no debate nacional é o limite do padrão de crescimento liderado pela absorção, ou demanda, como analisa o economista Samuel Pessoa, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da FGV e sócio da Tendências Consultoria. Em seu artigo, ele discute os limites do contrato social da redemocratização. Para Pessoa, as atuais escolhas da sociedade brasileira têm implicações não triviais para o funcionamento da economia: a elevadíssima carga tributária, a baixíssima taxa de poupança interna e a baixíssima capacidade de investimento do setor público em infraestrutura. “Penso que o crescimento na segunda metade do primeiro mandato da presidente Dilma será fraco e bem abaixo das expectativas que havia no final de 2010. Resta saber como o eleitor mediano se posicionará frente à desaceleração do crescimento.”
Um alerta é feito pelo diretor do Departamento de Competitividade e Tecnologia da Fiesp, José Ricardo Roriz Coelho, que defende o desenvolvimento de um plano nacional que tenha os setores modernos como dimensão fundamental do processo de crescimento dos próximos anos. Para ele, caso não sejam aproveitadas as oportunidades atuais – crescimento da classe média, capacidade dos governos federal e estaduais de se utilizar de seu poder de compra e de financiamento para estimular setores estratégicos, melhora do preço das commodities e a diversidade do parque industrial brasileiro –, mais uma vez, a oportunidade de se construir o país do futuro continuará apenas no imaginário do brasileiro.
Argentina: problemas comerciais
Um par de artigos sobre o relacionamento entre o Brasil e a Argentina, sobretudo à luz das políticas controvertidas adotadas pela presidente Cristina Kirchner, que têm influído nas políticas comerciais dos dois países, é outro destaque desta edição. O doutor em ciência política pela USP e membro do Grupo de Análise da Conjuntura Internacional (Gacint/USP), Christian Lohbauer, sustenta que a política de quase uma década de alinhamento incondicional à Argentina, adotada pelo Brasil desde que o ex-presidente Lula assumiu, em 2003, e mantida pela presidente Dilma Rousseff, tem resultados “no mínimo questionáveis”. Segundo ele, a tolerância do Brasil em relação à Argentina, “com todo o tipo de pirotecnia econômica e comercial, passou a ser a prática diária da diplomacia contra os interesses de parcela majoritária da produção brasileira”. Lohbauer reconhece ser inegável que os dois países historicamente fizeram grandes avanços desde a reaproximação em meados dos anos 1980. “Mas o retrospecto do Mercosul a partir do final da década de 1990 é de desilusão”, diz. Alberto Pfeifer, doutor em geografia humana pela USP e também membro do Gacint, apresenta sua visão histórica positiva do processo de integração entre Brasil e Argentina e ressalta que a potencialidade da atuação conjunta é muito maior do que a que se vê no momento.
Segundo ele, “aí estão as lições de cooperação em temas complexos, como a energia nuclear e a Defesa, além da construção relativamente rápida de um experimento de integração regional, o Mercosul, de comprovada utilidade em diversos âmbitos da agenda bilateral”. Uma tentativa de política comercial comum poderia ser um exercício compartilhado que desvele fatores de competitividade. Pode permitir, ainda, uma escapatória da armadilha do protecionismo e a ocupação de nichos de mercado disponíveis devido à crise, sugere.
Os dois artigos que fecham esta edição tratam de esporte e de infraestrutura relacionada aos grandes eventos esportivos nos próximos anos. Propostas para a modernização da estrutura de gestão dos clubes de futebol no Brasil são apresentadas por Manoel Henrique de Amorim Filho e José Antonio Felgueiras da Silva, ambos do BNDES. “Para que os clubes possam se fortalecer institucionalmente e proporcionar retornos efetivos à sociedade, tendo em vista os recursos púbicos e privados de que fazem uso, é indispensável que os mecanismos de responsabilização e de cobranças sejam devidamente constituídos”, defendem.
Henry Ritchie, sócio da McKinsey & Company e especialista em infraestrutura, escreve sobre o legado de infraestrutura da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos no Brasil. “O país precisa se planejar estrategicamente para maximizar o legado desses eventos, evitar construir ‘elefantes brancos’ e garantir que a infraestrutura física seja entregue a tempo e dentro do orçamento”. Com esse feito, o Brasil poderá provar ao mundo que está pronto para assumir seu lugar como importante ator na estabilidade econômica e na governança mundiais, diz o autor.
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